A
despeito da má-fé de gospodin Vladimir
Vladimirovich Putin, Presidente de todas as Rússias, e de alguns
enclaves ao longo de suas fronteiras[1], a
diplomacia dos Estados Unidos, assim como a Alemanha e a França se empenham em
persuadi-lo no sentido de restabelecer o cessar-fogo assinado em Minsk, na
Bielorrússia, em setembro de 2014.
É difícil
determinar que argumentos trazem o Secretário de Estado John Kerry, assim como os dois líderes de
Alemanha e França, a Chanceler Angela Merkel e o Presidente François
Hollande. Merkel e Hollande,
depois de encontro de cinco horas com o Presidente
Petro
Poroshenko, seguem para Moscou, onde discutirão meios de restabelecer a
paz com o Senhor do Kremlin.
A exemplo de
seus predecessores Adolf Hitler e Benito
Mussolini, a ‘paz’ de Putin costuma ter curta duração, e é apenas
instrumento para ganhar tempo na estação invernal, e partir para novos ganhos
na primavera.
A guerra civil
entre os ‘separatistas’ da Ucrânia oriental e o governo de Kiev é luta desigual
e traiçoeira. Já matou mais de cinco mil pessoas no leste ucraniano, além de
deslocar centenas de milhares desde o ano passado.
Anunciado com
o rapto da Criméia – que o Brasil, para vergonha de sua bicentenária
diplomacia, reconheceu – esse conflito, fabricado na Rússia, avança aos trancos
e barrancos, sob o bastão putinista. O objetivo é tosco, mas com a debilidade
das forças ucranianas, não há defesas nas fronteiras a leste para a travessia das
tropas de ‘voluntários russos’ assim como para as milícias dos ‘rebeldes
separatistas orientais’ – que são armadas, financiadas e dirigidas por Moscou.
A estratégia
pode ser tosca, mas vai dilacerando as antigas províncias orientais da Ucrânia.
A cada avanço, sucedem acenos de paz, incentivados por quem, à distância, puxa
os cordéis seja dos ‘separatistas’, seja dos amigos de Moscou. E a tática não
muda: dos ‘progressos’ da véspera, a trégua serve apenas para preparar a seguinte
ofensiva.
Depois de
Minsk, os separatistas retomaram os ataques (obviamente sob direção russa) e se
apossaram de mais trezentos km quadrados no leste, inclusive da área do antigo aeroporto
de Donetsk. Ameaçam também Debaltseve, pequena cidade em estratégico entroncamento
ferroviário.
Nesta nova ‘ofensiva’
dos chamados ‘rebeldes separatistas’ (na verdade, quintas-colunas de Moscou) a
característica dos embates não muda: se a tropa de Kiev se avantaja e ameaça as
posições dos ‘rebeldes’, eis que, pelas porosas fronteiras orientais, adentram
os ‘voluntários’ russos, para reforçar, com batalhões e armamentos pesados, as ameaçadas
linhas dos separatistas.
Mais uma vez,
diante da má-fé de gospodin Putin,
Washington considera da oportunidade de repassar às forças legalistas armas
letais, que as habilitem a resistir com maior denodo às regulares investidas
russas. Trata-se de mísseis antitanque, obuses, radares de campanha, ‘drones’ de reconhecimento, e outras
armas suscetíveis de reequilibrar os combates, e convencer Moscou da
oportunidade do cessar-fogo, com a retirada de armas pesadas e tropas, assim
como respeitar a linha das fronteiras internacionais da Ucrânia.
Dos
obstáculos a serem vencidos se anotam os frouxos controles de Kiev sobre as
províncias do Leste, a longa presença de Moscou nas suas relações com Kiev, e a
existência de fornido círculo de espionagem russa na capital ucraniana.
Corroborou
velhas suspeitas quanto à seriedade da implantação da rede inimiga a recente
prisão do Tenente-Coronel Mykhailo Chornobai. Este oficial infiltrado dirigia círculo de
espionagem na capital federal, e repassava segredos militares para agente da
chamada República Popular de Donetzk,
inclusive a localização de regimentos de voluntários. Com tais informações, as
forças pró-Rússia apuravam a respectiva pontaria para alvejar os destacamentos
ucranianos. Para que se tenha idéia da extensão do número de infiltrados nas
forças legalistas, cerca de trezentas pessoas já foram detidas desde o início dessa
guerra não-declarada. As suspicácias de traição envolvem inclusive o
Estado-Maior em Kiev.
Nesse
contexto, há muitas suspeitas sobre a
lealdade do Alto-Comando Militar ucraniano.
Segundo Semyon Semenchenko, ‘é difícil determinar aonde termina o FSB[2] e
aonde começa a nossa rede militar’. Assim, antes de ser ferido nos cerrados
combates em Debaltseve, ele
recomendara, numa visita a Washington, que a ajuda militar fosse mandada
diretamente para o front, contornando
o estado-maior em Kiev.
Se as
coisas chegaram a tal ponto, o melhor seria implementar uma nova estrutura militar,
expurgada de elementos sob suspeita de conluio com Moscou. O parecer do
analista militar Igor Koziy vai neste
sentido: ‘Devemos acaso mudar a estrutura de nossas forças armadas? Se à primeira vista parece idéia maluca de
criar um novo e paralelo estado-maior, por outro lado, se nos dermos conta de o
que está ocorrendo no edifício (onde está o comando), você pode até pensar que
é a decisão correta.’
Enquanto
a Ucrânia não dispuser de uma força suscetível de impedir os avanços dos
rebeldes separatistas com apoio russo, essas reuniões com Vladimir Putin de
líderes ocidentais não farão o senhor do Kremlin desistir de seu plano
pré-estabelecido, que é criar acessos para a Criméia, e uma base mais sólida no
Leste ucraniano, partindo da chamada República de Donetzk, cujos precedentes
irredentistas chegam até a derrocada do tzarismo, ao cabo da Grande Guerra
(l914-1918).
Não
obstante os óbices, que são numerosos ( sanções de Washington, derrocada na
cotação do petróleo, esfriamento de relações com a U.E.), até o presente Vladimir Putin não cede diante de Barack
Obama, assim como faz ouvidos de mercador aos reclamos da Chanceler Angela
Merkel. Tampouco o demove a maior movimentação da OTAN, assim como o desgaste
para com os inquietos vizinhos da franja ocidental (países bálticos, Polônia,
entre outros).
Como com os
seus antecessores – que dormem, escarmentados, o fundo sono de Totônio Rodrigues – a diplomacia só terá
credibilidade se conjugada com medidas que tornem realmente pouco ou nada
rentável o aventureirismo militar de Vladimir
Putin.
( Fontes: The New York Times; Profundamente, poema de Manuel
Bandeira )
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