quinta-feira, 30 de abril de 2015

A Rainha Fraca


                         

       O Google me relembra o que escrevi no blog em 2008, então a respeito da seleção: um fraco rei faz fraca a forte gente. Esse verso camoniano, Brizola o citava amiúde. E ele, infelizmente, continua atual, feita a mudança de gênero.

       Assim, o Banco Central eleva mais uma vez a Selic, a taxa básica de juros em nossa economia, que salta de 12,75% a 13,25 ao ano. Haverá decerto choro e ranger de dentes. É a quinta alta consecutiva acordada pelo Copom (Comitê de Política Monetária) e o maior patamar desde janeiro de 2009.

       Note-se que tal nível nos transporta à grande crise global, desfechada pela consentida falência do Banco Lehman Brothers.  Como a inflação continua subindo – ultrapassou os oito por cento a.a., como ontem assinalado – o único instrumento de controle ativo da carestia é a taxa de juros do Banco Central.

       Com isso se desestimula o crédito bancário, eis que os financiamentos se tornam mais caros. Em época recessiva, o vale de lamentações – sobretudo sindicais – há de tornar-se mais vocal.

       Há muito anunciada – e com as suas feias feições à mostra – a inflação continua subindo, máxime no ramo dos serviços, que é o que mais pensa ganhar à custa da carestia. Volta aquela que nunca partiu – e eis um dos erros do Plano Real – a sopa indigesta dos números da profusão de índices. O dragão que nos infernizou a vida nos anos oitenta e noventa, acreditamos que fosse partido.

       O problema de seu renascimento se deve sobretudo ao egoísmo de Lula da Silva, que impingiu ao eleitorado brasileiro o primeiro poste (dos quais até pouco ele se gabava), eleita em 2010 o que os nordestinos chamaram com irônica presciência de a Mulher do Lula. Criatura dele, pensara quem sabe instituir por aqui  o Maximato de Plutarco Elías Calles no México.  Com uma presidente fraca, pensara continuar governando.

         No que deu, sabemos nós muito bem, talvez demasiado bem. Mas não adianta chorar sobre o leite derramado. O único propósito seria que não o derramássemos mais.  Sem embargo, com a ajuda do marqueteiro João Santana e do aparelhamento do Estado – não se esqueçam do direito de resposta que o TSE negou à Marina, que sequer absurda acusação pôde rebater – Dilma logrou superar, com mentiras e cara de pau, a barreira do segundo turno, vencendo por 3% o antagonista Aécio Neves.

         Aí, os deuses quiseram que os céus caíssem só depois da suada reeleição. Comprovadas as mentiras e descobertos os escândalos – notadamente o Petrolão – a antiga motoniveladora do primeiro mandato transformou-se em tratorzinho de segunda mão, incapaz de arar tanta desconfiança e tanta raiva do povão, ao sentir-se mais do que engodado, ludibriado.

         E o derretimento de Dilma Rousseff ainda não terminou.  Se o PSDB de Aécio se decidir pelos ínvios caminhos do impeachment ainda é um segredo do Olimpo. O retrospecto não é bom, porque essa grei às vezes mais detesta o companheiro de partido do que o adversário político. E por isso pode ser presa fácil – como o foi com Lula da Silva em 2006 – e então por que não  seria de novo?

           A fraqueza da timoneira é um peso, menos para o Partido dos Trabalhadores (que de alguma forma a inventou) do que para a Nação brasileira.

           Dessarte as maiorias de papier-maché que o mago Lula e a magna gestora Dilma construíram se desfizeram no primeiro embate congressual. Eduardo Cunha e o PMDB varreram com facilidade o candidato da suposta maioria, Arlindo Chinaglia (PT/SP). Desfeito o sonho, nossa rainha caíu no inferno astral, em que hoje se debate.

           Nunca, em tão pouco tempo, a primeira mandatária da Nação mergulhou em tal pântano. A  ponto de ver-se tangida a terceirizar o poder, que entrega nas mãos do PMDB, seja com Cunha e Renan, no Legislativo, e  Michel Temer, como coordenador político. A todos esses movimentos, correspondera uma ação inicial do Planalto, eivada da medíocre incompetência, seja de áulicos, seja de canastrões.

           Na Fazenda, está o competente Joaquim Levy (e no Planejamento Nelson Barbosa).  Mas a falta de liderança de Dilma Rousseff e a fraqueza de seu governo, ativa a formação de blocos e facções contrárias, que já não lhe temem. A situação falimentar da economia – que forçou a convocação de Levy – carece de um ajuste fiscal.  Para implementá-lo, no entanto, careceríamos de uma Presidente com força e liderança, e essa pelo visto sumiu depois do triunfo nos dois turnos (e os escândalos como contraponto)

             Assim, como bem resume a Folha, caíu de R$ 18 bilhões para R$ 7,7 bilhoes a economia que o governo petista pensara realizar em 2015, com mudanças nas regras de acesso a benefícios sociais (nos governos anteriores de Lula e Dilma se multiplicaram as benesses de forma inaudita, que não se vê alhures)

             Com a inaudita fraqueza de Dilma, a negociação coube ao Ministro da Fazenda, que se tinha a energia, não possuía os votos para montar o Ajuste em termos cabíveis e suportáveis pela economia. Assim, a economia prevista – e necessária – para repor a economia em condições só terá efeito em 2016.

              Por outro lado, cai de R$ 18 bilhões para R$ 7,7 bilhões a economia prevista pelo Governo em 2015, com as mudanças nas regras de acesso a benefícios sociais.

              Juntam-se fraqueza governamental e demagogia anterior, e continua por isso o risco de o país perder o selo de bom pagador volta a galope, nas palavras do Ministro Joaquim Levy.

               Mas a aliança da turminha parlamentar e das centrais sindicais acredita na chamada da Terra da Cuccagna, que não ficaria só na Itália. Tudo ela pode dar, mesmo sem trabalho e sem a devida economia. Para eles, na fábula, quem leva a melhor é a cigarra e nunca a formiga...

 
( Fontes:  Folha de S. Paulo,  O  Globo )

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Notícias direto do Front

                                     

Saída de Marta do PT

 
       Segundo alega, pelo tratamento recebido, a Senadora Marta Suplicy está deixando o PT (vai para o PSB). Sai atirando contra a corrupção no partido, além do mau tratamento recebido nos últimos tempos.

        Compreende-se que a expoente do antigo PT tenha tido grande dificuldade em digerir a coroada mediocridade de Dilma Rousseff, assim como o último poste, i.e. Fernando Haddad.

         Marta muitas coisas trouxe ao moinho do PT, vencendo duras batalhas contra os lock-outs dos donos dos ônibus, além de haver introduzido o passe único (de três horas) em favor dos usuários dos transportes coletivos.

