sábado, 13 de fevereiro de 2016

É a economia, estúpido ! (2)


                           
        Ocupei-me no blog de ontem, motivado por especial menção de Paul Krugman ao papel negativo no quadro do Brasil, dentro de suposta repetição do cenário que precedera à crise anterior, acionada pela falência do Banco Lehman Brothers em 2008.

        O segundo mandato de Dilma Rousseff - que se segue ao desastroso primeiro - pode continuar pesando na economia brasileira, dada  a lentidão que se observa nos supostos mecanismos corretivos - um dos quais é o impeachment e o segundo é a anulação do pleito por processo que corre no  TSE.  

        Quanto ao impeachment, a situação se vê complicada pela posição do Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que tem interminável processo de cassação de mandato tramitando na Câmara, assim como por ação do Ministério Público.

        Por outro lado, a intromissão do Supremo, pela polêmica moção do Ministro Luís Roberto Barroso, provocou conhecidas reações quanto à legalidade da decisão, notadamente no que concerne à constituição da comissão especial da Câmara (voto secreto ou voto aberto) e também no que tange às candidaturas avulsas. Há óbvio mal-estar na mão pesada da intervenção do Supremo, que foi mal recebida por grandes nomes do STF, como o ex-presidente Carlos Velloso. Há sensação de que não se respeitou o artigo 2° da Constituição, quanto à independência e harmonia entre os Poderes da União (no caso, Legislativo e Judiciário).

         Se há dúvidas quanto ao modus faciendi da correção da crise, acumula-se a realização no que concerne ao caráter calamitoso da indicação por Lula da Silva  de Dilma Rousseff como sua sucessora. Infelizmente - e é preciso repetir tal consideração - os pleitos não são votados, na prática, pelo eleitorado com base nos valores respectivos dos candidatos.

           Sofre o eleitor um condicionamento que é típico  do Nordeste brasileiro. Prepondera, dessarte, a vontade do magno-coronelão, no caso Lula da Silva. A despeito do candidato da oposição ser incomparavelmente mais preparado, ele adotou, na realidade, postura quase submissa, ao haver concordado tanto com a dissidência virtual do chefe político do PSDB em Minas Gerais, Aécio Neves, que se negara a integrar a chapa, quanto criou condições para que José Serra tivesse um candidato a vice que não estava à altura do cometimento. Há outros aspectos que dizem respeito a um eventual processo de cristianização[1] de Serra em Minas, o que, embora mais difícil de provar, estava no ar. Até em política, no entanto, o castigo pode vir, ainda que tardio. Quatro anos depois, apesar de sua pretensa enorme popularidade em Minas, como ex-governador,  Aécio Neves seria ali derrotado pela 'mineira' Dilma Rousseff, o que despertou certa espécie. De qualquer forma, como o apoio de Aécio a Serra fora ,em 2010, abaixo da crítica - o que gerou tensão entre os dois expoentes do PSDB - a magra colheita de Serra há de ter repercutido em  2014, com favorecimento de Dilma, que ganhou na votação geral com 3,5% apenas de diferença. Não há negar que os votos de Minas fizeram muita falta a Aécio...

       Por isso, se a influência do magno-coronel Lula da Silva teve indubitável relevância em 2010, o seu peso careceria, no entanto, de ser relativizado de alguma maneira, eis que tanto na composição da chapa da oposição, quanto na própria campanha, a oposição pecou tanto por ineptitude, quanto por falta de postura mais agressiva. A propaganda de Serra, por exemplo, chegou a tentar uma patética aproximação com Lula da Silva, indo ao ponto de apresentar Serra como virtual seguidor do fundador do PT...

        A par disso, como foi já referido, Lula da Silva se pautou por uma falsa premissa - a de que poderia voltar ao Planalto quatro anos depois, como se existisse no Brasil um maximato mexicano[2]. Todos sabemos como terminou essa doce ilusão, o que uma vez mais reafirma a força do poder institucional, que logrou até atropelar as então veleidades de Lula, que foi nesse período em torno da segunda eleição de Dilma um personagem beirando o patético.

