quarta-feira, 29 de abril de 2015

Terminou a Lava-Jato ?

                                          

         Terá durado mais do que o previsto a operação Lava-Jato, assinalada pelo Juiz Sérgio Moro, que mantinha até ontem os nove executivos – muitos chefes de poderosas empreiteiras – na prisão, sem firulas, de Curitiba?

         Até o dia 28 de abril, todos os mandados em prol da libertação dos corruptores haviam sendo denegados, mantendo, por conseguinte, a pressão sobre os acusados em confessarem alianças e pactos com os grandes e pequenos corruptos, que não seriam decerto revelados se o incômodo cativeiro fosse levantado.

         O jovem juiz Moro, com firmeza, continuara o seu trabalho, que é a sequência das investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, a quem vão os louros de ter encetado essa operação pioneira. O único percalço até a infausta jornada de ontem havia sido a liberação do ex-diretor da Petrobrás, Renato Duque, representante do Partido dos Trabalhadores na nossa assaltada maior empresa, através de liminar concedendo a esse senhor a liberdade provisória. Pela pressão da sociedade, o Ministro Teori Zavascki voltaria atrás, rescindindo a própria liminar.

         Os empreiteiros beneficiados pela liminar da 2ª Câmara do Supremo Tribunal Federal foram: Ricardo Pessoa, presidente da UTC e havido como o chefe do ‘Clube das empreiteiras’, José Aldemário Pinheiro Filho, presidente da OAS, que é também conhecido como Léo Pinheiro, José Ricardo Auler (Presidente do Conselho de Administração da Camargo Corrêa, Agenor Franklin Medeiros (Diretor da OAS), havido como um dos principais responsáveis do esquema dentro da OAS), Sergio Mendes (Vice-Presidente da Mendes Júnior), Gerson de Mello Almada (Vice-Presidente da Engevix), Mateus Coutinho de Sá (Diretor financeiro da OAS), Erton Medeiros Fonseca (Executivo da Galvão Engenharia) e José Ricardo Breghirolli (funcionário da OAS e acusado representante da empreiteira junto ao doleiro Alberto Youssef).

           Embora o STF tenha imposto uma série de condições aos réus – deverão ficar sempre dentro de casa (a dita prisão domiciliar), não poderão manter contato com outros investigados, ficarão proibidos de deixar o país (é mister entregar o passaporte à Justiça), usarão tornozeleira eletrônica, não poderão exercer atividades empresariais, precisarão comparecer quinzenalmente em juízo e não podem mudar de endereço sem apresentar justificativa à Justiça – há uma mudança substancial no processo de justiça.

           Essa aparente pletora de severas restrições não impediu que, no estacionamento da PF em Curitiba, Carla Domênico, uma das advogadas do presidente da UTC, não contivesse a sua alegria ao receber a notícia. Abraçou de forma efusiva colega que a acompanhava em visita ao empreiteiro Pessoa (dito chefe do ‘clube das empreiteiras’), que foi quem financiara a reforma de sítio no interior de São Paulo, atendendo a pedido do ex-presidente Lula da Silva.

           É lamentável que a decisão de ontem da 2ª Turma do STF venha derrubar a prisão preventiva de dois empreiteiros que davam a impressão de aceitar fazer a chamada delação premiada, que, como assinala Merval Pereira em sua coluna, “cada qual com histórias que ligam a presidente Dilma e o ex-presidente Lula aos desmandos ocorridos na Petrobrás”.

               São no mínimo interessantes as anotações de Ricardo Pessoa, da UTC (o chefe do chamado Clube das Empreiteiras, a que a revista VEJA teve acesso: “Edinho Silva está preocupadíssimo. Todas as empreiteiras acusadas de esquema criminoso da Operação Lava-Jato doaram para a campanha de Dilma. Será que falarão sobre vinculação campanha x obras da Petrobrás ?”, escreveu  Pessoa em um bloco na prisão.

               Por outro lado, o dito ‘Léo Pinheiro’, também liberado ontem pela 2ª Turma do Supremo, presidida por Teori Zavascki, ‘preparava-se para contar seu relacionamento com o ex-Presidente Lula, inclusive a reforma milionária de propriedade em Atibaia que todos conhecem como “a casa do Lula”, mas que está em nome de terceiros, por coincidência  sócios de seu filho Lulinha – que também mora em apartamento em São Paulo de R$ 6 milhões, que igualmente está registrado em nome de um desses sócios” (ou serão laranjas?).

