A frase de
Dilma Rousseff quanto à circunstância de que a corrupção é uma velha senhora não
pretende apenas banalizar a roubalheira que aí está. Na verdade, a sua
aparência por assim dizer filosófica, embora da espécie rasteira, insinua muito
mais de um simples dar de ombros. Na visão da presidenta, a corrupção existirá sempre e essa sua resistência já
seria indicação de que ela é um fator que não pode ser ignorado. E, sobretudo –
e aí é que está o perigo – ela não deveria ser levada muito a sério...
Insinuar que,
pelo fato de a corrupção ser uma relação perene na sociedade, ela deveria ser
relativizada, como se a gatunagem na Petrobrás fosse apenas mera faceta
encontradiça na sociedade, e que por conseguinte a respectiva influência não
deveria ser exagerada, é postura irresponsável e ainda por cima propositalmente
errônea.
Dessarte, a
frase presidencial pode à primeira vista parecer inocente, quase anódina, mas
ela tem uma peçonha que se insinua na mente dos ouvintes, como se esse
ectoplasma simpático, quase inofensivo, viesse pedir passagem, dizendo: ora
essa, o que eu faço, todos fazem, porque então essa gritaria?...
Talvez por
isso a frase presidencial, que semelha tão sábia no seu relativismo, na verdade
constituiria a confissão de que tais métodos não podem ser descartados.
O problema
com a corrupção é que ela não conhece limites.
Vamos aqui
testar uma fábula. Segundo as declarações de quem nos governa, aqui não existe corrupção.
Para rebater essas insidiosas acusações, a negativa e a presunção da inocência
são os instrumentos da vez.
Negar, negar
sempre, mesmo se a vista de todos os malfeitos se transmutam em corrupção. A
negativa é um direito não só de cada um, mas também das associações formadas
com o propósito de dilapidar a cousa pública. Negar, negar sempre, seria a
saída.
Mas a
mentira, por mais sanhuda, enérgica e insistente, tende a aparecer sempre, seja
pelas costuras, seja pela repetição das situações, seja por qualquer cousa de
indizível que tende, como um joão-teimoso a ficar de pé mais uma vez, malgrado
todo o esforço seja em maquiá-la ou disfarçá-la.
Até que toda
a construção venha por terra. Desse modo, o que era mentira e dissimulação,
vira verdade e admissão com a cara deslavada da prática até então negada, e por
mais de três vezes. O suborno, a
comissão ilegal, a propina viram instrumentos de governo, e a corrupção, a
velha senhora, volta desta feita aos gabinetes, altos e baixos, onde o seu
aporte é computado, e apresentado como meio administrativo.
O mais triste
de tudo isso é que esses papalvos chegam a acreditar nessas estórias, como se o
Brasil mais uma vez se destacasse no concerto das nações: desta feita,
mostrando que a corrupção seria instrumento legítimo de governo!
O pior não é
o fato de que tais absurdos possam ser mentalizados e expressos à luz do
dia. Pois esse pior vira péssimo, e crê
poder enganar o Povão. Mesmo nessas circunstâncias, em que o contato com a
realidade se vai afinando e adelgaçando cada vez mais, surge sempre a voz de
uma criança ou de um jovem, que gritará que o rei e seus lacaios dizem
besteiras, ou porque são safados, ou porque perderam qualquer sentido da realidade...
( Fonte subsidiária: coluna de Ricardo Noblat, em O Globo )
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