           Nesse tipo de separação contenciosa, as baixarias tendem a proliferar. No entanto, de acordo com a legislação, se afirma lícito que o PT pretenda reivindicar judicialmente o que resta do mandato senatorial de Marta. A conferir, eis que nem sempre sai como as partes supõem.

 

Novo crime policial contra o negro americano

 

           Nesses últimos tempos, vários crimes de policiais brancos têm matado afro-americanos. Nos casos em tela, as polícias em geral se assinalam não só por sua brancura, mas também pelo tratamento rude, desrespeitoso e às vezes criminoso com que visitam  infelizes negros que porventura lhes cruzam o caminho.

           Nesse contexto, é tristemente informativo  vislumbrar, com atônita surpresa, o tiro pelas costas dado em afro-americano que procurava afastar-se correndo (com razão, pelo visto) do policial, e a maneira fria com que este o abate mortalmente, como se participe de anódino exercício de treinamento de pontaria.

           Na semana passada, em Baltimore, Freddie Gray foi levado para a delegacia. Como inculpação, ele detinha um canivete (o que para a polícia branca dessa cidade, já basta para assinalar –lhe a suspeição).

           A surra que aplicaram em Freddie – que era um homem jovem e robusto – foi a tal ponto que lhe fraturou a medula espinhal. A estúpida morte de mais um afro-americano nas mãos de polícia violenta e racista, em que são numerosos os descendentes de poloneses e de outras etnias europeias, provocou compreensível e incontrolável revolta na comunidade negra.

             O fato de os Estados Unidos terem um presidente negro não parece diminuir a postura preconceituosa e racista de sua polícia municipal, como os diversos incidentes – em geral mortais para as vítimas afro-americanas – na Flórida e em Missouri, e agora em  Maryland, bastante próxima da capital onde Barack Obama vive na Casa Branca, semelham peças de um falso quebra-cabeças. Tampouco colabora para a reconciliação, a maneira unidirecional do tratamento judiciário, em que os brancos são os inocentes, e os negros, culpados.

             A comunidade negra reage, em motins e desordens generalizadas. Tem sido assim, desde o assassínio de outro negro, na Califórnia – se não me engano na década final do século vinte -  também pela polícia municipal de Los Angeles. É mais do que compreensível a reação, embora sirva sobretudo para tornar a situação ainda mais tensa.

                Diante da violência policial branca e da reação da comunidade negra, revoltada e com razão, pela postura preconceituosa de aparato de segurança em que os brancos em geral predominam, a única saída para esta crise estaria talvez na formação de unidades policiais mistas, em que negros e brancos coexistissem e operassem juntos.

                Dentro de formações em que brancos e negros se alternariam no comando, e em que o preconceito seria penalizado fortemente, reside a esperança de que a cooperação na luta contra os malfeitos tenda a aproximar as comunidades.

                Será esperar demasiado no triunfo do bom-senso? 

 
Inflação e Desemprego      

 
               A inflação – que devemos a Dilma Rousseff pela sua ruinosa política econômico-financeira – quebrou todos os tetos do Banco Central, chegando a 8,2% no período. Mas há outros desenvolvimentos nessa área, que talvez sejam tanto ou mais preocupantes do que o dado acima.

               A carestia tem efeito evidente nos salários, ao observar-se que a renda nominal (sem correção monetária) cresceu 5% (comparando com março de 2014), abaixo, portanto, da inflação registrada no período.

               Por outro lado, em termos de desemprego, há dois dados que marcam a gravidade da crise no Brasil: de março de 2014 a março de 2015, o  crescimento da população desempregada foi de 23,1%; por outro lado, no último trimestre (dezembro/2014 a março/2015), o incremento do desemprego passou de 4,3% a 6,2% .

 

( Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo, The New York Times )

Terminou a Lava-Jato ?

                                          

         Terá durado mais do que o previsto a operação Lava-Jato, assinalada pelo Juiz Sérgio Moro, que mantinha até ontem os nove executivos – muitos chefes de poderosas empreiteiras – na prisão, sem firulas, de Curitiba?

         Até o dia 28 de abril, todos os mandados em prol da libertação dos corruptores haviam sendo denegados, mantendo, por conseguinte, a pressão sobre os acusados em confessarem alianças e pactos com os grandes e pequenos corruptos, que não seriam decerto revelados se o incômodo cativeiro fosse levantado.

         O jovem juiz Moro, com firmeza, continuara o seu trabalho, que é a sequência das investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, a quem vão os louros de ter encetado essa operação pioneira. O único percalço até a infausta jornada de ontem havia sido a liberação do ex-diretor da Petrobrás, Renato Duque, representante do Partido dos Trabalhadores na nossa assaltada maior empresa, através de liminar concedendo a esse senhor a liberdade provisória. Pela pressão da sociedade, o Ministro Teori Zavascki voltaria atrás, rescindindo a própria liminar.

         Os empreiteiros beneficiados pela liminar da 2ª Câmara do Supremo Tribunal Federal foram: Ricardo Pessoa, presidente da UTC e havido como o chefe do ‘Clube das empreiteiras’, José Aldemário Pinheiro Filho, presidente da OAS, que é também conhecido como Léo Pinheiro, José Ricardo Auler (Presidente do Conselho de Administração da Camargo Corrêa, Agenor Franklin Medeiros (Diretor da OAS), havido como um dos principais responsáveis do esquema dentro da OAS), Sergio Mendes (Vice-Presidente da Mendes Júnior), Gerson de Mello Almada (Vice-Presidente da Engevix), Mateus Coutinho de Sá (Diretor financeiro da OAS), Erton Medeiros Fonseca (Executivo da Galvão Engenharia) e José Ricardo Breghirolli (funcionário da OAS e acusado representante da empreiteira junto ao doleiro Alberto Youssef).

           Embora o STF tenha imposto uma série de condições aos réus – deverão ficar sempre dentro de casa (a dita prisão domiciliar), não poderão manter contato com outros investigados, ficarão proibidos de deixar o país (é mister entregar o passaporte à Justiça), usarão tornozeleira eletrônica, não poderão exercer atividades empresariais, precisarão comparecer quinzenalmente em juízo e não podem mudar de endereço sem apresentar justificativa à Justiça – há uma mudança substancial no processo de justiça.

           Essa aparente pletora de severas restrições não impediu que, no estacionamento da PF em Curitiba, Carla Domênico, uma das advogadas do presidente da UTC, não contivesse a sua alegria ao receber a notícia. Abraçou de forma efusiva colega que a acompanhava em visita ao empreiteiro Pessoa (dito chefe do ‘clube das empreiteiras’), que foi quem financiara a reforma de sítio no interior de São Paulo, atendendo a pedido do ex-presidente Lula da Silva.

