sábado, 18 de julho de 2015

Dílmica Diplomacia

                                             

        Não sei se Dilma Rousseff, pelos seus antecedentes no setor, se qualifica como mediadora do conflito no Essequibo.

        De toda maneira, a questão de saída não me parece bem equacionada.  A Presidente do Brasil foi convidada pelo Presidente da Guiana, David Granger, para que mediasse  uma solução pacífica para a disputa territorial entre a Guiana ex-britânica e a Venezuela.

       Em reunião entre a Presidente do Brasil e o presidente da Guiana, que precedeu à reunião de cúpula do Mercosul, Dilma Rousseff terá aceito o convite. Data venia, não deveria te-lo feito, antes de que a Venezuela se pronunciasse sobre a questão.  A isenção do mediador é conditio sine qua non[1], e por isso a autoridade mediadora só pode assumir o encargo com a concordância das duas partes.

        Por outro lado, Nicolas Maduro, ao saber que Dilma estava recebendo Granger, tentou participar da conversa. Dilma teve de barrar-lhe a entrada, no que estava certa. Maduro parece não ter aprendido nada com o seu protetor Hugo Chávez, de quem foi ministro do exterior.

        Aí Maduro subiu nas tamancas, e resolveu sair mais cedo da reunião de cúpula no Itamaraty.

        Talvez habituado a resolver as coisas como no seu quintal, de forma truculenta, o presidente venezuelano abandonou a cúpula antes do tempo. Tampouco ele e a delegação venezuelana participaram do almoço oferecido por Dilma, como é de praxe, no Itamaraty.

         Também na reunião a Presidente do Brasil, assessorada por Marco Aurélio Garcia, declarou: “Somos uma região que sofreu muito com as ditaduras. Somos uma região onde a democracia floresce e amadurece.  No ano passado, houve eleições gerais no Uruguai e no Brasil. Este ano, é a vez da Argentina e da Venezuela. A realização periódica e regular desses pleitos dá capacidade de lidar com as diferenças políticas. Temos de persistir nesse caminho, evitando que as disputas incitem a violência. Não há espaço para aventuras antidemocráticas na América do Sul.”

         A intervenção de Dilma é um recado, ainda que atrasado, para Caracas. A despeito de todas as confusões na terra portenha, não há quaisquer dúvidas sobre a realização aí dos comícios. O que se reclamou antes –a própria oposição venezuelana se expressou a respeito – foi o silêncio do Brasíl da Presidente Dilma no que tange às tropelias antidemocráticas do atual regime e da prisão, a la Miguelão, de próceres da oposição.  Tampouco mereceu sequer palavra a maneira com que foi tratada a recente Missão do Senado brasileiro.

         É de todo interesse que as vindouras eleições na Venezuela sejam tranquilas, limpas, sem violência, e que não haja planos de subverter-lhe o resultado por força de intimidação ou de gigantesco gerrymandering (manipulação de distritos eleitorais para favorecer uma das partes na liça), que no caso seria o Partido Chavista, dada a administração ruinosa de Nicolás Maduro, a decorrente situação de violência, pauperismo, inflação galopante, geral desabastecimento e a consequente (oh, surpresa!)  impopularidade do regime chavista). Até o presente,  o Brasil não tem seguido a sua habitual diplomacia de estado. Confiados os interesses no trato da questão aos assessores de partido (no caso, o Dr Henry Kissinger do PT, Marco Aurélio Garcia), e não ao Ministério das Relações Exteriores, o conhecido e experiente Itamaraty, as reações dos opositores na Venezuela tem sido de desconforto e desânimo. É de esperar-se que a atitude do governo do Brasil mude, voltando aos antigos e provados padrões, de diplomacia não entre partidos, mas sim entre Estados, dada a importância do caráter permanente de tais laços, que nada têm a ver com a natural mobilidade e transitoriedade das relações político-partidárias.

 

( Fonte:    O  Globo )




[1] Literalmente condição sem a qual não, i.e, condição sem a qual o acordo não é possível.

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