A ‘solução’ para o problema da segurança, nós, brasileiros, costumamos ouvi-la nas promessas dos candidatos, ao ensejo das eleições. Na última, a questão tampouco faltou. Muito pelo contrário, esteve presente nos supostos ‘compromissos’ com o eleitor. A esmagadora maioria dos pretendentes a cargos públicos – mesmo aqueles postulantes ao legislativo estadual e federal – não se peja de prometer aos céticos telespectadores a própria firme resolução de enfrentar e vencer o desafio.
Tais renovadas propostas serão sempre genéricas. Podem diferir no varejo, mas no atacado todas vem carregadas de comovente convicção de que toda a experiência pregressa, mais do que contradita, desmoraliza.
Esta espécie de mantra pela sua própria ritual repetição o cidadão tende a encará-lo a partir de bem-fundado ceticismo. Dado o caráter por assim dizer obrigatório de sua inserção no discurso do político, a reação geral sói permanecer nesse limbo de geral mas plácida incredulidade.
Diante da resiliência da ameaça, as eventuais tentativas de enfrentá-la são vistas com o discreto menosprezo que se reserva àquelas questões ditas insanáveis. Não importa que o ataque à insegurança parta da esquerda, com a priorização de seus aspectos sociais, ou da direita, com o intento de eliminar-lhe os efeitos e restabelecer a ordem. A tudo isso se lança o diáfano manto da descrença.
No Rio de Janeiro, o governo Sérgio Cabral trouxe uma proposta nova. Através das chamadas U.P.P. (unidade de polícia pacificadora), as estruturas do tráfico de droga tem sido afastadas de determinadas favelas. Começando pelo Morro de Santa Marta, diversas comunidades sediadas nos morros e em outras áreas têm sido reinseridas no mundo controlado pela lei e a ordem, e não por ditames dos senhores do tráfico.
Dada a extensão das favelas no Rio de Janeiro – o cômputo chega ao milhar – quando será possível reivindicar toda a área que se acha sob o talante da ilegalidade é matéria de não fácil resposta.
Não obstante, a ideia de Cabral e de seu Secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, uma vez comprovada pela comunidade a seriedade do propósito e a sua consequente permanência, tem sido acolhida pelos favelados com alívio, e na disposição de colaborar para o bom êxito da empresa, que a eles precipuamente aproveita.
Contudo, a chamada recuperação das favelas para a esfera da legalidade não constitui um remédio mágico para a reimplantação geral da segurança do cidadão.
Até o presente – e há nisso também o intúito de preservar vidas na comunidade – as UPPs têm sido implantadas de acordo com o seguinte procedimento. Nas vésperas do estabelecimento da presença permanente da força policial, se faz correr a notícia para que o tráfico cuide de retirar-se. Na grande maioria dos casos, este esquema vem evitando tiroteios e mortes, eis que as bases deste tráfico se transferem para outras favelas.
A UPP portanto não prende e neutraliza o tráfico. Ao dominar mais uma área, ela constrange os criminosos a se reagruparem alhures. Nessa simplificação, se entrevê, a par do ganho, igualmente o aspecto negativo.
Ao desalojar o tráfico de número crescente de pontos, sem, no entanto, neutralizá-lo, semelha óbvio que se abram para a deslocada criminalidade pelo menos duas possibilidades. Ou os traficantes se mudam para outro morro, com o desígnio de continuar na sua atividade anterior, ou resolvem tentar outras vias da criminalidade.
O súbito incremento dos ‘arrastões’ no tráfego carioca, assim como os assaltos de motocicletas (com o apoio ou não de carros) registra dramática inflexão para o alto. Que as incursões sejam sempre mais ousadas e em grandes vias de circulação, depõe de forma constrangedora contra o abandono pela polícia civil e militar dessas áreas.
A morte de um médico, alvejado com um tiro na cabeça em tentativa de assalto, na avenida Marechal Rondon, na Zona Norte, por volta das 21hs. de ontem, quatro de novembro, desvela o quão abandonados à própria sorte se acham os cariocas. Os dois bandidos da moto, com o possível suporte de um carro, perseguiram e mataram o pobre médico, que buscara escapar dos facínoras. Sem qualquer polícia a dificultar-lhes a ação, foi também no mesmo local que, em 2006, foi abatido o guitarrista da banda Detonautas, Rodrigo Netto.
De um morador se sabe como transcorrem tais delitos: “Aqui têm ocorrido assaltos e arrastões quase todos os dias. E não só à noite, mas também de dia. A avenida Marechal Rondon está abandonada pelos policiais. Os bandidos percebem isso e atuam aqui, sem ser incomodados.”
( Fonte: O Globo )
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
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