segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Da Liberdade ou de Mudanças burocráticas em Hong Kong ?


                        
         A crise das demonstrações pró-democracia ou em prol da presença da democracia em Hong Kong, ou dos gritos pró-democracia já ultrapassou o marco dos seis meses.  Na verdade, ao apresentá-las de forma tão sucinta, elas não só reivindicam a relevância da democracia, mas também defendem o seu modo de expressão, e por isso, sem embargo das respectivas diversas caracterizações, a sua essência está na liberdade, nessa alternativa propugnada por essa ilha democrática, em meio ao mar da repressão da República Popular da China, que de repente surgira com a proposta veiculada por Carrie Lam, a então nova regente, trazendo para essa antiga colônia inglesa - e que, portanto, se abeberara na Common Law ou no bill of Rights, que um regime colonial lograra transmitir a uma de suas muitas colônias na Ásia.  Na defesa desse contrassenso - a colônia, a imagem da repressão, que passa a ser portadora de formas de liberdade, ainda que a forma de governo se revista de uma aparente defesa da repressão: o estrangeiro, que pela força das armas, se apodera, com objetivos comerciais, de localidades antes governadas por autoridades autóctones...

               Democracia como a capacidade e o direito de ser julgado na própria terra será decerto uma visão fragmentária da autoridade da democracia, que reside essencialmente na confiança em governo de julgamento humano e, por conseguinte, justo.

           Hong Kong, na essência, se recusa a ser governado por reizinhos, que se baseiam em princípios e normas estrangeiras, como a da repressão enquanto forma de administração, o que se pode traduzir no verticalismo das formas de governação, que confunde eficiência na capacidade de infligir medo (seja moderado, seja forte), de acordo com a suposta gravidade da infração pela autoridade.
   
            Essa pequena, grande revolução do Povo e de sobretudo os jovens em Hong Kong representa a reivindicação da humanidade na aplicação das penas aos delitos, mormente àqueles políticos.   Por isso, a energia no traço em defender o direito de cada habitante de Hong Kong em ser julgado no próprio território, como refletiu a revolução contra a extradição da gente dessa antiga colônia - que teve a fortuna de abeberar-se na Common Law inglesa - para a impessoalidade antidemocrática de um julgamento em terra estranha, continental, regida por normas repressivas, como seria o caso de que a alta-funcionária do regime ditatorial continental acenasse com o destino - realmente colonial no caso - de um natural vir a ser julgado pelos tribunais da China Continental.

                       A expectativa reina na antiga colônia inglesa.  Não é que o Ministério de Recursos  Humanos e Seguridade Social da RPC informou a quatro de janeiro corrente que Wang Zhimin, que ocupara o cargo de principal autoridade política de Beijing no território desde 2017, será substituído  por Luo Huining, que até novembro último era o principal funcionário do governo comunista na província de Shanxi, ao norte da China?
                  
                      Hong Kong, com a sua luta, ainda que de forma incipiente, em defesa da  democracia, e o próprio exercício como norma de convivência,  poderá constituir válido exemplo da aplicação dessa modalidade de governo no antigo Império do Meio. Essa velha fórmula, inventada pela civilização helênica, continua a ser assaz temida no campo adverso por ser a antítese da antiga repressão, e do consequente desafio colocado pela liberdade a essa  antítese sua, que é o regime autoritário, com suas várias formas e fantasias, todas elas capengas, pelo ínsito temor que trazem consigo, ao simbolizarem a força cega e a consequente possibilidade que ela venha a ser aplicada àqueles que julgam poder viver sob a sua intrínseca e inquietante falta de princípios...  

( Fonte: O Estado de S. Paulo )



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