           É lamentável que a decisão de ontem da 2ª Turma do STF venha derrubar a prisão preventiva de dois empreiteiros que davam a impressão de aceitar fazer a chamada delação premiada, que, como assinala Merval Pereira em sua coluna, “cada qual com histórias que ligam a presidente Dilma e o ex-presidente Lula aos desmandos ocorridos na Petrobrás”.

               São no mínimo interessantes as anotações de Ricardo Pessoa, da UTC (o chefe do chamado Clube das Empreiteiras, a que a revista VEJA teve acesso: “Edinho Silva está preocupadíssimo. Todas as empreiteiras acusadas de esquema criminoso da Operação Lava-Jato doaram para a campanha de Dilma. Será que falarão sobre vinculação campanha x obras da Petrobrás ?”, escreveu  Pessoa em um bloco na prisão.

               Por outro lado, o dito ‘Léo Pinheiro’, também liberado ontem pela 2ª Turma do Supremo, presidida por Teori Zavascki, ‘preparava-se para contar seu relacionamento com o ex-Presidente Lula, inclusive a reforma milionária de propriedade em Atibaia que todos conhecem como “a casa do Lula”, mas que está em nome de terceiros, por coincidência  sócios de seu filho Lulinha – que também mora em apartamento em São Paulo de R$ 6 milhões, que igualmente está registrado em nome de um desses sócios” (ou serão laranjas?).

               Incidentalmente, a senhora fortuna de Lulinha seria motivo de espanto, tal a gama de interesses acionários do empresário e filho do ex-presidente.

               Malgrado as queixas de que a prisão preventiva durava por tempo demasiado não se sustentam, se tivermos presente o parecer do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, assim como os votos (infelizmente minoritários) dos Ministros Carmen Lúcia e Celso de Mello, que mostram que existiam na verdade condições jurídicas para manter a prisão preventiva que, de resto,  já havia sido referendada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).  A fortiori, a decisão dos ministros do STF (por 3x2) de mandar para prisão domiciliar os acusados, com tornozeleira eletrônica e horário rígido de recolhimento, demonstra que os empreiteiros – mesmo para os três juízes que votaram a favor do recolhimento – continuam oferecendo perigo à sociedade.

              Salvaguardas à parte, é mister não esquecer que estamos no Brasil, e muita vez essas tornozeleiras ou são ignoradas, ou não funcionam, o que tende a dificultar o seu acompanhamento pelos órgãos competentes.

              Os votos dos dois Ministros que dissentiram sublinham não só a pertinência de manter a injunção prevalente, assim como a sua oportunidade.  O decano do Supremo, Celso de Mello afirmou: “Torna-se inviável a conversão da prisão preventiva em medidas cautelares alternativas quando a privação cautelar da liberdade individual tem fundamento, como sucede na espécie,  na periculosidade do réu em face da probabilidade real e efetiva de continuidade da prática de delitos gravíssimos, como os de organização criminosa, de corrupção ativa e de lavagem de valores e de capitais”, reportando-se no caso ao presidente da UTC.

              Também é cristalino e incisivo nos seus argumentos o voto da Ministra Carmen Lúcia que foi contra a concessão de habeas corpus, avaliando que o interrogatório do empreiteiro, marcado para 2ª Feira, pode levar à necessidade de novas diligências, e testemunhas podem ser novamente inquiridas.  Não existe instrução quase acabada”, afirmou ela. ‘Em casa, consoante aduziu a Ministra, Pessoa pode seguir  em contato com os negócios da empresa.  Nesse sentido, Carmen Lúcia sublinhou  que o decreto de prisão preventiva foi baseado em provas da prática de crimes de alta gravidade contra a Administração Pública e de lavagem de dinheiro. Continuando na sua aula prática – que infelizmente não foi ouvida pela maioria dos ministros – lembrou a Ministra que embora as investigações já estejam próximas do fim, ainda não terminaram (meu o grifo). Faltam os depoimentos do próprio réu e de testemunhas de defesa. Outrossim, a Ministra também lembrou que o  juiz pode ouvir  testemunhas de acusação antes de concluir a instrução.  Para ela, o risco de libertar Pessoa seria ele tentar cooptar essas testemunhas.

              Ironicamente, se encontram no voto do Ministro Gilmar Mendes motivos cogentes para determinar a negação de provisão de liberdade provisória aos réus.  Referiu-se nesse contexto à Operação Lava-Jato ao “maior  escândalo de corrupção no país”, e comparou o caso ao Mensalão (Ação Penal 470). Em tal contexto, lembrou o Ministro que enquanto o STF julgava o processo do Mensalão, em 2012, ocorriam os desvios na Petrobrás.  Não obstante o quanto precede, Gilmar Mendes votou pela libertação de Ricardo Pessoa.  A propósito, que as investigações já estão em fase final e, por isso, não haveria risco (sic) de o réu atrapalhar a coleta de provas.

               O voto de Gilmar Mendes – que foi vertido em verdadeiro discurso – e há nele, SMJ, argumentos pró e contra a concessão da liminar.  Com efeito, Gilmar Mendes comparou os desvios da Petrobrás  com o Mensalão, concluindo que o escândalo atual foi uma continuação do primeiro. Sem embargo desta argumentação, o ministro ponderou que a prisão de Pessoa foi mantida por tempo excessivo sem julgamento.

               E concluiu: “O Supremo não tem aceito o clamor público como justificativa da prisão preventiva. Isso tornaria o STF refém de reações da sociedade.  A garantia da ordem pública não justifica a prisão.”

              Será mesmo que, por questão de um punhado de dias, devamos colocar em risco toda a instrução de processo, levada a cabo, com proficiência, correção e coragem pelo Juiz Sérgio Moro?

 

( Fontes:   O  Globo, Merval Pereira, revista VEJA )

terça-feira, 28 de abril de 2015

Dilma tem perfil ?

                                          

        A poucos terá escapado mais um fenômeno – e quê fenômeno! – na política nacional. Não me reporto a Lula da Silva, que quer despontar como o novo valor do Partido dos Trabalhadores para a próxima eleição presidencial.

        Sem desdouro para Lula, a bola da vez neste momento é Dilma Rousseff. Talvez o maior erro que cometeu – excluída a aceitação da presidência, em 2010 – foi a sua escolha de pleitear o segundo mandato.

        No primeiro quadriênio, a húbris pontuou alto, chegando a investir contra o vernáculo, ao inventar-se o horrível neologismo presidenta com que julgou oportuno celebrar a própria feminilidade no Palácio do Planalto.

