terça-feira, 2 de novembro de 2010

A Lei da Ficha Limpa e o S.T.F.

Decerto, por causa de seu empenho pela promoção da candidatura de Dilma Rousseff, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva não teve tempo para indicar nome para eventualmente tornar-se o 11º membro do Supremo Tribunal Federal.
Estando o Supremo reduzido a um número par, questões importantes podem não ser decididas, se as posições dos ministros se dividirem. Foi o que ocorreu no julgamento do recurso de Roriz contra a lei complementar nr. 135, a chamada Lei da Ficha Limpa, visando a anular a proibição por sentença do Tribunal Superior Eleitoral, por haver renunciado a seu mandato de senador pelo Distrito Federal, com o fim de escapar do processo de cassação.
Anulada a ação, por desistência do interessado, a validade ou não da Lei da Ficha Limpa para este ano teve de aguardar outro recurso ao Supremo. A ação de Jader Barbalho (PMDB) deu ao STF a oportunidade de redimir-se do erro anterior, quando os ministros prefiram não valer-se dos instrumentos constitucionais para superar o impasse existente.
Desta feita, após sessão agitada, com diálogos por vezes ríspidos que estranham ouvir-se na mais alta corte, depois de confirmado o impasse, recorreu-se à votação ulterior ad hoc, em que um dos ministros – Celso de Mello – o decano do S.T.F. votou pela validação da sentença do T.S.E. Que o impasse tenha sido quebrado por Celso de Mello não surpreendeu de todo, eis que dos cinco ministros contrários à vigência imediata da Lei nr. 135, a posição de Celso de Mello se afigurava a mais próxima da tese contrária, como de resto, na votação do recurso de Roriz havia sido já insinuado pelo bloco que apoiou a tese do relator Ayres Britto, com citações elogiosas a votos no passado do decano do tribunal.
No entanto, tal validade da Lei da Ficha Limpa permanece precária, pois depende de nova votação com o colegiado completo do Supremo. Daí, releva a importância dessa indicação, como sublinhada, entre outros, pela Ordem dos Advogados do Brasil.
A indicação do undécimo ministro não entrará, portanto, na rotina judiciária.
A ausência deste ministro foi objeto de carta, datada de agosto, do Presidente da O.A.B., Ophir Cavalcante, ao Presidente Lula, que não se dignou a respondê-la. A estranheza da Ordem é compreensível, sobretudo, como assinala Ophir Cavalvante, porque ela “sempre o recebeu enquanto não era presidente. Depois que assumiu, nunca mais retornou.”
A escolha de um ministro do Supremo é cousa séria. Não creio necessário que se altere o procedimento. Contudo, o Primeiro Mandatário não deveria atuar como se fora mais uma nomeação. Sem falar de imitação, é notória a diferença existente entre a atenção dada pelo Presidente americano e o brasileiro a esse tipo de designação. Se a filosofia jurídica do indicado pode variar consoante o presidente, seja lá democrata ou republicano, muita atenção é conferida aos títulos, cargos na magistratura e à posição do indicado.
Não obstante, o presidente Lula fez algumas boas indicações ao Supremo, e seria de todo interesse que assim procedesse no caso em tela. O critério da escolha não deve ser a proximidade, nem a eventual antiguidade, mas sim o notável saber jurídico e a reputação ilibada. Nesse sentido, a imprensa aponta para o nome do advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, que de azarão teria passado para candidato forte para a vaga. Se o designar, repetirá portanto a opção do AGU, como no caso de Tóffoli. Sem embargo, seria preferível que o novel Ministro estivesse mais próximo de Ayres Britto e Carmen Lúcia, do que de Gilmar Mendes e José Antonio Tóffoli.
Será pedir demais ? O Presidente Lula, atendidas as atitudes anteriores, não nos induz a demasiado otimismo. A sua posição e as suas simpatias se voltam para os oligarcas, como José Sarney, como se contasse retornar à presidência, nas palavras de Marco Antonio Villa, nos braços de velhos oligarcas e do capital financeiro.
A Lei da Ficha Limpa, imposta pela sociedade a um Congresso a princípio reticente, constitui uma dos pouquíssimos reais avanços que o Brasil realizou em termos de política. Desmerecê-la e/ou jogá-la para as calendas transmitiria uma mensagem que pode agradar a alguns, mas vai ao arrepio dos propósitos da grande maioria dos brasileiros.

( Fonte: O Estado de S. Paulo )

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