Há uma mistura explosiva no
projeto de ajuste fiscal. Mal ou bem, a barreira da Câmara tem sido vencida. No
entanto, o panorama no Senado se afigura bastante mais problemático.
Para entender
melhor o problema, é importante ter presentes as considerações seguintes:
(a) a primeira fase, a da preparação pela equipe
de Joaquim Levy, produziu a
princípio o ajuste ideal. No entanto, as resistências no Congresso logo se
afirmaram, e se passou, sem maior resistência, para o ideal modificado;
(b) o
corte evoluíu do desejável para o possível.
Mal ou bem, no entanto, com cortes substanciais no projeto inicial, se
continuou com a discussão na Câmara. Nesse formato, o Governo logrou aprovar,
por vezes com concessões adicionais, o Ajuste Fiscal na Câmara;
(c)
como o Governo Dilma Rousseff tem no papel a
maioria, desperta espécie a resistência que vem provocando o Ajuste Fiscal (já podado em alguns itens
considerados de difícil ou improvável aceitação). Para explicar a crescente dificuldade
enfrentada por Levy e o Palácio do Planalto de criar condições efetivas para
que a economia possa recuperar-se da rebordosa provocada pelo primeiro mandato
de Dilma Rousseff (o chamado Dilma I) será preciso ter em mente:
(c-1) que a Presidenta foi eleita com o compromisso de que manteria a política
anterior. Foram ocultadas as decisões de que tais promessas eram necessárias,
mas com curtíssimo prazo de validade, a fim de não abalar a confiança do
eleitor e que o pós-eleição implicaria noutra estória, pois o Governo também
sabia que a sustentação pós-segundo turno
das promessas eleitorais era impraticável;
(c-2) outra coisa que se esquece: as bancadas eleitas para o Congresso, no
esquema de sustentação do governo do PT, foram igualmente alavancadas por tais
promessas. Ficaria complicado, por conseguinte, para essas bancadas, que
formariam, a decantada base de apoio do Dilma
II, que num passe de mágica (ou de estelionato eleitoral) ficasse o dito
por não dito, e as bondades prometidas substituídas por maldades
necessárias;
(d) outro aspecto que se transforma em
fator negativo é a impopularidade de Dilma. Uma vez terminado o processo
eleitoral, o júbilo do triunfo substituído pela dura realidade (que se
escamoteara ao Povo), a reação do Povo brasileiro por uma série de circunstâncias-
raiva
com o engodo e as mentiras da plataforma e dos debates;
explosão
do Petrolão e a óbvia
responsabilidade não só de Lula da Silva, mas também de Dilma Rousseff – ela considerada pela maioria como sabendo de
o que se passava na Petrobrás, e por isso chamada de mentirosa e falsa);
(e) por
outro lado, o êxito do movimento Fora! Dilma, com grandes concentrações de gente nas principais cidades, a que
se contrapôs uma manifestação programada da CUT, com público esparso e pouco
numeroso. Os panelaços também repontaram por toda parte, a ponto
de o fenômeno
Sarney acometer a Dilma II, que passou a ter fobia de comícios e manifestações
multitudinárias. Daí a sua recusa de falar no 1° de Maio, e ela
a primeira presidente a agir dessa forma;
(f)
das
ruas se passou às salas de Senado e Câmara. A base de apoio, e o fraquíssimo
ministério que fora antes lançado se mostraram incapazes de traduzir a
maioria que aparentavam no papel. Tudo
isso acelerou um processo de
desmoralização da Presidenta, que se
recolheu a Palácio, e acabou
delegando a representação política para o antes menosprezado Vice-Presidente
Michel Temer. Nesses termos, a fraqueza do Governo DILMA II se tornou mais
um reagente negativo, aumentando o destemor de antigos aliados ora transmutados
em ferrenhos opositores (Renan Calheiros
é um bom exemplo). Por outro lado, a situação na Câmara – em que Eduardo Cunha
humilhou a Presidenta, arrebatando a presidência da Câmara do PT, com o
seu candidato Chinaglia, e a inepta articulação de A. Mercadante;
(g) tendo presente as considerações acima, apesar
de o Plano de Ajuste Fiscal ser de boa feitura, e adequado para as presentes
circunstâncias, diante do descalabro fiscal (provocado por Dilma I), a
resistência bem-sucedida do Congresso, a falta de força da Presidenta (que
sequer tentou barrar o mui inflacionário aumento do Judiciário, demagógica e
sem a necessária responsabilidade fiscal pretendido (e na prática, pela
fraqueza de Dilma, já uma incômoda realidade) pelo Presidente do Supremo
Ricardo Lewandowski, que poderia ter contido o efeito explosivo desse aumento
de remuneração de uma atividade já muito bem paga).
Dadas tais condições acima – a fraqueza de Dilma e de seu governo; o
pouco ou nenhum temor que a impopular Presidenta possa provocar; e o crescente ímpeto das oposições (a que
incongruamente até partes do PT – sem falar da combalida e pouco fiável base de
apoio – se podem associar, por descarado
oportunismo), são duas as perguntas que pairam no ar:
I - Quem
tem medo de Virginia Woolf, no caso o governo Dilma II ?
II - Que
ajuste fiscal – com dentes, meio desdentado ou sem dentes –
será posto
na bandeja do Ministro da Fazenda, Joaquim Levy ?
(Fontes: O Globo, Folha de S.
Paulo)
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