        Salvo os áulicos de plantão – e a velha marchinha já cantava  o cordão dos puxa-sacos – esse estranho termo ali ficou com a sua incômoda presença palaciana. Mais um capricho afirmativo. Já na pré-eleição o povo nordestino preferiu chamá-la de  mulher do Lula, expressão decerto mais veraz, enquanto igualmente refletia o caráter impositivo, sem qualquer contribuição da candidata. Ao elegê-la, o Brasil mostrou que ainda não superou a fase do paternalismo coronelístico.

       Espalhada para os trouxas e os crédulos de plantão como espécie de primeiro-ministro  - um pouco no modelo de o que teria sido José Dirceu, que não se pejou de declarar alto e bom som – no meu Governo – em seu discurso de despedida, enxotado que fora pelo Mensalão,  na verdade Dilma Rousseff  foi na Casa Civil apenas  chefa de gabinete de Lula.

       Selecionada pelo presidente para sucedê-lo, menos por suas qualidades, do que para impedir que lá se sentasse algum medalhão do partido que pudesse fazer sombra ao fundador do PT, Dilma, chegado o tempo desse presente de grego dado por Fernando Henrique à política brasileira (i.e., a reeleição), preferiu ir em frente e desconhecer a vontade do seu criador.

       A conjunta ironia – tanto na indicação de Lula (que ele pensara fosse muito esperta), quanto na força intrínseca da presidente em funções para postular o continuísmo – teve grande eficiência em afastar o seu padrinho, e garantir  a própria  eleição.

       Foi apertada a sua vitória – apenas 3%. Foi suficiente para vencer o desafiante Aécio no segundo turno. O importante  para ela fora lograr afastar Marina do segundo turno (dado o justificado temor que os petistas nutrem pela carismática acreana).

       Lula tudo fez para dissuadi-la da nova candidatura. Ele tinha toda a razão, mas as cartas na mão de Dilma eram mais fortes. Apesar da gestão temerária ou quase no primeiro mandato, a sorte da presidenta foi de que o magno escândalo do Petrolão ainda não estourara pra valer.

       Por outro lá, com muita cara de pau, boa dose de cinismo e a mirífica ajuda do mago João Santana, ela conseguiu o quase impossível – que o baú dos erros do primeiro mandato tivesse diferido o seu estouro.

       Para o eleitor, a verdade chegou com atraso. Só mais tarde a ficha cairia. Ninguém gosta de ser feito de trouxa, e foi este o sentimento da grande maioria dos votantes pró-Dilma.

       Com os escândalos espoucando, Dilma foi encolhendo politica e administrativamente. De repente, todos se lembram dos meses finais de José Sarney, em que a impopularidade o expulsava das ruas e de aparições públicas.

       Afirmativa, grosseira, impiedosa, recordista (no primeiro mandato) de mensagens sob qualquer pretexto na tevê,  eis que aquela que fazia ministros chorarem, ou que os mimoseava com palavrões,  ou que até se empenhava em batalhas de cabide – como  nos conta Ricardo Noblat -  de repente, a casa cai e tudo muda. E a sorridente da segunda posse, emagrece de chofre e a fisionomia está mais para Almodóvar e mulheres no limite do ataque de nervos.

       Escolhendo gente menos pela qualidade do que pela incoercível vontade de agradar – que é do feitio do fâmulo e do favorito da vez – não é que  no maldito segundo mandato tudo começa a dar errado? Das mãos se vão os anéis, enquanto os velhos amigões desaparecem dos postos de mando no Legislativo. Desafetos lhe são empurrados goela abaixo, e ela já não manda mais no Congresso...

        Quem se acreditara muito popular, se vê obrigada a recolher-se. Encolhe o seu poder, pois o presidencialismo vira parlamentarismo caboclo. E a antiga força e prepotência, ei-las transformadas em fraqueza e humildade forçada.

        O velho Economist, este nosso desafeto de plantão na imprensa mundial, se diverte com a sua condição de mandatária sem prestígio e sem poder, ainda que exagere, pois Dilma ainda não pode ser comparada aos presidentes da França na Terceira República, quando moravam no Palácio Elisée,  e inauguravam exposições  florais...

       Por último, Dilma que antes forçava a barra, e vinha discursar na tevê a propósito de quase tudo, eis que renuncia a falar na Data universal do Partido dos Trabalhadores, também conhecida como o Primeiro de Maio ...

       Agora, são os panelaços que a fazem apequenar-se ainda mais.

       Dilma Rousseff, a Presidenta, o terror de Ministros, secretários e secretárias, não é que perdeu o perfil?

 

( Fontes: O Globo, Coluna de Ricardo Noblat, Folha de S. Paulo )  

segunda-feira, 27 de abril de 2015

PIF PAF

                                                   

Manoel Dias, fica!

 
         Depois das declarações de Carlos Lupi, presidente nacional do PDT, que disse ao Estadão que os petistas “roubaram demais, exageraram”, surgiram compreensíveis indagações se Manoel Dias, o Ministro do Trabalho e representante no governo do PDT ficaria no Governo.

         Nesse contexto, Dias fez saber que a versão apresentada a ele por Lupi – cujo depoimento sobre o PT foi gravado  - foi diferente, sem as críticas contundentes ao aliado. Manoel Dias tampouco se sente constrangido em permanecer no ministério. A respeito, disse: “Me dou por satisfeito com a resposta dele (Lupi)”.

          Mais contundente, em verdade, foi a reação de Humberto Costa (PE), líder do PT no Senado: “Acho que isso é resultado de uma pessoa boquirrota, uma pessoa que sinceramente eu não valorizo”.

 

O  Coaf e a Lava Jato

 
              Segundo informa o Estado, o Conselho de Controle de Atividade Financeira(COAF) vai disparar na corrente semana alertas a bancos, empresas e outras instituições para que passem a comunicar qualquer movimentação atípica envolvendo servidores públicos.

               Mas não se cinge a esta óbvia lista o chamado “grupo de risco” do Coaf . Integram tal grupo, outrossim, operações de comércio exterior – em razão de remessas ilegais – compras de produtos que podem ser usados para produzir drogas, site de vendas na internet, movimentação de cartão de benefícios – pelos quais se pode praticar agiotagem -, contas bancárias de estudantes (pelas quais pode circular dinheiro do tráfico), postos de gasolina, além de contratação de shows sem licitação por prefeituras.

              A quê se deve a redobrada atenção sobre servidores públicos e postos de gasolina?  Tal nasceu com a experiência adquirida na  Operação Lava Jato.

              Com efeito, foi a partir de suspeitas  sobre as movimentações financeiras de um posto de combustível em Brasília que a Polícia Federal logrou desbaratar o mega-esquema de lavagem de dinheiro e a corrupção na Petrobrás.

