Decerto, é ainda cedo para avaliação do governo petista de Dilma Rousseff. Talvez por falta de opção – e mais ainda por não sentir-se em condições de enfrentar a massacrante provação de tentativa de retorno seu à presidência – o maior nome do Partido dos Trabalhadores e seu candidato natural à presidência, preferiu manter-se à distância, optando por reapresentar para o eleitorado nacional a sua candidata de algibeira, ora como postulante da reeleição.
Esse estranho instituto, antes felizmente desconhecido pelas constituições democráticas do Brasil, foi em má-hora introduzido por Fernando Henrique Cardoso. Tal presente de grego muito contribui para distorcer o processo eleitoral em seus três níveis, conferir iniqua vantagem aos eventuais titulares, assim como abrir ainda mais as cancelas para o império da corrupção.
Prematuramente lançada, quiçá pela insegurança da presidenta, a campanha está aí, a corroer o interesse nacional, que estaria melhor servido se o Tribunal Superior Eleitoral houvesse atalhado o intempestivo lançamento da disputa para prazos mais consentâneos.
Recebida a bênção do líder máximo, Dilma Rousseff pôde encarar o ínvio caminho da reeleição. Nesses passados dez anos de governo do Partido dos Trabalhadores, se muita coisa mudou no ético e aguerrido P.T. dos tempos da planície e da oposição, não terá diminuído a sede do poder, essa peculiar beberagem. Tal hábito, de resto, costuma crescer com o uso, e quanto mais desmesurado, mais há de empolgar e de afastar os usuários dos antigos costumes e caminhos.
Posto que não sejamos aduana, peço licença para revistar a bagagem da candidata à reeleição. É usança corriqueira que pretendentes ao sufrágio da Nação, e em especial ao segundo mandato, nos mostrem os seus títulos a mais quatro anos no Palácio do Planalto.
Luiz Inácio Lula da Silva terá tido suas razões para preterir os grandes nomes do PT em favor de sua gestora na presidência da república, não obstante a circunstância de ser neófita na política, sem nunca haver concorrido a cargo eletivo algum.
Em parte por seu carisma, e em outra, pela inépcia do principal candidato opositor, Lula mais uma vez confirmou a sua singular faculdade de eleger postes, para tanto arrimado em inegável capacidade, que tem a triste ajuda do apoio incondicional da grande massa.
Por isso, se afigura difícil questionar a Dilma Rousseff pelas suas eventuais falhas no exercício da presidência. Ela ganhara o apreço do Presidente pela sua capacidade de gestora dos assuntos dos diversos ministérios. Menos do que um primeiro ministro, ela fizera as vezes de eficaz chefe de gabinete, encaminhando os temas e distinguindo as alternativas, para que Lula, enquanto chefe, tomasse as necessárias decisões.
Ao receber a faixa, se ainda conservou a possibilidade de colher a devida orientação da experiência política do imediato predecessor e padrinho, as circunstâncias e o imediatismo do mando tendem a cercear o acompanhamento, feita a óbvia reserva dos grandes assuntos. Daí a inevitabilidade da própria assunção plena da responsabilidade presidencial.
Mas o que apresenta a candidata aos olhos do fiscal ? Na bagagem, logo avulta a incômoda presença da inflação, que voltou ao dia-a-dia do brasileiro. Não foi, sem dúvida, por falta de aviso.
Desse irresponsável deslize, Lula, em seus dois mandatos, soube manter-se à distância, embora, depois da partida de Antonio Palocci, o Ministro Guido Mantega não tenha exibido a mesma autoridade do antecessor.
Dilma mantém na Fazenda o mesmo Mantega, mas transformou o ministério em um conjunto de feudos. A temida heterodoxia retorna, com opaca contabilidade fiscal, os grandes déficits, e um terreiro que se tem prestado a sardônicos juízos de renomada revista estrangeira.
Ainda no campo econômico-financeiro, depois de longa indecisão, o Banco Central voltou a elevar a Selic. Mais do que bater no teto da margem, a inflação – que o Plano Real vencera – voltou no governo de Dilma. E terá ela competência para recolocar na garrafa, o mau gênio da carestia ?
Por outro lado, a faxina ética já virou retrato na parede, enquanto engorda o gabinete com os seus terceiro-mundistas trinta e nove ministérios. Estamos quase a bater nos míticos quarenta e além do desconforto, cabe a indagação: para quê ?
É capenga a justificativa da necessidade da base parlamentar de apoio. Apesar de seu tamanho e da sopa de partidos que a compõem, ela costuma negar fogo nas horas em que o governo de Dilma Rousseff dela mais carece.
Segundo se propala, a presidenta só disporia de 150 votos seguros na Câmara, quando a tal propalada base lhe daria confortável maioria. Sem embargo, quando deles carece – como na MP dos Portos – as votações não correspondem às benesses dadas anteriormente. O que está por trás dessa suposta falta de diálogo? Incompetência política ?
Tramita pela Câmara a PEC-37, que se propõe arrancar da Constituição Cidadã uma de suas melhores criações, a instituição de Ministério Público autônomo, com plena capacidade de investigação. É estranhável assombro a facilidade com que se permite emendar a constituição no Brasil. Outros países – e para citar apenas dois bastante díspares – como os Estados Unidos e a Grécia tratam de preservar a inteireza de sua carta magna contra aventureiros e aves de arribação. No Brasil, nada mais fácil do que estropiar a Constituição – quando há aliança de interesses pouco confessáveis para tanto – como no melancólico caso desse intento de rebaixar o Brasil à trinca de Indonésia, Quênia e Uganda, únicos países no mundo em que o Ministério Público não tem poder de investigação. É ainda maior escândalo que uma tropelia desse gênero vá a votação na Câmara, sem que ouça de parte do Governo uma palavra sequer de condenação desse vergonhoso projeto. O Presidente da Câmara, Deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN) assevera que colocará em pauta de votação a citada Pec-37, mesmo sem acordo. O Legislativo pode ser, no entanto, cemitério de muitos projetos nocivos e inconsequentes. A prudência é um dos instrumentos do legislador. Adiar-lhe a votação para outra oportunidade constitui, por conseguinte, válida alternativa.
No passado recente, me tenho ocupado da diferença entre os grandes líderes – aqueles que sabem incentivar o brilho dos respectivos colaboradores – e os chefes que sufocam a iniciativa individual, à maneira das grandes árvores que impedem lhe cresçam à volta senão a vegetação rasteira e inconsequente.
Tal diferença pesa deveras. No final de tudo , quem paga a conta não é apenas o (a) líder, que se vê despojado(a) de válida e proveitosa ajuda, mas também toda a comunidade que dele(a) depende.
E essa
comunidade, senhor agente alfandegário, somos nós, o Povo brasileiro.
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