Não eram desconhecidas as ambições de Vladimir V. Putin em transformar a
Federação Russa em autêntica herdeira da URSS. Com a pacífica implosão da União
Soviética, que, ao cabo de 1992, literalmente desaparecera do mapa, sendo
sucedida pelas inúmeras nacionalidades, antes abrangidas pelo poder de Moscou,
surgiria nova realidade no mundo, com o
predomínio da única Superpotência.
Passado quase um quarto de século, a
realidade, se mostra os Estados Unidos, com uma situação de poder ainda
na categoria super, duas potências repontam com grandes pretensões. Trata-se,
obviamente, da República Popular da China e da mesma Federação Russa.
Sob a liderança autoritária de Putin,
Moscou voltou a ter maior presença internacional - veja-se, não só, a sua
guerra não-declarada contra a Ucrânia, mas também a intervenção na Síria e,
agora, a ênfase no emprego de submarinos, nucleares ou não, como instrumentos
de atuação militar e, por conseguinte, de influência.
Tudo isso depois que gospodin Putin ouvisse de Barack
Obama que cuidasse dos próprios assuntos, eis que o seu país passara a
ser um poder regional.
Nada que tire Vladimir Vladimirovich
mais do sério do que um put-down[1] do
gênero. A provocação de Obama foi dita
após a intervenção branca russa no seu grande vizinho ao sul, que é a Ucrânia. Se por ora, Kiev não
tem que lidar com as contínuas entradas em suas fronteiras à oeste, e máxime naquelas
próximas do mar Negro - exemplo disso foi a invasão e tomada da Criméia, que
hoje deixou o estrangeiro perto para
transformar-se em mais uma província da Federação Russa, malgrado a condenação
pela Assembléia Geral das Nações Unidas.[2]
Contudo, a política americana pode
conter um viés maquiavélico que poderia levar a Rússia a experimentar as mesmas
dificuldades que levaram a Superpotência soviética a desaparecer do mapa por
conta da implosão que hoje se credita à política de Ronald Reagan.
Sem embargo, ainda é cedo para fazer
prognósticos a respeito. Deve-se dizer, no entanto, que Vladimir Putin encara
seriamente esse desígnio de voltar a ser super-potência, como por tanto tempo
Washington considerou como tal Moscou.
Pode ser que mesmo antes que Reagan
causasse intencionalmente aquecimento na capacidade motora do Kremlin
que à la longue não lhe seria
suscetível resistir, já a URSS buscasse ir ao limite para manter a ficção da
paridade entre as duas superpotências.
Tenho comparado muitas vezes
Vladimir Putin com Benito Mussolini. Em muitos pormenores histriônicos, os dois
líderes têm muito em comum. O torso nu do Duce
o revemos em Putin, que gosta de aparentar força física, apesar de ser de baixa
estatura. Mas gostaria agora de referir-me à similitude de maior peso entre os
dois líderes autoritários.
Mussolini quis fazer da Itália
uma grande potência. As potências européias da época - Alemanha, França e
Grã-Bretanha - por motivos diversos - fizeram de conta que acreditavam em que
tal projeto correspondesse à verdade.
Putin foi afastado do G-8 pela
sua intervenção na Ucrânia. Mas ele não alimenta qualquer dúvida quanto ao
lugar que deva ter Moscou no concerto das nações. Para tanto, o presidente
russo comissionou a elaboração de uma doutrina
eurasiana, que existe somente para dar suporte ideológico às pretensôes e
às posições do Kremlin.
A ajuda a Bashar al-Assad não
foi de graça. O titubeante e enfraquecido Raïs da Síria concedeu-lhe um porto
no Mediterrâneo oriental - em águas quentes! - e agora cedeu território para
construção de uma base moscovita.
Por fim, Putin está despejando
em frota de submarinos nucleares somas enormes que devem sobrecarregar deveras
a capacidade financeira de Moscou - que é sempre bom lembrar depende
prioritariamente do petróleo para os seus projetos de grandeza. Nessa
estreiteza de fontes - a economia russa dispõe de outras, é claro, mas a
dependência do ouro negro salta aos olhos - aí encontramos outro traço que o
aproxima de Benito Mussolini, a quem, como já se observou, Vladimir Putin admira, malgrado o caráter secundário
no concerto das grandes potências da época que cabia ao líder fascista.
Não é decerto blefe o
engajamento de Putin através da presença de seus submarinos em muitas áreas
visitadas pelo Ocidente. A maior participação nesses jogos bélicos da Rússia,
incentivada pelo seu presidente, vai acarretar uma grande sobrecarta para a
economia de Moscou. Dadas as conhecidas limitações diante dos mais escassos
meios de que dispõe hoje o Kremlin para equiparar-se ao papel militar do
Ocidente, não será sem sacrifício da própria economia que tal incrementada
presença poderá ser viabilizada.
Contrastar a Aliança dos países da OTAN
faz, assim, parte do projeto restaurador de Putin. Partindo de base menor, a
manutenção desse jogo por Putin depende de uma série de fatores.
Por enquanto, os seus
propósitos semelham ser pacificos. Conquanto tal assim não parece à primeira
vista, dado o ethos autoritário do Senhor de Todas as Rússias, isto pode ser até
levado como elemento de consideração.
Em se tratando, porém, de
Vladimir Putin e de seus sonhos (ou projetos) de grandeza, tudo é admissível,
menos subestimá-lo.
Assim, se a cotação do
petróleo brent voltar a níveis mais remunerativos, a mão de Putin tenderá a
ficar mais pesada. Se, porém, as coisas piorarem para esse lado, gospodin
presidente pode chegar até com mais verossimilhança a interessar-se pelas
perspectivas de paz fundada na justiça...
( Fontes: The New York Times,
The New York Review of Books )
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