               O Posto da Torre, localizado a 3 km do Congresso Nacional, realizava factoring (negociação de créditos). Servia, igualmente, consoante apuraram as investigações, de base de pagamento de propinas.

               E não fica aí. A Operação Lava Jato, hoje famosa pela sua contribuição a desmantelar a enorme corrupção na Petrobrás,  foi assim batizada como referência à magna contribuição – ainda que indireta - desse posto de gasolina na luta contra a corrupção na Petróleo Brasileiro S.A., que se viu instrumentalizada pelo aparelhamento por elementos do Partido dos Trabalhadores, assim como de outros menores, porém afins na mesma atividade criminosa.

 
As anedotas do Jantar aos jornalistas da Casa Branca

 
          O jeitão flegmático de Barack Obama ao inventar um super-ego furioso representou inovação que colheu grande sucesso junto aos jornalistas presentes.

          O  truque de Obama funcionou da seguinte forma: o presidente faz afirmação politicamente correta e uma espécie de tradutor – superego rebate como  que realmente a declaração deva ser interpretada.  Assim, a frase presidencial que “tradições como o jantar dos correspondentes da Casa Branca são importantes” vira na versão de Luther, o intérprete irado: “Sério? Que raios de jantar é esse ? Por que eu sou obrigado a vir? Ei, Jeb Bush, você quer mesmo fazer isto?”

          A brincadeira foi um sucesso. O Presidente, por sua natureza, não teve dificuldade em representar o straightman, enquanto o comediante afro-americano Keegan-Michel Key arrancava gargalhadas do público.

           Tradicionalmente tudo – ou quase tudo – é permitido nesse jantar. E não é de hoje que é realizado anualmente. Dentre os veteranos, quem não se recordará da voz sedosa de Marilyn Monroe a elogiar o Mr President (JFK), ainda mais com o subtexto do segredo de Polichinelo de o que entre os dois antes se passara?

 
  Gleisi Hoffman pediu doações a empreiteiras

 

         A Senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) admitiu em depoimento à P.F. que pediu contribuições a pelo menos cinco das grandes empreiteiras investigadas na Lava-Jato, mas negou que tenha recebido dinheiro do doleiro Alberto Youssef ou do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa. O ex-ministro Paulo Bernardo, marido de Gleisi, também negou que tenha intermediado pedido de dinheiro a Costa ou a Youssef para a campanha da mulher ao Senado em 2010. Segundo Gleisi e o marido, todos os recursos da campanha foram legalmente declarados à Justiça Eleitoral.

        Em inquérito aberto por ordem do Supremo, a senadora é investigaa por, supostamente, haver recebido R$ 1 milhão de Paulo Roberto Costa em transação intermediada por Youssef.  O dinheiro teria sido repassado pelo doleiro ao empresário Ernesto Kluger Rodrigues, amigo de Gleisi e Paulo Bernardo.

       Interrogada pelo delegado Thiago Machado Baladary no último dia catorze, na sede da P.F. em Brasília, Gleisi afirmou que não conhece Youssef e que Kluger buscou a adesão de empresários à campanha, mas não atuou na arrecadação de dinheiro.

       Gleisi Hoffman reconheceu, no entanto, que pediu contribuições a Odebrecht, OAS, Camargo Correa, UTC, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez. Nesse contexto, Gleisi sustenta que todas as doações foram devidamente registradas e que não houve qualquer promessa de contrapartida.

 

( Fontes: O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo,  O Globo )

Perfil de Lula

                                       

         Reconheço a pretensão, e por isso me apresso em dizer que todo retrato de Luiz Inácio Lula da Silva será necessariamente incompleto. Como todos os personagens maiores da história do Brasil, a sua imagem será em vida imperfeita, pelos detalhes de que a História é avara.

         De qualquer forma, os contemporâneos têm sobre os pósteros a vantagem da possibilidade de algum contato pessoal, o que sempre ajuda nesse trabalho que sói ser feito a milhares de mãos.

         Do rápido contato que me tocou ter com o Presidente Lula, é meu dever dizer que na sua brevidade mostrou pessoa afável e mesmo disposta a um gesto de cortesia para com o anfitrião, o que decerto o distingue de pronto de sua sucessora.

         Posto que essas imagens instantâneas tragam luzes que são vedadas a muitos, mas sobre tudo aos pósteros, elas ajudam a conformar  primeiro esboço de personalidade.

         Como todos os personagens da História, eles refletem uma época. O problema maior do contemporâneo, é que tal obra ainda não está completa, e o ser político – e não por própria vontade – sobretudo quando está entre os grandes, leva a ser mais arredio a intentos que busquem retratá-lo.

         Pela natureza de sua trajetória, tais imagens tendem a sofrer ou a receber infindáveis retoques, que às vezem podem até confundir, pois nessa infinidade de traço há os que engrandecem, ou contrariam, ou enganam, ou diminuem e até desfiguram. Não só pelo simples fato de viver, mas também pela circunstância de manter-se relevante, essas impressões podem ser de extrema mutabilidade.

        Não estarei adiantando muito se aditar que o ex-Presidente Lula, pela sua importância política, é um desses personagens cujo arco existencial inclui o aprendizado na pobreza, rápida passagem pela escola primária, a labuta como torneiro mecânico (marcada, como a tantos outros, por acidente), a ascensão na liderança sindical, as próprias qualidades e a peculiaridade do momento a empurrá-lo para outra liderança, que incluiria o itinerário pela prisão política, e a longa caminhada, à testa de um partido, a princípio radical e jacobino, até a chegada à presidência.

        A permanência por longo tempo seja no poder, seja nas cercanias do poder – como é o caso atualmente – pode afetar a leitura que os contemporâneos façam de sua travessia. Lula não é figura solitária na América Latina, como nos repete Ferreira Gullar. O seu tempo também é o de Hugo Chávez, na Venezuela, de Evo Morales, na Bolívia, Rafael Correa no Equador, e dos Kirchner na Argentina.

         O velho populismo neles está presente, e com as distinções nacionais, surge também no Brasil. O petismo de Lula tem várias caras, algumas ostensivas, como a do mergulho imediato nos gastos correntes e no aparelhamento do Estado. As ocultas, cuida o tempo de entremostra-las.

         Lula professa ter azia à leitura. Não deveria tê-lo, porque o convívio com o poder é um exercício desgraçado, em que o veludo das benesses pode trazer outras experiências, não tão macias e agradáveis.

          Por mais que os fâmulos e os cortesãos busquem alisar e polir as engrenagens da máquina do poder, a longa permanência e ainda maiores ambições costumam soprar e até mesmo ciciar róseos projetos que buscam contrariar a ordem das coisas, e até subverte-la na perene ilusão de um poder que eterno seja.

