Terá durado mais do que o previsto
a operação Lava-Jato, assinalada pelo
Juiz
Sérgio Moro, que mantinha até ontem os nove executivos – muitos chefes
de poderosas empreiteiras – na prisão, sem firulas, de Curitiba?
Até o dia 28 de
abril, todos os mandados em prol da libertação dos corruptores haviam
sendo denegados, mantendo, por conseguinte, a pressão sobre os acusados em
confessarem alianças e pactos com os grandes e pequenos corruptos, que não
seriam decerto revelados se o incômodo cativeiro fosse levantado.
O jovem
juiz Moro, com firmeza, continuara o seu trabalho, que é a sequência
das investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, a quem
vão os louros de ter encetado essa operação pioneira. O único percalço até a
infausta jornada de ontem havia sido a liberação do ex-diretor da Petrobrás, Renato Duque, representante do Partido
dos Trabalhadores na nossa assaltada maior empresa, através de liminar
concedendo a esse senhor a liberdade provisória. Pela pressão da sociedade, o
Ministro Teori Zavascki voltaria
atrás, rescindindo a própria liminar.
Os empreiteiros beneficiados pela
liminar da 2ª Câmara
do Supremo Tribunal Federal foram: Ricardo
Pessoa, presidente da UTC e havido como o chefe do ‘Clube das empreiteiras’,
José Aldemário Pinheiro Filho, presidente da OAS, que é
também conhecido como Léo
Pinheiro, José Ricardo Auler
(Presidente do Conselho de Administração da Camargo Corrêa, Agenor
Franklin Medeiros (Diretor da OAS),
havido como um dos principais responsáveis do esquema dentro da OAS), Sergio Mendes (Vice-Presidente da Mendes
Júnior), Gerson de Mello Almada
(Vice-Presidente da Engevix), Mateus Coutinho
de Sá (Diretor financeiro da OAS),
Erton Medeiros Fonseca (Executivo da Galvão Engenharia) e José Ricardo Breghirolli (funcionário
da OAS e acusado representante da empreiteira junto ao doleiro Alberto Youssef).
Embora o STF tenha imposto uma série de
condições aos réus – deverão ficar sempre dentro de casa (a dita prisão
domiciliar), não poderão manter contato com outros investigados, ficarão
proibidos de deixar o país (é mister entregar o passaporte à Justiça), usarão
tornozeleira eletrônica, não poderão exercer atividades empresariais,
precisarão comparecer quinzenalmente em juízo e não podem mudar de endereço sem
apresentar justificativa à Justiça – há uma mudança substancial no processo de
justiça.
Essa aparente pletora de severas
restrições não impediu que, no estacionamento da PF em Curitiba, Carla
Domênico, uma das advogadas do presidente da UTC, não contivesse a sua
alegria ao receber a notícia. Abraçou de forma efusiva colega que a acompanhava
em visita ao empreiteiro Pessoa
(dito chefe do ‘clube das empreiteiras’), que foi quem financiara a reforma de
sítio no interior de São Paulo, atendendo
a pedido do ex-presidente Lula da Silva.
É lamentável que a decisão de ontem
da 2ª Turma do STF venha derrubar a prisão preventiva de dois empreiteiros que
davam a impressão de aceitar fazer a chamada delação premiada, que, como assinala Merval Pereira em sua coluna, “cada
qual com histórias que ligam a presidente Dilma e o ex-presidente Lula aos
desmandos ocorridos na Petrobrás”.
São no mínimo interessantes as
anotações de Ricardo Pessoa, da UTC (o chefe do chamado Clube das Empreiteiras, a que a revista VEJA teve acesso: “Edinho
Silva está preocupadíssimo. Todas as empreiteiras acusadas de esquema criminoso
da Operação Lava-Jato doaram para a
campanha de Dilma. Será que falarão sobre vinculação campanha x obras da
Petrobrás ?”, escreveu Pessoa em um
bloco na prisão.
Por outro lado, o dito ‘Léo
Pinheiro’, também liberado ontem pela 2ª Turma do Supremo, presidida
por Teori Zavascki, ‘preparava-se
para contar seu relacionamento com o ex-Presidente Lula, inclusive a reforma
milionária de propriedade em Atibaia que todos conhecem como “a casa do Lula”,
mas que está em nome de terceiros, por coincidência sócios de seu filho Lulinha – que também mora
em apartamento em São Paulo de R$ 6 milhões, que igualmente está registrado em
nome de um desses sócios” (ou serão laranjas?).
