Tudo fica mais claro
depois de uma eleição. Sobretudo esta última no Reino Unido. Líderes não surgem
da noite para o dia. Para os fracos, a fortuna costuma ser má conselheira. Qual
nave em denso nevoeiro, se na torre de comando está pessoa de pouca
experiência, ou - o que é pior - animada por estranhas convicções, que mais se
baseiam na própria estreiteza de vistas, o provável resultado da briosa
mediocridade, será o previsível malogro, que visita os líderes pequenos que,
incensados pelos áulicos, se crêem grandes.
Precipitada nas decisões, pensando
afirmar-se com ousados projetos, que confundem a convicção do jogador com a do
político tarimbado pela longa experiência e a lição dos próprios maiores, Theresa
May terá confundido as fáceis, ilusórias palavras dos próprios cortesãos
com o risco enganoso de promessas a poucos destinadas.
Julgaste acaso sábio fazer economia com
pesados cortes na segurança, logo em teu país, que dormiu por demasiado tempo
sem o necessário controle de tuas fronteiras? É o bom senso que deve presidir
em tuas cancelas, e não a atual cruel mesquinharia dos senhores dos portões na
Europa central.
A sorte costuma retirar com a mão
esquerda o que concede com a direita. Ao assumir a liderança, que exemplo
tinhas a imitar? A mediocridade é terreno sáfaro, e se a sorte não terá sido
madrasta para quem te abriu os domínios do poder, não terás levado na devida
conta que poderia ser um presente de grego. O trágico no líder está em pensar
que um grande desafio será sua própria
medida.
A ignorância que é o elixir das
malogradas ousadias, somente agora principia a desenhar-se diante de ti. A
solidão costuma ser companheira do poder, enquanto a voz dos áulicos ela é doce
enquanto dura. Nada mais imediato e determinante para que a verdade afinal
surja, sem os atavios da noite, do que a brutalidade dos fatos, e à sua volta
cresce o silêncio do malogro, ou a zoeira confusa das tentativas desesperadas,
de ressuscitar a esperança, a que alimenta o bom senso e a prudência.
A voz dos cortesãos sói prometer
mágicas proezas, mas nada como o dia seguinte, em que tudo fica mais nítido e
claro, desafortunadamente porém, o relógio do tempo já avançou, e a tua força de
ontem, e a algaravia dos áulicos, a um tempo cessa e se cala.
Costuma ser breve e mesmo fugaz a
atitude daqueles a quem faltaram seja o exemplo de seus maiores - nesses dias
só encontráveis na leitura dos livros e dos cartapácios - seja a elementar
prudência de quem teme as dádivas da deusa Fortuna, eis que podem ser ilusórias
como nesgas de céu azul que mal dissimulam a tempestade.
Ao ignorar ou esquecer - o que é
ainda pior - o exemplo de seus maiores, o líder fraco torna fraca a sua gente,
como diz o grande poeta do pequeno Portugal.
A boa Sorte é um destino caprichoso,
que apenas se entrevê em raras vezes.
Para Theresa May chegou a hora da
verdade. O seu passado recente, e a hübris
que a acometeu, talvez a longa noitada dos votos e dos êxitos que não se
confirmam, lhe terá trazido a oportunidade de reinventar-se e de adaptar-se à
realidade.
A medida agora é outra. Esta festa
acabou, mas aquela que temias, ressurge com força. Se olhares à volta, verás
que não tens outra pessoa a enfrentar do que a ti mesmo. Se caíres na real,
poderás acalentar a esperança. Senão terás a mesma sorte dos demagogos deste e
de verões passados, como o Ukip e
fantasmas similares.
Boa sorte.
(
Fontes: Carlos Drummond de Andrade, Luíz de Camões, Vinicius de Moraes , Winston Churchill)
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