          De certa forma, lá dentro na câmara recôndita, o retrato impiedoso que pinta a realidade – que, na verdade, é a segunda natureza do eterno aprendiz – e que, com o passar do tempo, não será de contemplação agradável - lá permanece, solerte e importuno, e sempre à disposição do personagem.

        Assim, as velhas, cediças ilusões – desta vez será diferente! – são alucinações, que se acreditam passageiras. E, em verdade, elas o são, mas com uma diferença. Tudo no homem é transitório, até mesmo a húbris, esse fenômeno que a todos visita, e que pode até impressionar, mas há de se esgarçar e até evaporar, como as antigas civilizações, de que o vulgo pensa ter na bênção da ignorância a falaz oportunidade de ignorá-la.

        Pouco importa se ignora dos efeitos da máxima de Lord Acton. Mas não é mister muitas leituras, para que se apreenda que o poder é figura ambígua, que a alguns engrandece, e a outras apequena.

        Ao contrário das nuvens, cuja volubilidade é extrema, e a cada passo mostram cenário diverso – e há quem por isso as compare à política – o fantástico retrato de que falei acima, na verdade, não é que a realidade. Por mais que se busque escondê-la, ela há de repontar sempre, com as previsíveis consequências que a cada caso incumbem.

 

( Fontes:  O Globo, Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo; VEJA )  

domingo, 26 de abril de 2015

Colcha de Retalhos C 15

                                      

Lula e a Lava-Jato

                      
               Ultimamente há muita coisa no ar, e tal não se limita aos aviões de carreira, para lembrar o sempre oportuno Aporelly.

               A Veja que está nas bancas volta a acenar com a possível implicação de Lula na operação Lava-Jato.

               Uma vez mais, se repete o sensacionalismo da chamada de capa: “Exclusivo Operação Lava-Jato – EMPREITEIRO ARRASTA LULA PARA O MEIO DO ESCÂNDALO”.

              Mas ainda na capa, o leitor atento terá indicações de que as coisas não estão  nos finalmente:

               “Preso, Léo Pinheiro, da OAS, ameaça contar à Justiça o que sabe sobre  petrolão – e seu alvo é o ex-presidente”

                Anteriormente o cenário não foi muito diverso  com o empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, que continua preso (por ameaçar uma testemunha) e faz ameaças veladas, inclusive deixando escapar pistas dos danos que pode causar a Lula e outros poderosos. Mas até o presente, como no caso hodierno, não há nada de concreto.

 

Será que o 7x1 vai passar em branca nuvem ?

 

                   Que o futebol brasileiro já não apresenta a excelência da seleção de 1970, não é mistério para ninguém. Chegou-se, inclusive, a convocar para técnico o conhecido Dunga, que falhara estrepitosamente na Copa da África do Sul. Por motivos ignotos, com exceção de uns poucos bom jogadores, ele parecia não querer muitas estrelas no time, e quando bateu a sorte madrasta, no jogo com a Holanda, em hora difícil diante da expulsão (merecida) de um jogador, ele olhou para o banco e não havia ninguém (que estivesse à altura).

                   Por enquanto, as coisas avançam nos conformes na atual seleção, que tem vencido todos os confrontos (alguns importantes, como Argentina e França).  Mas Dunga continua a prestigiar a base que foi derrotada (e vexaminosamente) pela Alemanha.  Tem chamado um que outro valor, mas a minha pergunta é por que não  Ganso, que traz um aporte que não apareceu na Copa do Brasil (era grande a dificuldade da seleção municiar o ataque).

                   Refiro-me a um jogador de meio-campo, que faça a ligação com o ataque. Todos sabemos que Dunga não gosta de grandes craques. Talvez porque não tenha sido um, e mesmo assim participou do tetra. Mas ali, não se esqueçam, havia Romário, Bebeto e Taffarel.

                    Se Zagalo, por exemplo, se tivesse guiado pelo realismo e não por questões pessoais, Romário teria sido mantido na seleção e talvez a final com a França terminasse de outro modo.

                    Se a Copa no Brasil mostrou alguma coisa, é que os nossos craques escassearam. Ficou impossível ganhá-la apenas com um grande jogador. Aliás, desde o começo, com a pífia apresentação perante a Croácia, a seleção já mostrara que seria difícil levar o caneco, com scratchs como o da Alemanha e o da Holanda, justamente os dois que nos venceram.

                    Mas tudo continua na mesma. A CBD continua a cuidar de forma feudal  de nosso futebol.  O Sete a Um não aconteceu por acaso. A Alemanha já mostrara com Portugal como atua se o time adversário não dá atenção especial à defesa.

                    A modestíssima Argélia – e não é a primeira vez que a isso me refiro – deu uma senhora surpresa no bicho-papão teutônico em Porto Alegre. Com jogadores limitados, mas esforçados e integrados em ótimo esquema tático, neutralizaram durante os dois tempos regulamentares o esquadrão germânico. Além disso, com plano de ataques pelas pontas, levaram por vezes perigo à fortaleza alemã.

                    E o técnico da seleção argelina tinha uma equipe incomparavelmente inferior aos adversários, mas que cumpria, com lealdade na cancha, os ditames do seu orientador, e se houve de tal forma, que foi abraçada pela torcida gaúcha, tão surpresa quanto eu, da maneira com que os argelinos – que não são exatamente grandes azes – conseguiram controlar o bicho-papão da RFA, que ao entrar em campo o fez com a arrogância de quem espera impor goleada ao time adversário.

                    A lição que nos deu a seleção argelina foi simples, Para enfrentar a Alemanha, se precisa ter uma idéia  na cabeça, e executá-la com firmeza. A lição de Glauber vale para o futebol.

                    O futebol brasileiro continua a exportar muitos jogadores e a ornar o Bayern, o Barcelona e os times ingleses e franceses, entre outros, com bons elementos. Mas a seleção não é mais aquela de 1970, sem falar na de 1958.  Neymar era seu único grande valor  e, quando se depende de um só, fica mais fácil para as botinadas dos adversários desleais, como essa última Copa quase mostrou (porque com a Colômbia, por exemplo, a boçal deslealdade com Neymar não seria determinante para o resultado).

                    Com o desastre de Belo Horizonte – e o fato de havermos sofrido a maior goleada da Copa do Brasil  -  tudo continua como dantes no quartel de Abrantes.

                    Longe, muito longe da necessidade de que se analise e se faça um exame de fundo na situação, continuamos com a CBF ancien régime[1]. O Senhor Marco Polo del Nero sucede a José Maria Marin, que tinha substituído Ricardo Teixeira, o ex-genro de Jean Marie Havelange. Os paredros do futebol parecem configurar  uma aristocracia que nada ou muito pouco tem a ver com o realidade e os desafios do Brasil como potência  nos campeonatos mundiais. Não é por acaso decerto que somos o único país que esteve presente em todos os mundiais, e que por outro lado fornece jogadores a diversas seleções que atuam nas Copas, inclusive com trocas de nacionalidade à última hora.

