sexta-feira, 24 de julho de 2015

A Penalista Dra. Beatriz Catta Preta

                                
 
          A China, cuja civilização se estende por milhares de anos, tem como fundador de seu estado-universal Ts’in She Hwang-ti [1] em 221 a.C. Nesse contexto, o povo chinês tem uma expressão – ‘que nunca vivas em tempos interessantes!’ Ao contrário da visão atual, que associa o interessante ao agradável e motivante, para o chinês o dito se reporta a tempos difíceis, plenos de tensão e surpresas.

           A realidade brasileira atual guarda inegáveis traços similares à expressão chinesa. A crise do segundo governo Dilma Rousseff provocada por uma série de fatores, teve como detonantes o Petrolão  e o estelionato eleitoral.

           Aí, as mentiras da campanha vem à tona, e assistimos ao desfazimento do prestígio de Dilma, Lula e do PT. A queda na popularidade da presidenta, do estadista Lula e do Partido dos Trabalhadores é tão fulminante quanto desestabilizante.

           As consequências são o brutal enfraquecimento do neonato Dilma II, a súbita mudança no ambiente político e o surgimento de novas lideranças. Nesse contexto, irrompe  Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que arrebata a presidência da Câmara com 267 votos, derrotando o candidato de Dilma, Arlindo Chinaglia (PT-SP), com 136 votos. Não é simples tropeço, mas sinal de nova realidade.

           Com a Lava-Jato, vários mitos vão caindo pelo caminho. Um juiz novo, sério e competente começa a derrubá-los  e a prender figurões da Petrobras e das empreiteiras. Quem se julgava intocável experimenta novas angústias. O povo brasileiro, cansado da corrupção e sobretudo dos corruptos e de sua soberba os vê por terra, ou melhor, trancafiados no velho xilindró.

           Sofre a imagem do Brasil? É uma questão em aberto. Herdamos a fama, oriunda da Colônia e do pequeno Portugal, de um país ainda atrasado, de muitas leis cujo  cumprimento deixa a desejar, e de grandes contrastes, em que a pobreza e a miséria convivem com a riqueza e a opulência.

           A história nos ensina que quando Luis XVI convocou os Estados-Gerais, pensando resolver com um instrumento do Medievo os males de seu reino setecentista, desencadeou a Revolução Francesa, esse fanal da Humanidade. Não há revolução bem-comportada. Povos que a acolhem experimentam a fama, mas os efeitos da poção são imprevisíveis. Por isso, os ingleses que resolveram a tempo o escândalo dos burgos podres, posarão para os séculos com o lado bem-comportado da renovação. E os franceses com a glória do facho aceso da derrubada da Bastilha, junto com as cabeças decepadas dos suspeitos na ponta de lanças improvisadas, que assustaram o jovem François René, Visconde de Chateaubriand.

           A relevância do atual   momento revolucionário na política brasileira é porque ele ainda se realiza dentro da legalidade. O seu avanço é inegável, mas ele será sempre acompanhado com a ansiedade que visita os grandes eventos.

           A crise continua. Ela tem muitos cenários, mas para mim o principal está em Curitiba. Sinto sobrecenhos se erguerem. Como um simples juiz alcançará tal altura? Na existência, por vezes os signos são mais relevantes do que as hierarquias formais.

           E a homenagem é devida, porque o que é construído com o trabalho sério e a conjunção dos fatores da Lava-Jato – em que a autônoma Polícia Federal detem, com arrazoados do Ministério Público os suspeitos – e o juiz criminal confirma com a sua sentença, aplicável a cada caso.

           É importante que parta de Curitiba esta ação conjugada, eis que mostra a vitalidade e a amplitude do sistema brasileiro.

           Nesse conjunto de forças, os advogados estão bem presentes. Como bacharel, nunca tive oportunidade de trabalhar no foro. Mas estudei direito e completei o curso no prédio histórico da Moncorvo Filho, na antiga Faculdade Nacional de Direito (naquele tempo, o Rio de Janeiro era a capital federal). Se a diplomacia foi o caminho que escolhi, tal não significa que não tenha assistido a aulas de Hermes Lima, Hahneman Guimarães, Oscar Stevenson, Pedro Calmon e tantos outros.

