Os
leitores do blog conhecem a minha
posição sobre o assunto. Aliás, nesses tempos de predomínio de maiorias
republicanas no Supremo, até a cobertura
pela imprensa - e no caso me reporto ao New
York Times - adota postura tão compreensiva
para o chamado gerrymander que alguém
alheio à matéria poderia até pensar que estamos diante de modalidade
normalmente praticada pelos diferentes estados,
iniciada, como se sabe, pelo governador Gerry, no estado de Massachusetts,
em 1812.
Só
que há um pequeno detalhe nessa edulcorada estória. O gerrymander é prática
ilegal, pois o seu propósito é o de fazer redistribuição nos distritos
eleitorais, de forma em que um dos partidos maximize a própria vantagem, e o partido
adverso desperdice grande parte da respectiva votação. Admitir o gerrymander - como vem sendo feito desde
muito para a Câmara de Representantes - e agora, como acaba de ser realizado
para o estado de Wisconsin - é tolerar um método irregular de formação de distritos
eleitorais que distorce o sentido do voto, dando um peso indevido a um dos
partidos em detrimento do outro.
Não
se trata, por conseguinte, de que o Supremo através de seus membros, favoreça
esta ou aquela postura, como se ambas pudessem ser atribuídas a posições ou
conservadoras, ou liberais, e, portanto, dentro de parâmetros legais de
expressão do sufrágio.
Há
uma confusão proposital aí, como se o gerrymander
fosse um instrumento legal e admissível, em que se respeita a vontade do
eleitor. O caráter delituoso do gerrymander está justamente na
circunstância de que não é um instrumento admissível na eleição, essencialmente
por contrariar a vontade do eleitor. Fá-lo de certo de forma hipócrita, pois
quem o estrutura, pode até cinicamente alegar que não está proibindo a ninguém
de manifestar a sua vontade política. Há um detalhe, porém, nesse método:
ele redesenha os distritos de forma a maximizar a votação a um partido, de forma
a produzir menos representantes para o outro partido, enquanto a agremiação
oposta vê maximizado o número de distritos
que congreguem eleitores do outro candidato ou partido. Em outras palavras, o
gerrymander frauda a vontade do eleitor, por um desenho ardiloso dos distritos.
Em
outras palavras, a boa fé é essencial para a construção de um mapa político que
reflita a vontade da Nação e dos Estados que a formam.
A
postura de alguns que dizem não querer entrar em assuntos políticos, e por isso
se recusam a desautorizar um mapa sob o argumento de conceder vantagem injusta
a um partido em detrimento de outro me
parece farisaica, e sem qualquer lógica.
Como
acaso imaginar-se possa que o gerrymander - que deturpa o resultado da eleição - e
cujo poder negativo e ilegal será tanto maior quanto o número dos distritos
corrompidos - não é uma influência negativa?
Como é possível, por conseguinte, que o
sentido de uma Constituição possa admitir o próprio convívio como a fraude?
Dessarte, a má-fé dos que defendem esse crime eleitoral é tal que admite uma
conveniente cegueira quanto à alegada circunstância de que se trata de matéria política. Nesses termos, debater uma tal matéria
equivaleria a compactuar com a fraude e o crime eleitoral ?
A liberdade de opinião não pactua com aqueles que cinicamente tentam
falsificar a vontade de um Estado, de uma Região, ou até mesmo de um País.
( Fontes: The New York Review of Books, The New York Times )
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