        No entanto, forçoso se afigura reconhecer que, mesmo para Dilma, poderia ter sido melhor que o plano 'B' de Lula houvesse funcionado... De toda maneira, o segundo mandato já começaria muito mal, eis que as mentiras da campanha eleitoral se tornaram patentes, e a revolta da população, com a consequente reviravolta, produziu de repente um dos presidentes de maior impopularidade da história brasileira. Não demorou muito que a aprovação de Dilma ruísse a apenas um solitário dígito...

        Não há nada que mais revolte o povo que descobrir-se enganado, desmoralizado mesmo, com uma série de sanhudas mentiras que não poderiam deixar de lançar à terra a aceitação da Presidenta, de chofre mandada para o infermo astral dos fementidos e dos mentirosos.

           Raiva igual só houve contra José Sarney, por causa do conto do vigário do Plano Cruzado, e não há retrato mais desmoralizante do que o quadro do Presidente tornado na prática refém da raiva brasileiro em um ônibus sitiado por populares no Rio de Janeiro...

           Depois disso e do fracasso do reforço in extremis do Ministro Joaquim Levy (que a própria Dilma cuidaria de inviabilizar por uma séria de medidas e atitudes estultas), o segundo governo Rousseff agoniza em praça pública, com um impeachment que a situação do Presidente Eduardo Cunha complica de certa forma.

            De resto, como já foi dito, a emenda 'Barroso' apareceu como 'um ponto fora da curva' e tudo dependerá da situação política para saber se o impeachment vai prosperar ou não, e se a 'solução' alternativa do TSE porventura vingar, o Brasil terá - ou não - um novo governo.

            A impressão geral seria que a permanência de uma esvaziada Dilma Rousseff no Alvorada constituiriam mais três anos perdidos para o Brasil, eis que tanto a Presidenta, quanto o seu Partido (que agora se especializou em propaganda subliminal, em que as letras PT, com a sua marca de vergonha, não mais se vêem) parecem aquelas projeções holográficas (como a do filme do Superhomem em que o seu pai morto lhe mandava a imagem projetada e falante).

             O Brasil já passou por um processo de impeachment, mas que foi assaz diverso do atual. Se ambas as figuras estão desmoralizadas, no caso de F. Collor ele não dispunha de grande partido, o que decerto facilitou as coisas, quando, outrossim, havia a figura de um Vice respeitado no mundo político.

             Mutatis mutandis, será acaso válido o exemplo de Michel Temer? Embora nada haja contra o prócer do PMDB, tampouco as figuras de Vice são comparáveis em peso político.

              Se Lula foi egoísta ao extremo na indicação de sua Chefa de Gabinete como sucessora, agindo como se a presidência de um país como o Brasil se coadunasse com a própria atitude egotista. Sem embargo, como não terá refletido muito sobre as implicâncias mais amplas do tema, sequer lhe terá passado pela cabeça o que de fato ocorreu. Apesar de economista, a verdade é que também nesse aspecto a mediocridade é sua característica. Assim, os estragos que a Rousseff aprontou sequer lhe terão passado pela cabeça.

              Mas Dilma tem outra característica potencialmente perigosa. Ela tem ideias próprias, não gosta de delegar, e tem uma queda para cercar-se de gente medíocre. Junte-se personalidade forte, uma educação social deficiente, e uma tendência a desejar posições  preponderantes em relação ao seu círculo.

              Esta é uma fórmula homicida se ela deseja afastar os melhores, seja em termos de inteligência e cultura, seja em termos de caráter. A sua disposição belicosa e que não recua diante das humilhações infligidas àqueles que não tem condição ou de responder-lhe, ou de colocá-la no próprio lugar, só sofre reveses quando é surpreendida por gente - que ela pense deva ser dócil e  humilde - e que, para sua surpresa, reverta o quadro, pela coragem e a força da personalidade. É conhecido o seu incidente com a cabideira no Palácio do Alvorada. A empregada podia ter função de baixíssima hierarquia, mas tinha brios.  Isso surpreendeu a Presidenta e a chamada guerra dos cabides acabaria com paz negociada, em que a subalterna saíu com diversas vantagens, uma vez verificado o estrago que seria para o personagem de Dilma Rousseff que fosse conhecida a maneira com que ela transita nos domínios heris.