          A ainda jovem criminalista Beatriz Catta Preta se notabilizou por fechar nove das dezessete delações premiadas da Operação Lava-Jato. A delação premiada é uma das chaves do sucesso dessa operação contra a corrupção. Ela torna possível as prisões dos principais responsáveis, como a chave ou a combinação de um cofre. Sem ela, os investigadores lutariam com grandes dificuldades. A Presidente Dilma vituperou contra o delator, como se fora um Silvério dos Reis, mas na verdade o acordo entre a justiça e o informante premia, entre outras vantagens, o delator com redução de pena. Não tem nada a ver com traição de pátria ou vá lá o que seja.

           Na segunda dia 20 de julho, a criminalista comunicou ao juiz Sérgio Moro que deixara as defesas do ex-gerente da Petrobrás Pedro Barusco e do ex-executivo da Toyo Setal  Augusto de Mendonça.

           Ela já informou a seus clientes que eles têm até  o dia trinta de julho para constituir novo defensor.

           Segundo informa a Folha de S. Paulo, “a advogada abandonou a Lava Jato duas semanas depois que um de seus clientes, o lobista Júlio Camargo, mudou sua versão e admitiu ter pago US$ 5 milhões em propina ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.  O deputado nega ligação com o escândalo.

           Ainda segundo a reportagem da Folha, “desde então, Catta Preta passou a sofrer pressão de aliados de Cunha.  Integrante da CPI da Petrobrás, o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ) apresentou dois requerimentos relativos à advogada. Em um deles, obteve a convocação dela para explicar a origem do dinheiro que recebeu a título de honorários pagos por réus da Lava Jato. No outro, dirigido a uma juíza federal do Paraná, exigiu a lista de todos os clientes  de Catta Preta.

           “No mesmo dia oito de julho, Pansera também apresentou outros requerimentos para convocar o filho de Julio Camargo e para quebrar sigilos de parentes do doleiro Alberto Youssef – outro delator que citou Cunha como destinatário de suborno. A manobra do congressista revoltou o doleiro, que chamou Pansera de ‘pau mandado’ do presidente da Câmara.

           “Quando os requerimentos de Pansera foram apresentados, já corria a informação de que Cunha seria incluído na delação de Julio Camargo

            “Catta Preta também se desligou da defesa de clientes que não estão envolvidos na Operação Lava Jato.

            “ Assistido pela advogada há dez anos, o corretor de valores Lúcio Funaro livrou-se da condenação no processo do Mensalão depois de se tornar delator pelas mãos  da criminalista. “Tem muitos advogados reclamando (de Catta Preta), mas os clientes de quase todos estão presos e os dela estão soltos”, disse Funaro à Folha.

             “Funaro é apontado como pessoa próxima ao agora delatado na Lava Jato, Eduardo Cunha.”

            “Procurado para falar dos requerimentos  de seu aliado visando Catta Preta, o presidente da Câmara dos Deputados respondeu rispidamente: “Meu nome é Eduardo Cunha e não Celso Pansera, pergunte a ele.”

             “ O deputado Pansera negou ter pressionado Catta Preta e os familiares dos delatores  a mando de Cunha. Segundo ele, houve ‘coincidência’ da data de apresentação dos requerimentos com o crescimento dos rumores de que Cunha seria delatado.”

             Por fim, na reportagem da Folha, que achei oportuno transcrever, se diz que “pessoas próximas à advogada afirmam que ela estaria de mudança para Miami (EUA), onde abriu um escritório em 2014.

             Essa mudança repentina terá sido sopesada pela profissional, que deixa uma banca em que a sua competência advocatícia se assinala por relevantes êxitos profissionais.

             É de augurar-se que a Dra.Catta Preta tenha condições de retornar à sua terra em breve prazo. Se o seu afastamento diz muito do período que ora se atravessa, façamos votos sinceros para que a boa filha retorne breve à casa materna.

 

( Fontes: A Study of History, Arnold Toynbee; Folha de S. Paulo )   



[1] A transcrição do nome do Imperador chinês segue a ortografia de Arnold Toynbee

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