domingo, 14 de novembro de 2010

Leiloando a Amazônia

A notícia, veiculada pela CNN, não pode deixar de inquietar todos aqueles que acompanham com preocupação o avanço da devastação na Amazônia.
Divulga-se que o Brasil está ainda no corrente ano leiloando um milhão de hectares de terras públicas, em processo de concessão a madeireiras.
Dentro do esquema, a extensão florestal leiloada se alargaria até onze milhões de hectares, em cinco anos. Na estimativa governamental, dez por cento dos 280 milhões de hectares da floresta amazônica poderiam ser eventualmente objeto de concessão à exploração pelas madeireiras. Essas terras continuariam a ser públicas.
Como se realizaria este projeto ? Pelos termos da concessão, as madeireiras poderiam proceder ao corte seletivo de 25 metros cúbicos de madeira – cerca de quatro a seis árvores – por hectare. Ainda segundo as especificações, seriam tomado cuidado para não danificar as demais árvores da área, e a madeireira não poderia retornar àquela área específica em trinta anos. Nesse prazo, haveria condições para que a floresta se recupere e a área do desmate volte a crescer.
A matéria cita como fontes o brasileiro Marcus Vinicius da Silva Alves, Diretor do Laboratório de Produtos Florestais do Ibama, e o americano Daniel Nepstad, biólogo, Phd em ecologia da floresta, e Diretor do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).
Consoante esses expertos, o dano para a Amazônia decorre mais da exploração ilegal de madeira. Nas condições acima previstas, a explotação seria realizada em condições sustentáveis. Para Nepstad o corte madeireira (logging) pode ser um bom meio de reconciliar a necessidade de emprego e renda com a conservação da floresta. Se se abaterem três ou quatro árvores por ha sem danificar o entorno, dentro de poucos anos não se notaria a diferença. De acordo com o diretor do IPAM “há um alto potencial para usar a exploração da madeira como parte da economia amazônica, enquanto se conserva o carbono nas árvores, e a biodiversidade.”
Confrontados com a participação do corte de madeira no processo de deflorestamento da Amazônia, ambos os especialistas concordam em que o corte seletivo não contribui para a devastação, se apenas um número reduzido de árvores é extraído de forma responsável.
Alinham, dentre os maiores fatores para o deflorestamento, o desmate para a pecuária, a plantação de soja, as estradas ilegais e as queimadas nas pequenas propriedades.
Ambos apontam para a diminuição do deflorestamento no Brasil: de treze mil km2 em 2007/8 para sete mil km2, em 2008/9, segundo dados oficiais.
Na ótica de Marcus Alves, tal redução já seria uma vitória da política de concessão às madeireiras, posto que esteja apenas começando. Nepstad discorda, porém, que o inicio das concessões tenha tido essa função benéfica. Para Neptstad, a indústria de extração madeireira é tanto parte da solução, quanto a principal causa do problema. E acrescenta: ‘sem a participação dessa indústria será díficil terminar com o deflorestamento em uma região como a Amazônia.’
Na estimativa do diretor do IPAM, o corte da madeira se realiza em um milhão de hectares em terras de propriedade de particulares, para abastecimento de duas mil serrarias, a maior parte de modo ilegal.
Através de controles mais estritos, o governo logrou eliminar muito corte ilegal, mas ainda muitos outros continuam.
Na previsão de Marcus Alves, do Ibama, a longo prazo essa política de concessões forneceria 80% da madeira do mercado, com a diminuição da procura por madeira não-regulamentada de florestas em mãos de particulares.
Perspectivas de êxito.

O parecer do Dr. Nepstad é cauteloso. Se se pudesse resumi-lo, o definiríamos como um prognóstico reservado.
Conforme assinala, se parece bom em tese, ‘muito poucos países obtiveram êxito (na política)’. ‘As políticas florestais que introduziram concessões a madeireiras privadas em terras públicas têm uma história nada animadora (dismal) na maior parte das nações tropicais do mundo. Para tanto contribuem a corrupção (peculato), favorecimento indevido e royalties que não atingem o respectivo objetivo. Mas o Brasil pode ter sucesso, se algum país lograr fazer o sistema funcionar.’
Resistência da comunidade ambientalista.

No entender de Nepstad, quando a proposta foi apresentada, houve oposição de alguns grupos ambientalistas, por serem contrário a qualquer atividade econômica na floresta. Tal resistência teria diminuído, na medida em que a sua atenção se voltou para as principais causas do desmate, v.g., a agricultura e a pecuária.
De qualquer forma, considera que se pode ir adiante por meio dos madeireiros responsáveis. Se em algumas áreas seria melhor não extrair recursos naturais, é forçoso encarar o que é bom para a Amazônia como um todo.

Conclusão.

Conforme se depreende da visão dos dois técnicos, a sua posição é favorável, embora mais matizada de parte do diretor americano de uma ONG.
É uma opção não destituída de risco, que não é pequeno, como o próprio Nepstad assinala. Tudo dependerá da responsabilidade das madeireiras, mas sobretudo da capacidade governamental de manter um nível adequado de fiscalização. Conhecemos o resultado prático das madeireiras que operaram nas florestas da Malásia, por exemplo. Além de ser aconselhável não trazer para a Amazônia indústrias com esse perfil de atuação, a política só não contribuirá para agravar o problema, se o governo - e o Ibama em particular – mantiver o controle do projeto.
Dados os antecedentes, as previsões não devem ser aprioristicamente otimistas.

( Fonte: C. N. N. )

Um comentário:

Mauro disse...

Pois é, damned if you do and damned if you don't... Pelo querer de alguns o único uso legítimo da Amazônia é a sua virginal contemplação pelos índios. Os 25 milhões de habitantes da região que se mudem ou se pintem de azul e contratem o James Cameron para sobreviver. O Brasil parece a personagem da fábula do pai que vai com seu filho levar o burro da família ao mercado...