quinta-feira, 3 de março de 2016

Tempestade no GOP


                               
         Os resultados da Super-terça, que reforçaram ainda mais a pré-candidatura de Donald Trump, acirraram a ebulição no comando republicano, que vê com grande preocupação, para não dizer medo, o avanço do populista Trump para assenhorear-se da Convenção do Partido. Por isso, e vivamente incentivado pelas instâncias de comando do GOP, Mitt Romney, o candidato republicano à Presidência derrotado por Obama em 2012, lançou, em local preparado às pressas, violenta diatribe contra o pré-candidato Trump, dando a clara impressão de que não desdenha ser candidato outra vez, e por isso não hesitou em associar-se à tentativa vizinha quase do desespero para conter de qualquer jeito a dinâmica de Trump.

       Já é consenso no establishment[1] republicano, que a direção partidária esperou demasiado para tentar parar o avanço de Trump. Partindo da subestimação a princípio - "o candidato do verão" - além de indisfarçável  menosprezo no que toca ao personagem. É esta a imagem a que os gerarcas republicanos se aferram, como espécie de tábua de salvação. Nesses termos,Trump, com seus procedimentos descabelados ou fora da ética, como a contestação de que Barack Obama fosse cidadão americano, terá projetado imagem de figura pitoresca que lograria ter alguma aceitação passageira, mas que pelo seu caráter, fora dos procedimentos normais dos candidatos, não reuniria condições de sustentar-se por muito no topo das pesquisas. Em outras palavras, para os dirigentes do Partido Republicano, Donald Trump faria, por um tempo, muito barulho, mas seria candidato efêmero, por parecer  pitoresco, popularesco e bombástico. A fortiori, os chefes do partido vêem com grande inquietação, a possibilidade de o candidato presidencial Trump dar aos democratas a maioria no Senado, e importantes governanças nos Estados, mas, como escrevi ontem, na Câmara  isto é quase impossível, pelo gerrymander sofrido pela Câmara baixa, e que levará tempo para ser sanado...

        Esta convicção do estamento republicano semelhava a princípio fazer muito sentido, e os grandes personagens julgavam que não valeria a pena afanar-se em barrar o caminho do candidato populista, confiados em que ele próprio faria alguma besteira ou outra derrapagem similar. A direção do GOP imaginou esse roteiro e nele baseada, julgou que não haveria necessidade de maior desgaste no episódio, pensando que o populista Trump acaberia rendendo-se às evidências.

        Esses grandes personagens esqueceram-se de  princípio básico em política. Não é sensato, nem seguro menosprezar um adversário, e ainda por cima, abrir-lhe espaços, na esperança de que o próprio se encarregue do serviço que cumpriria, na verdade,  à direção partidária.

       Dentro da democracia americana, poderão aventar que tal verticalismo seria inviável, e que tenderia a contrario sensu reforçar o candidato. É lógico que a direção do GOP não pode afastar da concorrência quem dispute com  os demais o apoio dos militantes. Mas há um grande abismo entre a pasmaceira e a inação, de um lado, e de outro, essa tentativa de cunho autoritário e quase in-extremis contra o pré-candidato.

       Porque dormiram, embalados pelas cantigas de ninar de que de alguma maneira a coisa se resolveria nos conformes de sempre, é que acabaram despertados pelo avanço inarrestável daquele candidato, que insistiam em desmerecer e carimbar de incapaz de virar o jogo.

       Ora, como qualquer cidadão americano há de reconhecer, Donald Trump continuou avançando, enquanto os queridos da direção, como Jeb Bush, se retiravam, cabisbaixos da porfia. A esse último tudo fora disponibilizado, inclusive gordos fundos para financiar a campanha. O que faltou a Jeb Bush, não foi decerto o apoio financeiro da família e de todo o esquema Bush, mas sim carisma e proposta política.

        O pelotão republicano tinha muitos nomes, mas poucos líderes com trânsito no povo americano. Daí, como as folhas secas nesse período que anuncia a chegada dos grandes frios e do inverno boreal, muitas dessas criaturas começaram a cair, como Cris Christie (cujas fumaças ele perdera em escândalo na Nova Jersey) Carly Fiorina e Ben Carson, o negro-republicano.

         Entrementes, Trump seguia em frente, começando a coletar delegados na série das primárias em que, ignorando os preceitos da hierarquia, teimava em vencer.

          Posto contra a parede, vendo que Donald Trump teimava em não distinguir a clara realidade (segundo a direção do GOP) e prosseguia no seu avanço, coletando maiorias em muitos estados, o Partido afinal resolveu intervir com um suposto grande dignitário, o candidato Mitt Romney (2012) que continua com fumaças de reapresentar-se, não obstante a sua fraca campanha contra o presidente Barack Obama. Ganhou, por displicência de Obama, um dos debates, mas seria vencido no seguinte e o que é pior, cometeu uma gafe (que, constitui, de resto particular familiar, eis que o seu pai acabara então com a própria campanha com a gafe da lavagem cerebral). Caberia a Mitt Romney seguir tais fatídicas pegadas, ao fazer o comentário dos 47% de inúteis (sustentados pelo Partido Democrata), e que um barman, no encontro de grandes doadores, não só distribuiria drinks, mas também desvelaria a observação preconceituosa.

          Na sua alocução, Mitt Romney investiu contra Trump, a quem procurou desqualificar ("não tem nem o temperamento, nem o juizo para ser presidente.  Sua política interna levará os Estados Unidos à recessão, e a política externa tornará os Estados Unidos e o mundo menos seguro."

           John Mc Cain, o candidato derrotado por Obama, e a quem Trump tratara grosseiramente, apareceu também para significar a sua insatisfação com a candidatura  do magnata nova-iorquinho.

             Por fim, não se pode ignorar que no seu afã de oferecer-se como candidato da hierarquia  (inclusive aventando uma Convenção especial, supostamente sob controle estrito do comando do GOP), Mitt Romney esquece comportamentos passados  que o põem em situação constrangedora.  Além de gestionar de modo pressuroso o endosso de Trump em 2012 (apoio que Romney, como  candidato republicano, então  tratou de divulgar com destaque), tampouco este último se terá dissociado do comportamento então de Donald Trump, que buscava incomodar Obama com a acusação de que ele não era americano nato...

             Para encerrar, continuam na disputa os Senadores Ted Cruz e Marco Rubio, e o governador  John Kasich. Este último, pretende por todas as suas fichas na primária de Ohio, de que é filho favorito (favourite son), a expressão típica para designar candidato que dependa do próprio reduto natal para avantajar-se na política. Dos três, Cruz tem o melhor desempenho, vencendo algumas primárias, e Rubio, que tem uma única  vitória,  embora permaneça ainda na corrida, já esteve melhor. Quanto a Kasich, põe todas as fichas no seu estado de Ohio, o que só poderia valer se pensa arrebatar a nomination não através de votos, mas sim graças ao apoio da hierarquia, junto à qual acredita ter trânsito.

 

( Fonte: The New York Times )



[1] estabelecimento

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