quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Os Efeitos das Pedaladas


                                  

        Para o Governo Dilma, as pedaladas fiscais - cujo emprego constituiria a base da petição do impeachment, consoante apresentada pelo Dr. Hélio Bicudo -  são ora vistas como 'página virada'. Dessarte, consoante Dilma e sua equipe, o pagamento de todos os passivos condenados pelo Tribunal de Contas da União derrubaria o argumento da oposição de exigir a saída da presidente devido à má-gestão das contas públicas.

        Primo, analisemos o rombo nas contas públicas, devido à sua divida de R$ 72,4 bilhões com bancos públicos (Banco do Brasil: R$18,19 bilhões; Caixa Econômica Federal: R$ 1,51bilhão;  Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social: R$ 30 bilhões,04;  e o FGTS: R$ 22,64 bilhões).

        Tenha-se presente, de início, que as pedaladas constituíram graves infrações à Lei da Responsabilidade Fiscal (LRF). A circunstância de, ao cabo do exercício de 2015, o Governo apareça na vigésima quinta hora para saldar as suas dívidas com estabelecimentos oficiais de crédito e o FGTS - em flagrante descumprimento das normas da LRF - pode voltar  a habilitar essas entidades oficiais a gerirem os respectivos recursos, mas não elide a respectiva responsabilidade pelo desrespeito da LRF.

         Esse mesmo desrespeito está na raiz da primeira proposta orçamentária feita por Dilma II (o que assinalou não o início do fim da ministrança de Joaquim Levy, mas na verdade o começo da aceleração da fase terminal  da presença de Levy no Governo, através da falta de respeito de Dilma Rousseff com o seu auxiliar mais prestigioso).

         Por questões de temperamento mais do que de doutrina - é difícil carimbar de doutrinal o voluntarismo desordenado de Dilma Rousseff em termos de utilização de dotações públicas, e é esta divergência  fundamental que afastou da administração Dilma o seu mais preparado e prestigioso membro. Assim como o azeite não se mistura com a água, tampouco haveria possibilidade de que um egresso da Universidade de Chicago pudesse conviver com a economista Rousseff, que sequer dispõe de qualquer título de aperfeiçoamento. Assim, ao mandar para o Congresso proposta orçamentária com polpudo déficit, Dilma II lograria o que de forma praeter-consciente desejava: livrar-se do ortodoxo e certinho J. Levy. Pena que no caminho também lograria rebaixar a nota de nossa economia pelas agências de classificação de risco, de Wall Street.

           Embora o indicador do Impostômetro de São Paulo, tenha marcado que em termos de tributos o Brasil ultrapassou os dois trilhões de reais, essa marca põe a nu que o peso dos impostos ameaça quebrar a espinha de nossa economia. Com tal montante, estamos onde estamos, não é uma questão acadêmica a dispersão ou o desvio dos importes fiscais no Brasil.

            Os tributaristas podem zombar do caráter primitivo de tal mostruário, mas o seu incômodo volume não deveria ser motivo de chacota. Ele é apenas um sintoma - pouco sofisticado talvez - mas sempre sintoma de quão confuso está o setor fiscal na nossa economia.

             Se o Brasil verga sob a sárcina tributária, o governo, nos seus três ramos, mas com a União federal à frente, é também o responsável pelo desperdício dos impostos pelo tácito conluio da inércia e da consequente falta de eficácia pública na desordenada regressão social do gigantesco nó-górdio tributário.

              E, assim, como decorrência das químicas fiscais e da dita ficção contábil, as chamadas pedaladas - justamente condenadas pelo TCU em um raro juízo unânime - algo se metastizaram em espetacular inchamento da dívida pública, ora nas alturas de R$ 118,6 bilhões ainda em 2015.

              Ao vir a público para reivindicar mais esta magna realização no desfazimento do Plano Real, da L.R.F., e de quaisquer fumaças que os gerarcas desta Administração alimentem de posições de liderança no FMI, acho que se, sob a notória liderança do Supremo Tribunal Federal - que resolveu invadir o sáfaro campo do Congresso - incapaz de legislar, mesmo sob ameaça de perda de poder (como se verificou no desatendimento da necessária adequação de  lei de 1950 sobre impeachment, o que permitiu que o STF adentrasse a seara do Legislativo, com as consequências manifestadas na sentença em que favoreceu o Senado e, por conseguinte, a notável governante Dilma Rousseff). 

              Além da rotineira pergunta - que país é este, em que as Câmaras não legislam, e as injunções da Constituição Cidadã não são atendidas - o que faremos com o obtemperação da Câmara: afinal como trabalhar tanto se temos uma semana de dois dias úteis apenas?

               E, como a ocasião parece exigir, seria o caso de dar um viva ao Brasil por continuar funcionando, dentro das condições prevalentes?

                Tenho minhas dúvidas. Merecedor de vivas é o juiz Sérgio Moro. Se não fatiarem mais a sua área de competência, ele continuará a ser um dos solitários fanais a orientar a gente brasileira, pelo seu trabalho e pelas suas sentenças, que fazem tremer muitas personalidades, temerosas, sabe-se lá porquê, que ele  venha metaforicamente bater-lhes nas portas blindadas, de que a nossa Justiça, com a assistência da Polícia Federal, não ignora os segredos.

                Assim como nos anos anteriores, bom trabalho e boa colheita ao juiz Moro e ao seu exército do bem.

                 Que o Brasil dele está muito precisado.

 

(Fontes: O  Globo, Folha de S. Paulo, Veja)

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