sábado, 2 de abril de 2016

Omissão e Violência

                                        

       Ontem aconteceu no Rio de Janeiro algo que seria impensável em outras partes do mundo.

       Não foi apenas a denegação do serviço de táxi nesta cidade que já chamaram de maravilhosa.  O número de táxis disponíveis é muito grande, e atende plenamente às necessidades de transporte de seus usuários.

       De minha parte, sirvo-me bastante dessa condução, cuja abundância é um dos característicos dessa cidade que chamaram no passado de maravilhosa.

       Como o governo competente se excedeu em franquias, é muito raro que o usuário espere por muito para servir-se dos amarelinhos.

       Lembro-me de outros tempos - e põe tempo nisso - em que o serviço de 'carros de aluguel' ficava em pontos à espera de fregueses para as suas corridas.

       Em geral, os carros eram pretos, com amortecedores em mau estado, e - o que era pior - os motoristas, em grande proporção, eram portugueses. Como era transporte de pouco uso pela população, eles em geral cultivavam um façanhudo mau-humor. Naqueles tempos, seria realmente difícil dar com um chofer que estivesse de bem com a vida.

       Penso que talvez os maus bofes se devessem  a ficar horas esperando no ponto, para no final  surgirem corridas que irritavam esses senhores por não proporcionar-lhe uma boa paga.

       Com o aumento da população e do tráfego,  o Rio de repente se viu muito bem servido em termos de táxi. Terá havido, por força da habitual demagogia, concessão excessiva de franquias, mas não é comum encontrar alguém no Rio de Janeiro, que se queixe do serviço de táxis.

       Ele é abundante - talvez um pouco demasiado abundante - e através de aplicativos - Taaxi, taaaxi! - não há lugar nessa cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro em que lograr um taxi seja realmente difícil.

       Pela minha antiga profissão, já encontrei cidades - mesmo européias - em que esse serviço é muito menos disponível. Em Atenas, por exemplo, somente com trajes de turista - o que não era o meu caso - é que alguém tinha boa chance de lograr um táxi. E tal se deve ao pouco conhecimento do visitante dos trajetos e sobretudo das tarifas de táxi...

       Mas, tratando de o que aconteceu ontem, os taxistas - que terão seus válidos motivos para reclamarem do Uber - se tem todo o direito de protestarem contra uma concorrência que considerem desleal, não podem fazê-lo nunca da maneira como o fizeram.

       E o erro dos taxistas foi duplo. Porque a liberdade deles protestarem termina no espaço que é próprio do usuário. E tampouco devem recorrer à violência ou à coerção, que é ainda pior. O táxi já foi sinônimo de  veículo que se utilizava em situações limite, ou por grande urgência, ou por necessidade de estar em local de difícil acesso.

        Por isso, confunde-se que um serviço de utilidade pública se transforme em  transtorno para milhares de pessoas, e não pela sua falta - o que é lamentável, mas não pode censurado (porque o motorista está exercendo um direito  seu - mas por um desvio de violência, seja virtual, seja mesmo real, no caso de ataques à concorrência do Uber.

         Em meio à omissão do Poder público, seja da P.M., seja da Prefeitura, que é deplorável e condenável, mas que infelizmente constitui uma característica comum para o carioca - segurança e bons serviços só em grandes ocasiões em que estejam presentes muitos estrangeiros. Quando são autoridades, então as atenções chegam ao paroxismo, que deve ser um sintoma ainda remanescente do persistente servilismo colonial ! - a indiferença das autoridades e do próprio Prefeito é de causar mais do que espécie, revolta.

          Há um limite para tudo - para a demonstração, para o protesto, para a negação do próprio serviço. O que não é admissível, mesmo nesta Cidade Maravilhosa, é infernizar a vida de quem nada tem a ver com essa quizília, e ainda  por cima negar-lhe a liberdade de ir e vir.

          E tudo isso com a conivência, pela própria fraqueza, da Autoridade citadina.

          

( Fonte:  O  Globo )

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