                     O esquema Felipão foi construído em base de um sonho – i.e., a repetição de 2002, quando vencemos a Alemanha na Final.  Mas apesar de não trazermos Romário, tínhamos Rivaldo e Ronaldo, que, no ataque, bastaram para o penta.

                     Agora, é estranhável que depois do desastre de Belo Horizonte, continuemos o esquema anterior, como se a goleada humilhante de sete a um (e os alemães, segundo declararam muito depois, tiveram pena do time canarinho e, por isso, não forçaram mais para que a humilhação não passasse para o achincalhe) fosse um simples acidente de percurso.

                      É notório que há um ambiente circense a rodear a seleção. Os comentários são de cortesão. Entramos em campo sem esquema defensivo para valer. Felipão mostrou estar superado pela catástrofe. Enquanto a pequena Argélia perderia da pujante Alemanha por 2x1 (todos os gols feitos na prorrogação), a nossa defesa ruíu por inteiro e em cinco minutos, quatro gols foram marcados, tornando a partida praticamente um jogo amistoso, eis que tudo já estava decidido.

                      Felipão se mostrou totalmente perdido – porque a velha máxima do pugilismo vale também para o soccer: só se vai  a nocaute por um soco que não se sabe de onde saíu – e nada fez para remontar os pedaços que restavam de o que era apresentado como o favorito para a Copa...

                      Se a desmoralização do técnico e da seleção, no próprio campo nacional, pelo maior escore de toda a Copa, não é reputada como bastante para a convocação dos estados-gerais do futebol, com uma discussão para valer sobre o quê fazer, e ao contrário, se opta silenciosamente por mais do mesmo, o que se pode esperar da próxima Copa?...

 
( Fontes: VEJA; O Globo, Rede Globo: Folha de S. Paulo )



[1] Velho regime. A comparação implícita com a Revolução Francesa não é decerto por acaso.

sábado, 25 de abril de 2015

O Genocídio dos Armênios

                                     

       Há datas que se festejam e outras que se assinalam. Em 1915, o Império Otomano iniciou, segundo muitos, sistemático trucidamento da população armênia. Pensando no exemplo moderno de genocídio – a matança da etnia tutsi pela liderança hutu em Ruanda – o trauma dessa loucura pode ser vivido nos seus múltiplos exemplos de mortífera insânia, por mais difícil que se imaginar possa este domínio de èÜíáôïò  sobre æùÞ[1] - em que tal fenômeno explode de forma desorganizada, porém geral, o ódio da etnia hutu voltando-se contra os tutsi, supostamente favorecidos. Esse massacre contemporâneo, manchado por cumplicidades e uma série de omissões de autoridades internacionais e países, tem sido objeto de estudos e esforços no sentido de colocar defesas na consciência governamental das eventuais fraquezas que conduziram à desgraça coletiva.

      Por sua vez, o genocídio armênio continua sendo contestado pelo negativismo do atual Estado turco, que se recusa a admitir-lhe a ocorrência. O então Império Otomano estava na fase derradeira de seu processo tricentenário de dissolução. Depois de derrubar o Império Bizantino, na data que marca o fim da Idade Média, e o início da época moderna, com a queda de Constantinopla em 1453, sob o último dos Paleologos, os turcos  se tornaram  a ameaça para o Ocidente, ameaça esta que a batalha naval de Lepanto, de que até Miguel de Cervantes[2] participara, marcaria o começo do fim de sua expansão.

       Além da própria existência, os armênios também sofreram o confisco de suas terras. As tentativas modernas de reavê-las se chocam contra o muro dos cartórios turcos.

       Até mesmo a argumentação turca contra o genocídio do milhão e meio de armênios claudica no número atribuído pelo governo de Ancara. Ao invés desse milhão e meio, o número de armênios mortos seria apenas de trezentos mil. Ora, reconhecer um quinto do total de vítimas nessa ordem de grandeza parece, para bom entendedor, a admissão de grande mortandade que não chegaria, entretanto, a atingir o coeficiente de genocídio...

         Ainda no século XX, no começo dos anos oitenta, uma facção armênia apelou para o terrorismo seletivo, atingindo a representantes do Estado turco, em especial diplomatas. Alguns deles foram assassinados, outros feridos gravemente, gerando tensão nas representações turcas.

          Na época, as recepções que promoviam – as embaixadas costumam realizar coquetéis nas suas datas nacionais – tinham uma característica adicional. Poderia haver atentados, e por isso o comparecimento pecava por muitas – e compreensivas – ausências. Houve até chefe de missão que foi contrariado com altaneria por secretário a quem buscara impingir como seu representante em evento programado para a missão turca...
          Anedotas à parte, existia, no entanto, real ameaça aos embaixadores e secretários da Turquia no estrangeiro. Era o longo braço dos sacrificados pelo genocídio.
         
          Entrementes, cresce, com o decurso dos anos, a conscientização mundial no que tange à aceitação oficial pelos países deste magnicídio.  Muitos pormenores sombrios do sacrifício imposto pela histeria do povo turco que se sentia embarcado na nave errada na Grande Guerra estão vindo à tona, inclusive as centenas de milhares de armênios que morreram de fome e sede, forçados a marcharem no deserto.

           Se a população turca atual   ainda não acredita na veracidade do genocídio dos armênios (91% negam), o processo internacional se tem acelerado nos últimos anos, e a política intimidatória dos regimes turcos, e em especial de Recip Erdogan já não mais está impedindo países de peso no cenário internacional de aceitarem a realidade do genocídio. Com Obama na presidência, Washington continuará a seguir a linha turca, mas há numerosos outros países de relevo, como a França e a Alemanha a reconhecerem agora o genocídio.

           Nesse contexto, o Papa Francisco, que não se tem negado tantas vezes a cortar o nó Górdio da contemporização, recentemente reconheceu também o fato histórico  como “o primeiro genocídio do século vinte”, o que levou o irado Recip Erdogan a chamar o respectivo embaixador junto à Santa Sé.

           Mas os países que, como carneiros, continuam a seguir a linha de Âncara vão diminuindo, porque uma grande mentira como essa, mesmo se concerne a pequeno país, não pode sustentar-se a longo prazo, por mais ameaças que faça a Turquia.

           Não é difícil de prever que o Itamaraty, com a baixíssima prioridade que a regente Dilma Rousseff ora lhe concede, continuará na sua lamentável posição na rabeira dos Estados que continuem obedecendo os ditames de Erdogan. Como em muitos outros aspectos de resto, com a dílmica mediocridade caíndo de rijo sobre a antiga e respeitada diplomacia brasileira.