Incidentalmente, a senhora
fortuna de Lulinha seria motivo de espanto, tal a gama de interesses acionários
do empresário e filho do ex-presidente.
Malgrado as queixas de que a
prisão preventiva durava por tempo demasiado não se sustentam, se tivermos
presente o parecer do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, assim como
os votos (infelizmente minoritários) dos Ministros Carmen Lúcia e Celso de
Mello, que mostram que existiam na verdade condições jurídicas para manter a
prisão preventiva que, de resto, já
havia sido referendada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo
Superior Tribunal de Justiça (STJ). A fortiori, a decisão dos ministros do
STF (por 3x2) de mandar para prisão domiciliar os acusados, com tornozeleira
eletrônica e horário rígido de recolhimento, demonstra que os empreiteiros –
mesmo para os três juízes que votaram a favor do recolhimento – continuam oferecendo
perigo à sociedade.
Salvaguardas à parte, é mister
não esquecer que estamos no Brasil, e muita vez essas tornozeleiras ou são
ignoradas, ou não funcionam, o que tende a dificultar o seu acompanhamento
pelos órgãos competentes.
Os votos dos dois Ministros que
dissentiram sublinham não só a pertinência de manter a injunção prevalente,
assim como a sua oportunidade. O decano
do Supremo, Celso de Mello afirmou: “Torna-se inviável a conversão da prisão
preventiva em medidas cautelares alternativas quando a privação cautelar da
liberdade individual tem fundamento, como sucede na espécie, na periculosidade do réu em face da
probabilidade real e efetiva de continuidade da prática de delitos gravíssimos,
como os de organização criminosa, de corrupção ativa e de lavagem de valores e
de capitais”, reportando-se no caso ao presidente da UTC.
Também é cristalino e incisivo nos seus
argumentos o voto da Ministra Carmen Lúcia que foi contra a
concessão de habeas corpus, avaliando
que o interrogatório do empreiteiro, marcado para 2ª Feira, pode levar à
necessidade de novas diligências, e testemunhas podem ser novamente
inquiridas. “Não existe instrução quase
acabada”, afirmou ela. ‘Em casa, consoante aduziu a Ministra, Pessoa pode
seguir em contato com os negócios da
empresa. Nesse sentido, Carmen Lúcia
sublinhou que o decreto de prisão
preventiva foi baseado em provas da prática de crimes de alta gravidade contra
a Administração Pública e de lavagem de dinheiro. Continuando na sua aula
prática – que infelizmente não foi ouvida pela maioria dos ministros – lembrou a
Ministra que embora as investigações já estejam próximas do fim, ainda não terminaram (meu o grifo).
Faltam os depoimentos do próprio réu e de testemunhas de defesa. Outrossim, a
Ministra também lembrou que o juiz pode
ouvir testemunhas de acusação antes de
concluir a instrução. Para ela, o risco de libertar Pessoa seria
ele tentar cooptar essas testemunhas.
Ironicamente, se encontram no
voto do Ministro Gilmar Mendes motivos cogentes para determinar a negação de provisão de liberdade
provisória aos réus. Referiu-se nesse
contexto à Operação Lava-Jato ao “maior escândalo de corrupção no país”, e comparou o
caso ao Mensalão (Ação Penal 470). Em tal contexto,
lembrou o Ministro que enquanto o STF julgava o processo do Mensalão, em 2012,
ocorriam os desvios na Petrobrás. Não
obstante o quanto precede, Gilmar Mendes votou pela libertação de Ricardo
Pessoa. A propósito, que as investigações já estão em fase final e, por isso,
não haveria risco (sic) de o réu atrapalhar a coleta de provas.
O voto de Gilmar Mendes – que foi vertido em verdadeiro discurso – e há nele,
SMJ, argumentos pró e contra a concessão da liminar. Com efeito, Gilmar Mendes comparou os desvios
da Petrobrás com o Mensalão, concluindo que o escândalo atual foi uma
continuação do primeiro. Sem embargo desta argumentação, o ministro ponderou que
a prisão de Pessoa foi mantida por tempo excessivo sem julgamento.
E concluiu: “O Supremo não tem aceito o
clamor público como justificativa da prisão preventiva. Isso tornaria o STF
refém de reações da sociedade. A
garantia da ordem pública não justifica a prisão.”
Será mesmo que, por questão de um
punhado de dias, devamos colocar em risco toda a instrução de processo, levada
a cabo, com proficiência, correção e coragem pelo Juiz Sérgio Moro?
( Fontes: O Globo, Merval Pereira, revista VEJA )
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