segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

A Ucrânia e as Armas letais

        

          Não estamos em Bizâncio, mas a parecença é forte por demais!  O governo de Kiev se debate com falta de fundos, arrecém perdeu a Crimeia – que teve até o dílmico Brasil, com lenço no nariz, a aceitar na vergonha da diplomacia a ignorância da fundação do direito das gentes que é o pacta sunt servanda – e o Ocidente ainda discute se deve ou não entregar armas letais à Ucrânia !

          Gospodin Vladimir V. Putin gerencia economia quebrada. Fundada até há pouco nos miríficos ganhos do petróleo, vê o ouro negro despencar, com o preço do barril abaixo do terço de o que antes valia, enquanto o valor do rublo também ameaça ir pelo ralo...

          Nesse grande país, herdeiro da defunta URSS, hoje apodado por Barack Obama como potência regional, o ex-funcionário do KGB – diante da invasão da sucursal em Dresden, cujo granítico gesto chorou nos plúmbeos (para eles) tempos da implosão do reino de Gorbachev – ora não costuma perder tempo com discussões filosóficas, à frente da Federação Russa.

          Putin não é Gengis Khan, mas transforma o seu estado em monstro voraz, e para ele, pelo visto, o direito internacional público não passa de superada construção acadêmica. Na anexação da Crimeia – realizada com os soldadinhos verdes e arremedo de referendo – a extrema facilidade da conquista, e a vergonhosa falta de reação, lhe terão subido à cabeça.

           No seu visor, estão agora terras da Ucrânia oriental. Elas se juntarão aos farrapos da Transnistria, Abkhazia e Ossétia do Sul, em estranho processo de engorda feito com a mutilação de plagas alheias.

           Por ora, em meio às promessas e planos de paz – bem segundo a cartilha dos ditadores que hoje imita – ele instrumentaliza os dissidentes e os chamados ‘rebeldes’ que multiplicam os fronts em torno das cidades que a Rùssia cobiça, como Donetszk, Luhansk e as localidades vizinhas da Crimeia, com vistas a proporcionar a integração plena da península da Crimeia no território da metrópole russa.

           Como carne de canhão, os rebeldes enfrentam o exército ucraniano – e por vezes, como no aeroporto de Donetsk, prescindem da ajuda russa. Em geral, no entanto, caberá aos ‘voluntários russos’ a abertura dos fronts para desbaratar o domínio de Kiev sobre as províncias do leste.  Se a resistência de Kiev estiver levando a melhor, acorre o reforço de Moscou, com sua profusão de armas, incluse obuses e artilharia pesada.

           Enquanto a soberania de Kiev se esgarça diante dos iterados ataques, Washington e o Ocidente se perguntam se cabe entregar armas letais às forças que defendem a incolumidade da velha Ucrânia... Como semelhança à tal santimônia, só mesmo a recusa de Paris e Londres, às vésperas da Segunda Guerra, a mandar reforços para o governo republicano de Madri, que sozinho lutava contra o franquismo apoiado por Hitler e Mussolini. A exemplo de Bizâncio, França e Inglaterra debatiam sobre a licitude de intervir na refrega, enquanto Berlin e Roma – como hoje o Kremlin de Vladimir Putin – se riam a bandeiras despregadas, e lá, no inferno espanhol, experimentavam toda sorte de arma letal...

 
 
( Fonte:  The New York Times )
 

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