Volto a uma consideração a que
já me referi. Lamento que o esforço do Presidente Petro Poroshenko –
notadamente a sua participação na segunda, chamêmo-la assim, conferência de Minsk – ora se esteja
esboroando, com rapidez ainda maior do que a prevista.
O esforço
europeu de Angela Merkel e François Hollande não logrou criar nenhuma base
estável para a cessação temporária da
guerra que é movida por Moscou contra a Ucrânia.
Confiar
em que Vladimir V. Putin respeite qualquer consideração ética – se ela
se atravessar no próprio caminho – é entregar-se nesciamente a desenlace ainda
mais negativo e ruinoso da situação objetiva que motivara a louca esperança.
Por isso, os líderes do Ocidente – e os eventuais democratas russos – que nele
confiaram ou já pagaram caro, ou sofreram amargos dissabores.
Pesa-me
repetir frase que não é minha, mas que semelha apropriada a quem participou no
que gospodin Pudin referiu como uma
das noites não tão agradáveis de sua vida. Quem desconhece a história, está
condenado a repeti-la, seja em tragédia, seja até mesmo em farsa.
Pois o senhor do Kremlin não se pejou de
valer-se da escolha errada dos que defendiam a causa da Ucrânia, como se
estivesse fazendo algum sacrifício em comparecer a Minsk, capital do ditador Alexander Lukashenko, que enquanto os ventos lhe forem favoráveis integrará
os adeptos de Vladimir Vladimirovich
e o apoiará com visível denodo.
Assim como os soldadinhos verdes que se
apossaram da indefesa Criméia, e que lançaram Putin no traiçoeiro caminho dos
fora-da-lei – as primeiras sanções americanas contra os cupinchas e asseclas do
presidente russo datam de então – rasgaram quaisquer dúvidas sobre o próprio
respeito à lei internacional e aos compromissos assumidos[i],
ir ao seu encontro confiando em diplomacia dissociada de o que está sucedendo
nos prélios armados é condenar-se a cruéis decepções.
O
exército da Ucrânia sem armas bastantes e adequadas para enfrentar as forças do
exército russo e até de seus prepostos, os ditos rebeldes separatistas – que
até recebem equipamento bastante para
arrostar os batalhões ucranianos, e o que é mais grave leva-los de vencida,
como os combates em torno de Donetsk e Debaltseve o tem demonstrado à saciedade
– tem sido, malgrado a bravura de seus soldados, uma presa fácil para os agressores russos e milicianos das ‘repúblicas separatistas de
Donetsk e Luhansk’.
Sem
bater pestana, Vladimir Putin aludiu aos interesses dessas ‘repúblicas’, que
não passam de joguetes e criaturas adrede manipuladas, para arrancar, contra
todas as normas do direito internacional público, do solo ucraniano o espaço
necessário para assegurar a implantação de outras Ossetiaa e Abkhazias do Sul,
ou até mesmo, com desenvoltura de conquistador, a anexação pura e simples do
extremo oriental da Ucrânia.
O
presidente russo traz de volta – e de forma decerto irresponsável – uma
atmosfera internacional que mal pressagia para o século XXI. Se ele antes
imitava o Benito Mussolini com o torso nu da ‘Bataglia del grano’ e no cavalgar
atlético de belos corcéis, agora as coisas ficam mais sérias ao representar
como se fora o Führer Adolf Hitler a encurralar líderes de pequenos países
balcânicos.
A hübris é má conselheira e a guerra
continuada para um país que hoje é poder regional pode ser não só portadora de
más notícias, mas também de distúrbios populares e até contestações mais
insidiosas contra o atual todo-poderoso Vladimir Putin. Os conflitos são criaturas daninhas que criam
a dissensão, a inflação, e a descrença nos poderes constituídos, por só
trazerem corrupção e carestia.
Por
sua vez, a Ucrânia e seus líderes tem largo e ínvio caminho pela frente. Ela é
demasiado extensa para ser tratada como a Geórgia e a Moldova. As peripécias e
até os dissabores podem trazer para Kiev uma postura mais firme, com o
afastamento da endêmica corrupção e maior afirmação nacional, com a limpeza do Estado
Maior, e a formação de exército afinado com a independência da Ucrânia,
afastados os elementos do FSB (ex-KGB) e os eventuais agentes duplos, que hoje pululam na capital.
Quanto a Donetsk e similares, nas lutas da revolução russa irrompidas
com a queda do tzarismo, houve repúblicas separatistas. Foram fenômenos
efêmeros, que refletiam a instável atmosfera da época. Mas, como a tantos outros chefes, grandes e
pequenos, o tempo – esse incoerente senhor da História - não é que os acabaria
levando?
( Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo, The New York
Times, e, de forma subsidiária, Putin’s
Kleptocracy, de Karen Dawisha ).
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