 

( Fonte: CNN )




[1] Morte sobre a Vida
[2] O autor da obra prima da literatura espanhola, D. Quijote de la Mancha, aí não teria sorte. Foi preso por um aliado dos turcos, e acabou como refém em Argel, la blanche, de onde muito custou a sair para  glória sua e da Humanidade.

O Sal da Terra

                                            

          O filme de Wim Wenders e Juliano Ribeiro Salgado deve ser visto por muitos e não apenas o público de cineclubes. Porque não é só uma lição de e para a vida, mas também de um estranho otimismo, que nasce de uma experiência existencial e do testemunho do maior fotógrafo de nossos dias.

          Sebastião Salgado pode não ter sido julgado por merecer o Oscar, por esse magnífico documentário do alemão Wim Wenders e de seu filho, Juliano Ribeiro Salgado. Que importância se deve dar à famosa Academia que nunca deu um Oscar ao maior gênio da cinematografia, Charlie Chaplin. Que o leitor me perdoe o falso erro, pois não considero como Oscars verdadeiros aqueles dados por conjunto de obra, que não passam ou de prêmios de consolação ou de arrependimentos tardios.

          Como Chaplin, este pela veia cômica, e Salgado, pelo empenho humano e ecológico, terão sido julgados demasiado próximos do povo e, portanto, da esquerda, para merecerem honrarias de uma Academia, que confunde empenho e denúncia, com perigosos desvios de esquerda.

          Mas deixemos de lado tais considerações episódicas, que apenas incidentalmente acenam para o que significam Sebastião Salgado e sua obra.

          Se a sua fotografia é um orgulho do Brasil, ela é também mundial, por refletir a dedicação de vida de Salgado e de sua esposa e colaboradora, Lélia Ribeiro Salgado, ao nosso planeta. O seu gosto pelo Povo surge quando ele se projeta e na verdade explode para o mundo com a sua vivência em Serra Pelada. Ao contrário do formigueiro humano que lá estava, ele não se interessava em ouro, naquele pó e nas suas pepitas em que aquele conjunto da sociedade brasileira – pois todos para lá acorreram, e não só a gente pobre e miserável – mas antes no seu efeito sobre aquele macro microcosmo do povão, as suas regras simples, a vida dura,  a promessa da riqueza, com os seus enganos, a formigante metáfora de uma sociedade que almeja o muito, enquanto se agarra no espaço escorregadio daquelas veias abertas para serem explotadas por todos e sobretudo pelos miseráveis. Ali, naquele cenário construído e escavado pelo homem, nasceria a fotografia de Sebastião Salgado.

         Além da dos homens-formiga, além da dura faina que não tem outro capataz que a ânsia de melhor vida, o preto-branco de Salgado, resgatado sem firulas, e com o risco partilhado com aqueles mineiros do ar-livre, se propunha levar para o mundo além da paradigmática Serra Pelada, um espaço em que se refletem imagens daquele brutal dia-a-dia, mas não só dele, senão de um especial relicário, com indizível riqueza de metáforas prodigadas por visões quase austeras na sua paradigmática. Ali revemos o quadro emblemático do policial armado e acuado por um homem do povo, que com a simplicidade dos fortes lhe empunha a arma, ao mesmo que o traz para a realidade do respeito devido à gente simples, imposto pelo denodo que nasce da coragem e da consciência do que lhe é devido.

          Este filme da vida e obra de Sebastião Salgado e de sua esposa Juliana deveria ser exposto em muitas salas, não somente por mostrar-nos da arte de um dos maiores fotógrafos sem limitações geográficas, mas também por traçar a trajetória simples e, sem embargo, linear desse homem que se afastou do Brasil por causa da ditadura militar, e voltou às Minas Gerais, com torrencial lição de vida, herdada não só da figura paterna, mas da experiência do périplo pelo sal da terra, compartilhando muitas vezes por empenho humano e sem oportunismo midiático a existência e em especial as inenarráveis misérias visitadas sobre  a gente de muitas dessas fotos.

          A fotografia de Sebastião Salgado é telúrica, está impregnada da natureza virgem e não tão virgem, quando desfeita pelo bicho homem, através de seus inúmeros conflitos com que este último não só atazana o próprio semelhante, mas o que é muito pior, o rebaixa a condições infra-humanas.

          Assistindo ao documentário, o espectador é levado, quer queira, quer não, a contemplar o duro espaço palmilhado por Sebastião. Ele se sente chamado para ver e, sobretudo, denunciar a miséria, a inanição, o ódio racial e tribal, e ele dá o seu testemunho com a intenção de advertir e se possível contra-arrestar essa corrida insana que o mundo compartimenta por vezes em instantâneos isolados de trêmulas e macilentas criaturas à beira da inanição e da morte, e que espoucam no Sahel, na África Oriental e Ocidental, por toda a parte em que o mal investe contra os desprotegidos  da Terra.

          A lente de Salgado deseja mostrar a vida, e por vezes se descobre constrangida a exibir a sua famélica, esquelética antítese na agonia de fome criada por outrem, cujos fins mergulham no poço escuro de muitos antis, que resumem a boçalidade e a selvageria que, muita vez, distingue o bicho-homem dos demais animais.

          A fotografia de Sebastião Salgado, diria que é o subtexto desse magnífico documentário. Ela será sempre honesta e aberta, e assim convive com as brincadeiras das orcas e dos ursos brancos no norte da Rússia, mas também se apresenta como testemunha das maldades do onipresente bicho-homem, espalhadas pelos continentes que a arte do grande fotógrafo visita. Se ele não trepida em vivenciar o alarma, e a necessidade de contra-arrestá-lo,  quer ser também mensagem de esperança ecológica, como tão bem o demonstra no modo aparentemente simples de trazer o verde de volta. Na perene imagem do filho que torna ao espaço da fazenda paterna, e que o desmatamento impiedoso transformara em terra sáfara, ele agora documenta renascer na singela maravilha do replantio e da criação fundada na paciência do dia a dia.

            Por isso, não posso terminar esse esboço da obra gigantesca de compatrício nosso que nos honra, não só pela arte, mas também pelo respectivo exemplo e o de sua família.

            Em mundo de cinismo e devastação, a figura e a obra de Sebastião Salgado são para toda a boa gente, exemplo de arte posta a serviço da vida.

            Assistam O Sal da Terra. Nele não encontrarão ficção e sim a realidade contemplada com a Arte do respectivo instrumento de trabalho.  E que exemplo nos prodiga de caminhada em testemunho e a serviço da Vida!