sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O S.T.F., a Crise e o Brasil


                                            

         O trágico no problema Dilma Rousseff é que, por mais ineficaz e incompetente que tenha sido no seu mandato e meio, ela está prestes a completar mais um ano de seu novo período constitucional. Há poucas unanimidades sobre a sua presidência. No entanto, ela tem por trás de si um grande - inda que um tanto desarvorado - partido, e ao longo desses quase cinco anos a sua presença ideológica terá, para o mal e para o bem, marcado o próprio querer.

        Por outro lado, ninguém desmonta - por mais involuntária que seja a ação - do dia para a noite uma longa adesão ao poder, como é o caso das presidências Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2015), esta última com a interrogação até (ou não) 2018.

        A sombra de Dilma Rousseff esteve muito visível ontem, no teatro do Supremo. Debalde, o Ministro Édison Fachin mostrou, com mestria e saber, ao que veio. No seu voto - elogiado por todos, embora em alguns casos com ferrão de opositor  - saudado com encômios merecidos, mas muita vez turgidamente aumentados para melhor esconder as negações pontuais com que muitos, não tão de socapa, lhe roubavam o mérito, inserindo disposições que lhe desmereciam do espírito.

       Além do benjamin Édison Fachin, que confirmou o mérito (e o saber) jurídico, surpreendeu-me de forma muito positiva o presidente do TSE, Dias Toffoli, que tem crescido muito neste seu último cargo. No seu voto oral, mostrou segurança e tirocínio, ao apontar para as distorções quanto à posição do Senado, e sobretudo em desmontar a tese de fortalecimento da posição do Senado em relação à Câmara.

        O oportunista Luis Roberto Barroso trouxe as modificações que a bancada de Dilma aguardava ansiosa. Assim como o seu artigo (um ponto fora da curva) chegara eivado de oportunismo, essa mesma destreza se mostraria no seu voto, com que iria desestruturar a construção - decerto melhor por que mais sólida - do Ministro Fachin. O futuro dirá qual será a influência além de ontem desse voto pró-Dilma, no que concerne ao progresso do impeachment.

       Só surpreende em uma votação quem tem valor intrínseco. Os Ministros Fachin e Dias Toffoli estão hoje solidamente presentes nesse pelotão.

       Quanto aos que deixaram um travo amargo, seja por negar-se à evidência, permito-me mencionar Carmen Lúcia que não se deixou impressionar pela argumentação, clara e inequívoca de Toffoli, quanto à intervenção interna corporis nas candidaturas avulsas na Câmara (trouxe a sua intervenção já preparada de casa, cerrada portanto a uma eventual mudança).

        Certas vitórias, decerto, só são possíveis com a conivência do Poder atingido. Há uma clara crise no Congresso - crise esta que vai de valores a personalidades. O intervencionismo excessivo - que marcou a sentença de ontem, tão desmerecedora da grande qualidade do voto do novato, mas competente Ministro Fachin - é também direta consequência da crise  no Parlamento.  Esse crise - ou momento de verdade, se tivermos presente o conceito helênico - se deve muito ao momento político brasileiro, e a mediocridade extrema de boa parte de sua representação política.

         Se Dilma Rousseff, um dos piores presidentes do Brasil, reflete decerto esse opaco momento da realidade nacional, não nos iludamos como se ela fosse uma extraterreste, aqui incongruamente colocada por capricho de seu suposto criador, essa mesma realidade subsiste em outros ambientes, como no Congresso Nacional.

         Sobre os seus dois Presidentes pesam sombras graves, como o próprio Ministro Teori Zavascki, encarregado da operação Lava-Jato no Supremo, se viu forçado a disjungir, determinando busca e apreensão da P.F. nos domínios do Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, mas liberando da mesma ação o Presidente Renan Calheiros, do Senado Federal.

         Que em tais instituições demorem personalidades não isentas de suspeitas, tende a torná-las menos afirmativas. A investida do Supremo contra determinações que melhor seria deixar sob o cuidado da instituição respectiva cria um desafio a que tanto Câmara e Senado hoje encontram dificuldade em responder dentro da ótica da igualdade dos magnos poderes republicanos.

         A maioria oportunista, sob a voz nova do Ministro Luis Roberto Barroso, se propõe impor mudanças - que muitos julgam casuístas - que vão ao ponto de derrogar votações já realizadas em outro Poder, o Legislativo, que nas suas relações com os outros dois Poderes, não deveria estar habituado a tais verticalismos.

         Tudo isso se decide infelizmente não para determinar o sexo dos anjos, eis que todas essas modificações a posteriori terão consequências que serão sentidas na só na nossa indigente atualidade, mas - e quem poderá denegá-lo - em  momentos mais distantes da realidade brasileira.

         Há um grande humor que prefiro não qualificar nos votos emitidos pela maioria dos Ministros do Supremo, quanto ao sábio parecer do Ministro Edson Fachin. Assim como os presentes dos gregos - Timeo Danaos et dona ferentes [1]- estão na raiz do verso famoso de Virgílio, a situação do Brasil exigiria quiçá maior seriedade de muitos dos nossos magistrados na Corte Suprema, eis que, nesse trágico momento nacional, temos muitas razões para temer as dádivas - feitas decerto com as melhores intenções - daqueles que julgam votar em favor do mandato de Dilma Rousseff.

          Tem os Senhores por acaso lido as páginas econômicas e financeiras de nossos melhores jornais?

          Tem os Senhores noção dos perigos ainda maiores que a permanência de Dilma Rousseff na Presidência da República pode causar à Nação brasileira, tanto aos grandes, quanto aos pequenos cidadãos - todos iguais decerto perante a Lei - desse enorme país, tão bendito pelos deuses, e tão maltratado pelos homens?

 

( Fontes:  O  Globo, Folha de S. Paulo, Virgílio - Eneida )



[1] Tenho medo dos Danaos, sobretudo quando dão presentes (Eneida).

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