Ontem aconteceu no Rio de Janeiro algo que seria
impensável em outras partes do mundo.
Não foi apenas a denegação do serviço de
táxi nesta cidade que já chamaram de maravilhosa. O número de táxis disponíveis é muito grande,
e atende plenamente às necessidades de transporte de seus usuários.
De minha parte, sirvo-me bastante dessa
condução, cuja abundância é um dos característicos dessa cidade que chamaram no
passado de maravilhosa.
Como o governo competente se excedeu em
franquias, é muito raro que o usuário espere por muito para servir-se dos
amarelinhos.
Lembro-me de outros tempos - e põe tempo
nisso - em que o serviço de 'carros de aluguel' ficava em pontos à espera de
fregueses para as suas corridas.
Em geral, os carros eram pretos, com
amortecedores em mau estado, e - o que era pior - os motoristas, em grande
proporção, eram portugueses. Como era transporte de pouco uso pela população,
eles em geral cultivavam um façanhudo mau-humor. Naqueles tempos, seria
realmente difícil dar com um chofer que estivesse de bem com a vida.
Penso que talvez os maus bofes se
devessem a ficar horas esperando no
ponto, para no final surgirem corridas
que irritavam esses senhores por não proporcionar-lhe uma boa paga.
Com o aumento da população e do
tráfego, o Rio de repente se viu muito
bem servido em termos de táxi. Terá havido, por força da habitual demagogia,
concessão excessiva de franquias, mas não é comum encontrar alguém no Rio de
Janeiro, que se queixe do serviço de táxis.
Ele é abundante - talvez um pouco
demasiado abundante - e através de aplicativos - Taaxi, taaaxi! - não há lugar
nessa cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro em que lograr um taxi seja
realmente difícil.
Pela minha antiga profissão, já
encontrei cidades - mesmo européias - em que esse serviço é muito menos
disponível. Em Atenas, por exemplo, somente com trajes de turista - o que não
era o meu caso - é que alguém tinha boa chance de lograr um táxi. E tal se deve
ao pouco conhecimento do visitante dos trajetos e sobretudo das tarifas de
táxi...
Mas, tratando de o que aconteceu ontem,
os taxistas - que terão seus válidos motivos para reclamarem do Uber - se tem
todo o direito de protestarem contra uma concorrência que considerem desleal, não
podem fazê-lo nunca da maneira como o fizeram.
E o erro dos taxistas foi duplo. Porque
a liberdade deles protestarem termina no espaço que é próprio do usuário. E
tampouco devem recorrer à violência ou à coerção, que é ainda pior. O táxi já
foi sinônimo de veículo que se utilizava em situações limite, ou por grande
urgência, ou por necessidade de estar em local de difícil acesso.
Por isso, confunde-se que um serviço de
utilidade pública se transforme em transtorno
para milhares de pessoas, e não pela sua falta - o que é lamentável, mas não pode
censurado (porque o motorista está exercendo um direito seu - mas por um
desvio de violência, seja virtual, seja mesmo real, no caso de ataques à
concorrência do Uber.
Em meio à omissão do Poder público,
seja da P.M., seja da Prefeitura, que é deplorável e condenável, mas que
infelizmente constitui uma característica comum para o carioca - segurança e
bons serviços só em grandes ocasiões em que estejam presentes muitos
estrangeiros. Quando são autoridades, então as atenções chegam ao paroxismo,
que deve ser um sintoma ainda remanescente do persistente servilismo colonial !
- a indiferença das autoridades e do próprio Prefeito é de causar mais do que
espécie, revolta.
Há um limite para tudo - para a
demonstração, para o protesto, para a negação do próprio serviço. O que não é
admissível, mesmo nesta Cidade Maravilhosa, é infernizar a vida de quem nada
tem a ver com essa quizília, e ainda por
cima negar-lhe a liberdade de ir e vir.
E tudo isso com a conivência, pela
própria fraqueza, da Autoridade citadina.
( Fonte: O Globo )
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