segunda-feira, 24 de junho de 2013

As Manifestações de Junho

                                    
           Há muitas prescrições para as manifestações que irromperam em São Paulo e se espalharam por esses brasis afora no correr nervoso da primeira semana. As comparações chovem – do maio parisiense até a revolta do vintém, na última década do império de D. Pedro II.

          Perpassa a todas elas uma ânsia contraditória, ou de que os movimentos utópicos passados são inimitáveis, ou que adiante de cada movimento paira o monstro da reação, seja no golpe do dezoito Brumário, seja nas perseguições do macarthismo.

         Estará necessariamente no código genético da manifestação – e sobretudo quando ela se espraia, inelutável e incontornável, pelos remansos, rios e mares, conhecidos ou não, das gentes de um país-continente – que deva conformar-se a passadas e perenes regras ?

         Na verdade, se os protagonistas não mudam, nem as diferenças na sorte e no poder, e se o futuro, como já diziam os gregos, será invisível, onde está escrito que a História, este folhetim de muitos autores e de enredos contrastantes, deva produzir sempre os mesmos roteiros ?

         A manifestação multitudinária será sempre um rouco grito não só contra a gente do palácio – lá empoleirados pela sorte se acreditam parte da paisagem – senão contra as injustiças e as maldades do dia-a-dia. Não se enganem, por isso, os que contemplam de cima a rotina massacrante das conduções públicas, como se fosse um documentário, monótono e sem sobressaltos.

          A mais-valia pode estar fora de moda, mas ela hiberna, com paciência indescritível e insondável, na encruzilhada do monótono e na aparência infindável do padecer das massas anônimas. Podem ser momentos breves ainda que brilhantes, na longa jornada que algum ignoto demiurgo terá imposto, sem outra razão que o acaso passageiro da força. Quantas auroras serão necessárias para que se faça justiça, para que caia a máscara dos senhores de turno, e dos vastos, mas contingentes pelotões que lhe estão jurados no apoio e na assistência – que será eterna enquanto dure ?

         Porque a violência é uma besta-fera sem outra ideologia que o próprio interesse. O deus cronos costuma ser cruel e cruento, mas ele também obedece a regras fixas que estão escritas com tinta caprichosa e invisível.

         A gente do palácio se acredita dona do poder. Vivem embalados por essa doce, mas estranhamente volúvel ilusão. Pois se pensam na eternidade como programa do poder, em toda esquina, em toda praça, em todo desconforto das conduções, está o espírito arisco e inaferrável de um mundo mais justo, e menos sujeito à cega repressão da burguesia, não importa se alta ou baixa.

         Não se esqueçam daquele filme de René Clair em que havia um personagem que corria para o passado, em busca do bom, velho tempo antigo. Ah, ele deveria saber que o lugar de correr está no presente. Nesse momento mágico, em que se resume a própria vida, está a oportunidade bendita de transformar o sonho em realidade.

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