Francamente,
a pergunta tem mais para o retórico, do que a realidade. As dúvidas quanto às
reais intenções do Presidente russo no que tange à Ucrânia – a quem parece não
perdoar haver escorraçado o seu fiel servidor Viktor Yanukovich pela revolução
da Praça Maidan – não se sustentam se nos dermos ao trabalho de singela análise
lógica.
É pacífica a
atitude do Kremlin quanto ao novo
governo de Kiev, com a eleição já no primeiro turno do presidente Petro
Poroshenko? Depois de sua operação de
conquista da Criméia, que pelo cinismo e audácia recordam as operações das
ditaduras do chamado Eixo no período de entre-guerras, Vladimir Vladimirovich
Putin tem perseguido com comovente constância dois escopos que para ele não são
conflitantes: confundir o Ocidente e o governo ucraniano com palavras de paz,
ditas pelos seus dóceis canais informativos, a par do propósito de
desestabilizar a área objeto de sua cobiça.
Talvez para alguém
ignorante da realidade na região, o falar em paz enquanto prepara a guerra,
implicaria em contradição. Na verdade, não o é.
Vejam
ilustres passageiros do bonde da história. Diante da aparente deterioração da
tentativa de desestabilizar – e possivelmente incorporar – a região oriental da
Ucrânia, com o avanço do exército ucraniano, e a lenta e gradual retomada da
área sob controle desse elemental político, que é o separatismo pró-Russia,
calam-se as melífluas palavras de paz e volta a movimentação bélica na
fronteira russa.
Se a carta
das milícias separatistas pró-Moscou não mais satisfaz ao escopo de gospodin
Putin, eis que engrossa o número de batalhões na fronteira – de dezenove mil
passam a 21 mil – com infantaria, blindados, artilharia e defesa anti-aérea a
poucos km da fronteira com a Ucrânia.
Esse súbito
flexionar de músculos militares não se limita, no entanto, a essa
arregimentação, de que o bom Vladimir vem cuidando. Cresce também o poder de
fogo, com o número de unidades de mísseis terra-ar de oito para catorze, além
de trinta baterias de artilharia.
Há um outro
aspecto que se encaixa em operações anteriores, como a atrevida ação da
conquista da península da Criméia. Pois não é que agora reaparecem as insígnias
que designam as unidades de benfazeja
operação de manutenção da paz? Vê-se, portanto, que, na prática, Vladimir Putin
é um admirador do mundo descrito por George Orwell[1] !
Assim, se
esta estranha concentração militar tem a ver com o malogro da opção n°1, isto é, intervir sob a capa de suposta
manutenção da paz, se o plano ‘A’ – o dos separatistas pró-Rússia – estiver
indo para o brejo.
Dessarte, se
além de Luhansk, e o setor mais a ocidente da área oriental, estiver
retornando ao controle ucraniano, entrariam em ação as brigadas russas para
reforçar o castelo de cartas hoje sob domínio das ditas milícias.
Os
combates se acirram no entorno de Donetsk e nos bolsões orientais.
Até o
presente, os Estados Unidos e a União Européia tem seguido estratégia de
dissuasão por meio de sanções pontuais – como no que tange à explotação do
Ártico – na tentativa de dissuadir o Presidente russo de levar adiante a sua
mal-camuflada agressão da Ucrânia.
Por fim,
a matéria do New York Times alude à possibilidade de que através de sua ação
militar o presidente Putin tenha o escopo de alcançar solução política.
Esta
pareceria ser a impressão do Presidente Barack Obama. Até o presente, no
entanto, os avanços da Federação Russa tem sido à custa do braço militar, como
nas pequenas repúblicas da Ossetia e da Abkazia do Sul, extraídas da Geórgia.
Depois
da anexação da Crimeia, acreditar em anódinas soluções políticas, ainda mais
quando até agora desenvolvidas com comovente apoio militar, é um caminho a ser
trilhado com muito cuidado, eis que os fatos têm costumado contradizer esses
pios e supostos propósitos do Presidente de todas as Rússias.
(Fontes:
The New York Times, O Globo)
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