                Por último, a ruína provocada na economia pelos governos de Dilma Rousseff. Detonou o Plano Real,  cuja reconstrução demandará muita paciência e, uma vez quebrada a confiança, maior será a travessia e os perigos de lhe reconstituir algo próximo da antiga solidez. Somente sólida ignorância pode justificar a sua leviandade em afrouxar os controles da inflação, cercando-se de gente fraca no Banco Central, que timbravam em fazer aquilo que ela queria, sabendo embora quão nocivo seria para o Real. Se o suposto dique contra a inflação não funcionou, não há de surpreender que já estejamos nos onze por cento ao mês, com toda a infernal tralha dos indicadores automáticos funcionando, para a orgia na hiper-apreciação dos serviços.

                  Dilma deve ter algo de muito entranhado contra a diplomacia brasileira. Além de colocar non-entities[3] na cadeira ministerial, humilhou por mais de uma vez o Itamaraty, prestigiando funcionários de partido, sem qualquer cultura diplomática, e que só podem trazer para o que foi a Casa de Rio Branco uma visão sindicalista, às vezes ainda tingida por ultrapassado marxismo-leninismo. Como Lula, que pensara beneficiar o ex-bispo Lugo, dando ao Paraguai vantagens muito acima dos montantes devidos, antes acertados em longas negociações diplomáticas, Dilma agiu de forma truculenta mandando suspender o Paraguai (por que este se recusava, com boas razões, a admitir como membro a Venezuela).

                 A Presidenta deve ter algum secreto rancor contra a Casa de Rio Branco. Talvez lhe desagrade a secular competência de que antes de sua vinda deu amplas mostras, a ponto de mandar que o Brasil não se opusesse à conquista da Crimeia pela Federação Russa. Com esta instrução, Dilma desrespeitou cláusula constitucional, que proíbe a guerra de conquista (como foi o que ocorreu com a invasão da província da Ucrânia e sua posterior anexação por Moscou).

                    Talvez a pior governante republicana do Brasil, Dilma Rousseff, além de trazer a inflação de volta, causou com a sua desastrosa política econômica das desonerações tributárias criou dívidas em nossas contas que não serão pagos em décadas (a conta chega a R$ 135 bilhões entre 2011 e 2015). Mas os filhotes da desoneração fiscal não foram ainda estancados: para 2016, a estimativa da Receita Federal é de mais R$ 32,2 bilhões. Por outro lado, ela que se quer a grande amiga dos trabalhadores, causou enorme recessão e um grande número de desempregados, como se verifica no presente.

                    É esta talvez a imagem mais dura da crise econômica, e também mais cruel, ao quantificar a incompetência de gestão que, malgrado os altissonantes projetos, atinge em cheio os trabalhadores. São 8 milhões e oitocentos mil que estão de braços cruzados, e não por vontade própria.  Chega, portanto, a mais de dez por cento a nossa taxa miséria, aqueles que estão desempregados, não porque o desejem, mas pela incompetência do governo de Dilma Rousseff.

                     E é por isso que este modesto blogger resolveu dar a essa questão atenção um tanto maior, tentando aprofundar e fazer entender o que pode significar uma decisão errada na indicação de pessoa despreparada para exercer a função de Presidente da República Federativa do Brasil. E é também por isso que aquela frasezinha de Paul Krugman "economias emergentes anteriormente na moda como o Brasil,  de repente se estão dando muito mal" me mostrou o que o Brasil tinha pensado conseguir, e tudo aquilo que perdeu, pela conjunção de fatores acima descrita.

 

(Fontes: The New York Times, O Globo, Folha de S. Paulo; Getúlio (1945-1954) Lira Neto, Companhia das Letras; coluna de Míriam Leitão)     




[1] Cristianizar um candidato foi termo criado por contra do procedimento eleitoral do PSD com relação ao seu candidato a Presidente em Minas, no pleito de 1950, Cristiano Machado. Os caciques desse partido mandaram despejar os votos, que seriam de Cristiano, em Getúlio Vargas.
[2] É sempre o modelo de Plutarco Elias Calles que instaurou no México do fim dos anos vinte e começo dos trinta, o chamado Maximato. Na prática, ele permanecia no poder, enquanto se elegiam os presidentes 'peleles' (fantoches). Lazaro Cardenas, o grande presidente mexicano, acabaria com o ciclo, quando colocou o líder máximo Plutarco em avião com destino aos Estados Unidos...
[3] Nulidades.

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