Em oportuna entrevista o Ministro Luis
Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, antecipa ao Estadão
os planos do TSE, que prevêem o adiamento do pleito e novas regras de votação.
*
Ministro, já é hora de se decidir sobre se a votação das eleições municipais
deve ocorrer em outubro ?
Acho que está chegando
a hora de se ter uma decisão. Eu me
reuni por videoconferência com médicos de diferentes especialidades altamente
respeitados nas suas áreas. A percepção é que possivelmente em setembro a curva
da Covid-19 já estaria decrescendo. Como a gente precia precisa programar isso
com alguma antecedência, sugerimos adiar por algumas semanas. Mas a decisão é
do Congresso. A sugestão do TSE é uma janela que vai de 15 de novembro até 20 de
dezembro. Seria o limite para o 2° turno, para que possamos dar posse até o dia
1º de janeiro.
* Haverá novas regras de votação em função da pandemia
?
A idéia de estender o
horário é muito provável que seja encampada, fazermos possivelmente de 8hs às
20hs. Com isso, ganharíamos três horas de votação. Recomendarmos, darmos
preferência a faixas etárias por horário para evitar aglomeração, também é uma
ideia está colocada. Possivelmente as
pessoas mais idosas votariam na primeira hora da manhã. Já as eleições em dois
dias têm dois problemas. O primeiro é que encarece muito, cerca de R$ 180
milhões extras. O segundo é a segurança das urnas durante a noite.
* E os cuidados com a saúde ?
Estamos ouvindo
especialistas para preparar uma cartilha com o passo a passo das eleições.
Coisas básicas como não levar a mão à boca, aos olhos. O eleitor vai ter que
votar e, em seguida à votação, ter um servidor de luva que dará um jato de alcool para limpar a mão. O álcool
gel tem que ser depois do voto, porque senão estraga a urna e a biometria.
* Como o TSE planeja combater fake news nessas eleições ?
O protagonista no combate às fake news não pode ser da Justiça
Eleitoral. Queremos controlar as fake
news menos pelo conteúdo e mais pelos mecanismos de difusão. Vamos
conversar individualmente com cada plataforma. Eu já fiz uma conversa
preliminar com o WhatsApp - que do
ponto de vista eleitoral talvez seja o de maior repercussão - pensando em como
monitorar e neutralizar robôs e comportamentos inusuais de retransmissão e
reenvio de mensagens. O segundo protagonista vai ser a imprensa profissional,
que é a que se move por príncipios éticos e sabe separar fato de opinião. Em
terceiro lugar, o TSE vai fazer uma campanha de esclarecimento à população.
*
O Senhor ou o TSE têm uma definição de fake
news?
Bom, a resposta é sim e
não. Em teoria, sim. Quer dizer, campanha de desinformação é a divulgação
deliberada de informação sabidamente falsa.
Esta é a definição. Fake news é um apelido. Eu posso
definir para você o que é uma campanha de ódio: é você fazer ataques
preconceituosos, discriminatórios ou racistas a grupos vulneráveis da
sociedade. Definir em teoria é fácil. Nos casos concretos, é menos fácil.
*
O Senhor sofre campanha de ódio ?
Eu, pessoalmente, não
sofro. Não que não possa ser vítima de
ódio, mas não é o que eu tenho no meu radar pessoal. Acho que a crítica ao
Tribunal é legítima. Quem quer que se disponha a se aventurar no espaço público
tem que se preparar para conviver com a crítica. Mas o poder que o Supremo
exerce não é um poder em nome próprio. Ninguém, em uma democracia, exerce poder
em nome próprio; todo mundo exerce poder em nome do interesse da Sociedade. O
que me parece que se tornou perigoso e precisa ser enfrentado são as campanhas
maciças, baseadas em falsidade e financiadas
por grupos radicais para destruição das instituições.
* É o que vivemos hoje ?
Eu acho que há guetos
pré-iluministas que fazem esse tipo de campanha de ódio contra o Supremo, massificadas de falsidade,
destruição, ataque, ameaças. Não acho
que elas tenham chegado ao 'mainstream'. E
isso é crime. Ameaçar um Juiz e a família dele é coisa de bandido, não é coisa
de militante.
*
A Justiça tem sido muito acionada nessa
pandemia. Por quê?
O ideal seria a
pandemia ser combatida sob uma liderança nacional em aliança com Estados e
Municípios, respeitadas as peculiaridades locais com um mínimo de interferência
judicial. Na medida em que essa liderança e coordenação nacionais não
ocorreram, você passou a ter muitas visões particulares desse problema. Num País
em que tudo se judicializa, você começa a ter a interferência do Judiciário.
*
Em tese, o Senhor é a favor do compartilhamento de informações entre tribunais
superiores?
É pacífico na
jurisprudência do Supremo que é possível compartilhar informações entre
processos diferentes. Em tese, a resposta é Sim.
*
O Senhor diz haver um "terraplanismo constitucional" em relação ao
artigo
142. O que significa ?
A Constituição é
suficientemente clara no sentido de que as Forças Armadas não desempenham
nenhum papel moderador, muito menos um papel hegemônico na Democracia. O que eu
disse na minha decisão é que a Forças Armadas nesses 32 anos de democracia
tiveram um comportamento exemplar de profissionalismo, patriotismo e
institucionalidade e que ninguém deseja, nem elas próprias, que elas sejam
arremessadas no varejo da política. Quem pede intervenção militar é o mesmo
gueto pré-iluminista que defende o fechamento do Congresso e o fechamento do
Supremo. Eu considero ofensivo às Forças Armadas quererem associá-las à quebra
da institucionalidade, à interferência política ou golpe.
*
Mas o general Ramos disse à VEJA que não
se pode 'esticar a corda' e ainda disse que o julgamento da chapa
Bolsonaro-Mourão pelo TSE é 'casuístico'...
Eu não li a entrevista
e não sou comentarista da opinião de ninguém. O que eu posso dizer é que os
limites da democracia estão traçados na Constituição. Quanto ao julgamento, o
TSE não é um ator político, mas institucional. Nem os adversários, nem os
apoiadores do presidente devem esperar qualquer coisa que não seja um
julgamento puramente técnico, com base nas provas.
(
Transcrito do Estado de S. Paulo )
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