quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

O que vale o Minsk 2 ?

                         
 
         A história registra apenas um acordo de Munique, o qual igualmente passou como  tentativa extrema de preservar a paz, mesmo que à custa da covarde virtual entrega de um pequeno país (a Tchecoslováquia que perdia a região dos sudetos), como se a paz com Hitler pudesse ser construída com esse tipo de traição de aliados.

         Em breve, Adolf Hitler colocaria novas exigências, o que marcaria na História como apaziguadores o Primeiro Ministro Neville Chamberlain[1], do Reino Unido, e o presidente do Conselho francês, Édouard Daladier[2].

         A primeira pergunta que a Chanceler Angela Merkel e o Presidente François Hollande deveriam ter feito é se um segundo acordo de Minsk lhes pareceria sério e implementável, se o primeiro acordo, arrecém concluído em setembro, falhou miseravelmente.

        Além disso, a Merkel, em maior grau, e o seu aliado, em menor, só mesmo armada de um panglossiano[3] otimismo, pode alimentar esperanças de que o Minsk 2 venha a ter êxito, quando o primeiro malogrou vexaminosamente.

              Se as fotos dizem algo, a publicada em O Globo mostra o solícito ditador Alexander Lukashenko, da Bielo-Rússia[4] indicando a direção para o Presidente de todas as Rússias (com as bochechas um tanto intumescidas – talvez recente aplicação de botox) e a hesitante dupla Merkel e Hollande, que contemplam o mais alto do grupo, um tanto isolado à direita, na pessoa de Petro Poroshenko, o presidente da Ucrânia, que é o atual objeto da cobiça de gospodin Vladimir Putin.

      
               A Merkel refuga o aporte das armas e prefere a diplomacia. O Ocidente tem até agora evitado o envio de armas letais para o exército ucraniano. Se um dos lados – que não é o agressor – se autolimita, o outro – que é o causador do problema – naturalmente estimulará a diplomacia, que, como sói acontecer em tais casos, funcionará como um conveniente biombo para que a Rússia continue a desrespeitar a soberania da Ucrânia, invadindo-lhe as fronteiras com as forças necessárias para tornar desigual a luta entre rebeldes e as forças armadas da Ucrânia.

          
                A credibilidade do Minsk 2 é ainda mais baixa do que o primeiro acordo de cessar-fogo de Minsk, firmado em setembro de 2014. Do outro lado do Atlântico, Barack Obama já reconhece a possibilidade de enviar a Kiev armas letais. No entanto, é forçoso ter presente que mesmo quando dispunha de maioria no Senado (hoje o GOP é maioria tanto na Alta quanto na Câmara Baixa – e nesta deverá sê-lo até o próximo recenseamento criar condições para equalizar-se o jogo nos deputados, que o famoso shellacking (tunda) de 2010  desequilibrara em favor dos republicanos) nem sempre se deva escrever o que o 57º presidente promete.

 

                O comportamento de Vladimir Putin só deixa dúvidas para quem se dispuser a dar-lhe não a segunda, mas a terceira ou a quarta oportunidade de emendar-se. Por enquanto as sanções aplicadas pelo Ocidente (leiam-se Estados Unidos e União Européia) atuam mais como incômodos contornáveis, do que pedras no meio do caminho.

  
                E o senhor do Kremlin dispõe da vantagem considerável de não enjeitar nenhum meio ou instrumento – como as seguidas invasões com ‘contingentes de voluntários’ nas porosas fronteiras da Ucrânia oriental, para reforçar o ‘exército rebelde’ em toda a ocasião em que as forças ucranianas (que defendem o próprio território) ameacem levar vantagem.

 
                Por isso, o novo ‘acordo de Minsk’ começará a fazer água quando a Ucrânia reclamar o respectivo direito de ter de volta as terras que perdeu com as ofensivas rebeldes deste começo de 2015. Os batalhadores pró-Rússia já teriam alargado o seu território em cerca de 320 km2 .

 
                Com a mãozinha das armas e eventuais reforços pontuais do exército russo, os rebeldes de Donetsk conquistaram o que resta do aeroporto dessa cidade, e se empenham na conquista de Debaltseve – que é importante entroncamento ferroviário, além de ser a última porção (pocket) de território ao norte de Donetsk.

 
                O que os ditos ‘rebeldes’ de Donetsk – com o aporte pontual do velho urso do Kremlin – objetivam conquistar é uma faixa de território ucraniano que abra o contato com outra terra também arrancada ( em abril último) de Kiev, vale dizer a Crimeia. O que o bom e cordato Putin deseja é apenas uma faixa razoável de terras orientais da Ucrânia, que lhe abram, com ramais ferroviários, e uma cidade como Donetsk, com as suas usinas e minas, o acesso fácil à península da Crimeia (sem a necessidade do incômodo acesso atual pelo mar de Azov...)

 
                 Como o Führer Adolf Hitler (e também o teatral  Duce Benito Mussolini, a quem imita de bom grado), o que o Presidente Vladimir Vladimirovich Putin deseja apenas é mais um pedaço da enorme Ucrânia. Esta semelha ser o adversário ideal, não só porque o seu exército não está bem armado, mas também porque Kiev pulula em espiões do FSB[5], que revelam para Moscou todo o programa das ações militares de suas forças no Leste.

 
                 A pobre Ucrânia mereceria melhor sorte. A esse propósito, gostaria de estar errado, e que, para espanto geral, Putin resolva cumprir o acordo que acaba de assinar em Minsk.

 
                  No entanto, a velha diplomacia, a par de uma certa experiência, me sopra o contrário. A Chanceler Merkel verá o quanto vale a própria assinatura no agora reiterado cessar-fogo de Minsk.

 

 

     ( Fontes: Dicionário Enciclopédia Delta-Larousse, The New York Times, O Globo )




[1] Neville Chamberlain (1869-1940).
[2] Édouard Daladier (1884-1970).
[3] O Dr. Pangloss, personagem do ‘Candide’ de Voltaire (sec. XVIII), tornou-se o paradigma do otimismo extremo.
[4] Alexander Lukashenko, presidente da Bielo-Rússia (desde 1994).
[5] O FSB veio substituir o KGB na Federação Russa.

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