               Incidentalmente, a senhora fortuna de Lulinha seria motivo de espanto, tal a gama de interesses acionários do empresário e filho do ex-presidente.

               Malgrado as queixas de que a prisão preventiva durava por tempo demasiado não se sustentam, se tivermos presente o parecer do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, assim como os votos (infelizmente minoritários) dos Ministros Carmen Lúcia e Celso de Mello, que mostram que existiam na verdade condições jurídicas para manter a prisão preventiva que, de resto,  já havia sido referendada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).  A fortiori, a decisão dos ministros do STF (por 3x2) de mandar para prisão domiciliar os acusados, com tornozeleira eletrônica e horário rígido de recolhimento, demonstra que os empreiteiros – mesmo para os três juízes que votaram a favor do recolhimento – continuam oferecendo perigo à sociedade.

              Salvaguardas à parte, é mister não esquecer que estamos no Brasil, e muita vez essas tornozeleiras ou são ignoradas, ou não funcionam, o que tende a dificultar o seu acompanhamento pelos órgãos competentes.

              Os votos dos dois Ministros que dissentiram sublinham não só a pertinência de manter a injunção prevalente, assim como a sua oportunidade.  O decano do Supremo, Celso de Mello afirmou: “Torna-se inviável a conversão da prisão preventiva em medidas cautelares alternativas quando a privação cautelar da liberdade individual tem fundamento, como sucede na espécie,  na periculosidade do réu em face da probabilidade real e efetiva de continuidade da prática de delitos gravíssimos, como os de organização criminosa, de corrupção ativa e de lavagem de valores e de capitais”, reportando-se no caso ao presidente da UTC.

              Também é cristalino e incisivo nos seus argumentos o voto da Ministra Carmen Lúcia que foi contra a concessão de habeas corpus, avaliando que o interrogatório do empreiteiro, marcado para 2ª Feira, pode levar à necessidade de novas diligências, e testemunhas podem ser novamente inquiridas.  Não existe instrução quase acabada”, afirmou ela. ‘Em casa, consoante aduziu a Ministra, Pessoa pode seguir  em contato com os negócios da empresa.  Nesse sentido, Carmen Lúcia sublinhou  que o decreto de prisão preventiva foi baseado em provas da prática de crimes de alta gravidade contra a Administração Pública e de lavagem de dinheiro. Continuando na sua aula prática – que infelizmente não foi ouvida pela maioria dos ministros – lembrou a Ministra que embora as investigações já estejam próximas do fim, ainda não terminaram (meu o grifo). Faltam os depoimentos do próprio réu e de testemunhas de defesa. Outrossim, a Ministra também lembrou que o  juiz pode ouvir  testemunhas de acusação antes de concluir a instrução.  Para ela, o risco de libertar Pessoa seria ele tentar cooptar essas testemunhas.

              Ironicamente, se encontram no voto do Ministro Gilmar Mendes motivos cogentes para determinar a negação de provisão de liberdade provisória aos réus.  Referiu-se nesse contexto à Operação Lava-Jato ao “maior  escândalo de corrupção no país”, e comparou o caso ao Mensalão (Ação Penal 470). Em tal contexto, lembrou o Ministro que enquanto o STF julgava o processo do Mensalão, em 2012, ocorriam os desvios na Petrobrás.  Não obstante o quanto precede, Gilmar Mendes votou pela libertação de Ricardo Pessoa.  A propósito, que as investigações já estão em fase final e, por isso, não haveria risco (sic) de o réu atrapalhar a coleta de provas.

               O voto de Gilmar Mendes – que foi vertido em verdadeiro discurso – e há nele, SMJ, argumentos pró e contra a concessão da liminar.  Com efeito, Gilmar Mendes comparou os desvios da Petrobrás  com o Mensalão, concluindo que o escândalo atual foi uma continuação do primeiro. Sem embargo desta argumentação, o ministro ponderou que a prisão de Pessoa foi mantida por tempo excessivo sem julgamento.

               E concluiu: “O Supremo não tem aceito o clamor público como justificativa da prisão preventiva. Isso tornaria o STF refém de reações da sociedade.  A garantia da ordem pública não justifica a prisão.”

              Será mesmo que, por questão de um punhado de dias, devamos colocar em risco toda a instrução de processo, levada a cabo, com proficiência, correção e coragem pelo Juiz Sérgio Moro?

 

( Fontes:   O  Globo, Merval Pereira, revista VEJA )

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