sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Delação de Cabral - Análise de O Globo (Chico Otávio)




         È de notar-se, porém, que a badalada delação do ex-governador Sérgio Cabral acima referida nunca chegou a convencer a força-tarefa da Lava Jato. Para os Procuradores da República as supostas revelações espontâneas de Cabral na verdade eram seletivas, pois escondiam dados essenciais  a respeito da dinâmica de sua organização criminosa, e pelo conotavam tinham como único escopo tumultuar o processo legal e abrir caminho para a saída da prisão após três anos.
         Nesse contexto, o acordo de delação com a P.F. aumentaria as suspeitas da força-tarefa. Dessarte, para os Procuradores da República que tiveram acesso ao citado conteúdo, na verdade as supostas revelações acrescentam muito pouco ao que já é do conhecimento, além de não apresentarem provas de corroboração e omitirem fatos como a participação da ex-primeira dama Adriana Ancelmo na organização. Para tornar a fonte da informação menos segura, a força-tarefa se surpreendeu ao tomar ciência que esse acordo foi firmado com delegados federais de Brasília, que nunca tiveram participação nas investigações sobre o esquema Cabral.
           Sem embargo, os doleiros Vinicius Claret, o Juca Bala, e Cláudio Barboza, o Tony, personagens centrais da investigação por terem ajudado Cabral a esconder US$ 100 milhões no Uruguai, por exemplo, não foram sequer procurados  pelos delegados do acordo.
            Desde que a força-tarefa foi montada no Rio, no primeiro semestre de 2016, nunca houve efetivo entrosamento entre o MPF e a P.F., no que tange às investigações. A rigor, praticamente toda a apuração foi conduzida pelos procuradores da Republica, cabendo aos delegados e agentes federais a execução de medidas cautelares de prisão e de busca e apreensão. Como o acordo revelado ontem, a dis- tância entre os dois órgãos tende a ampliar-se.
             Integrantes da Força-tarefa do MPF pretendem empenhar-se  pessoalmente no convencimento do ministro Edson Fachin, relator do caso no STF a não homologar a delação. Para tanto, já contam com o apoio  do PGR Augusto Aras, que se convenceu de que a delação é nula. Para isso, os procuradores da República elencaram  lista de perguntas que, ao longo dos três anos da prisão de Cabral, ficaram até hoje sem resposta.
              A par disso, a força-tarefa alertou ainda que mesmo as informações provenientes da confissão voluntária do ex-governador foram recebidas com reserva e, por isso, são pouco usadas nos desdobramentos das investigações.  A razão por trás dessa cautela está no temor que as confissões do ex-governador maculem os inquéritos. A par disso, a força-tarefa lembrou a Augusto Aras que Cabral nunca devolveu os valores desviados.
              Assim como o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, a delação de Cabral esbarra na idéia cristalizada no MPF de que não é negócio trocar o certo pelo duvidoso.  Na visão dos procuradores, a prisão de ambos representa um triunfo na luta contra a impunidade. Mesmo não sendo homologado pelo ministro Fachin, o acordo negociado significa agora um risco à estratégia. Os procuradores temem que o Judiciário passe a enxergar Sérgio Cabral como uma espécie de réu-colaborador, cessando assim, em tese, as razões da prisão preventiva.

( Fonte:  O Globo )



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