sexta-feira, 24 de abril de 2015

Vendendo o Futuro

                          

        A fórmula poderia ser mais ampla, dadas as óbvias implicações da tragédia da Petrobrás não só com as suas perspectivas no futuro próximo, mas também com o passado digamos recente que está por detrás de o que ocorreu com a maior empresa nacional.

        Aldemir Bendine, que é o novo presidente da Petróleo Brasileiro S.A., “vem a público pedir desculpas pelo que aconteceu na Petrobrás nos últimos anos – ele, que chegou à presidência da estatal há pouco tempo e nada tem a ver com o que se passou,(...), o que dizer de Dilma ou Lula, responsáveis diretos pelo descalabro de corrupção e má gestão, uma consequência da outra, que dominou a empresa nos últimos doze anos?”

         A pergunta de colunista de O Globo não é só decerto retórica, pois muita coisa carece de ser determinada. Por enquanto, a eventual responsabilidade no escândalo da dupla e notadamente de sua maior figura vem sendo tratada de modo facecioso e brilhante pelo cartunista Chico Caruso. A comicidade, sobretudo porque tangencial, é uma forma de versar questões espinhosas. Nesse sentido, a sátira – representada pelos bobos da Corte – foi a fórmula primeva de levantar, nas cortes de antanho, tópicos de interesse geral da sociedade, e que concerniam à figura do Rei.  

          Para acentuar o caráter divino dos imperadores chineses, eles despachavam com os representantes da corte através de um biombo, que lhes assegurava a invisibilidade, e o caráter impessoal das respectivas determinações. A Imperatriz Viúva Cixi (1835-1908) que reinou durante décadas e que trouxe a democracia para a China, se valeu desse costume até aboli-lo na prática no período final de seu reinado. Pelo que fez, e pelo que enfrentou, é uma figura até hoje pouco conhecida. Diante do temor que os atuais gerarcas chineses tem diante da democracia, a ponto de mandarem para masmorra interiorana  o autor de moderada proposta de abertura, Liu Xiaobo,  que se tornaria o Prêmio Nobel da Paz de 2010 O povo chinês, por enquanto, o conhecerá de forma nebulosa (e como ameaça à estabilidade governamental) pois ousara trazer o ideal da democracia para o Império do Meio.

           Mas deixemos, para a pasta do Futuro, esses acertos que pairam no horizonte. O senhor Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e indicação de dona Dilma, quer de certo modo empenhar o futuro para resgatar o presente da ainda maior empresa nacional. Admite-se, por isso, vender até fatias do pré-sal.

           Em entrevista para Miriam Leitão, o presidente Bendine admitiu: “No primeiro trimestre, sim, o impacto do dólar elevará a dívida. A alavancagem deve subir para 5. Para o ano, deve estabilizar, num cenário de dólar a R$ 3,30.”

           Nesse quadro,  uma relação entre a dívida e a capacidade de geração de caixa em 5 anos é mais do que os atuais 4,7 e o dobro do que é considerado normal, que é 2.5, como assinala a cronista.. Mesmo assim, segundo afirmou Bendine, a empresa continua sendo  financiável. Refere  ter recebido várias propostas de linhas de crédito, e fechou com aquelas que não tinham custo superior ao dos bonds (do Tesouro Americano).        

            Na sua entrevista, o novo presidente da Petrobrás pintou com cores róseas a exploração e explotação do pré-sal. Declarou que 80% dos investimentos serão em exploração e produção, a maior parte no pré-sal (minha a ênfase), que afirma ser extremamente atrativo.

            Ele explica a estratégia: “não vamos abrir um campo atrás do outro, os campos que já perfuramos serão explorados. Quanto maior a escala, mais o custo diminui. Há interesse internacional no pré-sal, tanto que a Shell comprou a BG atrás desses ativos. Mesmo com a queda do Brent, a exploração do pré-sal continua atrativa e nós temos uma belíssima reserva.”

             Bendine  não vai desvalorizar os respectivos ativos. Nesse contexto, surge a notícia – cabeçalho do Globo de hoje – que a Petrobrás admite até vender fatias do pré-sal (a empresa diz que pretende ‘compartilhar riscos’ para gerar caixa rapidamente).

             Não se há de esperar que na situação em que a Petrobrás foi deixada pelo irresponsável Petrolão petista, que Bendine não vá pintar com tintas róseas o pré-sal já descoberto. De um lado, porém, a sua explotação, em termos de rentabilidade, depende do valor atual do Brent, que se continuar caindo pode tornar antieconômica a explotação do pré-sal.

             Por outro lado, menciona-se na imprensa que a Petrobrás pode ir até à alienação de fatias do pré-sal para fazer caixa. Aí mora o perigo, pois entramos na faixa perigosa de alienar para o futuro parte do patrimônio da Nação. Nesse contexto, se estaria alienando o futuro ou parte dele, para pôr nos eixos a Petróleo Brasileiro S.A., descarrilada pelo Petrolão.

              Se o prejuízo semelha descomunal, deveria encontrar-se meios de responsabilizar todos os culpados por esse magnicídio. E tal se deveria à impressão que subsiste de que neste magno escândalo muitos ainda não foram indiciados, ou sequer chamados.

 

( Fontes: A Imperatriz de Ferro, de Jung Chang, Cia. das Letras, 2013; Colunas de Miriam Leitão e Merval Pereira; O Globo )

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