terça-feira, 5 de agosto de 2014

Putin rasgará a máscara ?

                               

         Francamente, a pergunta tem mais para o retórico, do que a realidade. As dúvidas quanto às reais intenções do Presidente russo no que tange à Ucrânia – a quem parece não perdoar haver escorraçado o seu fiel servidor Viktor Yanukovich pela revolução da Praça Maidan – não se sustentam se nos dermos ao trabalho de singela análise lógica.

         É pacífica a atitude do Kremlin quanto ao novo governo de Kiev, com a eleição já no primeiro turno do presidente Petro Poroshenko?   Depois de sua operação de conquista da Criméia, que pelo cinismo e audácia recordam as operações das ditaduras do chamado Eixo no período de entre-guerras, Vladimir Vladimirovich Putin tem perseguido com comovente constância dois escopos que para ele não são conflitantes: confundir o Ocidente e o governo ucraniano com palavras de paz, ditas pelos seus dóceis canais informativos, a par do propósito de desestabilizar a área objeto de sua cobiça.

         Talvez para alguém ignorante da realidade na região, o falar em paz enquanto prepara a guerra, implicaria em contradição. Na verdade, não o é.

         Vejam ilustres passageiros do bonde da história. Diante da aparente deterioração da tentativa de desestabilizar – e possivelmente incorporar – a região oriental da Ucrânia, com o avanço do exército ucraniano, e a lenta e gradual retomada da área sob controle desse elemental político, que é o separatismo pró-Russia, calam-se as melífluas palavras de paz e volta a movimentação bélica na fronteira russa.

         Se a carta das milícias separatistas pró-Moscou não mais satisfaz ao escopo de gospodin Putin, eis que engrossa o número de batalhões na fronteira – de dezenove mil passam a 21 mil – com infantaria, blindados, artilharia e defesa anti-aérea a poucos km da fronteira com a Ucrânia.

         Esse súbito flexionar de músculos militares não se limita, no entanto, a essa arregimentação, de que o bom Vladimir vem cuidando. Cresce também o poder de fogo, com o número de unidades de mísseis terra-ar de oito para catorze, além de trinta baterias de artilharia.

         Há um outro aspecto que se encaixa em operações anteriores, como a atrevida ação da conquista da península da Criméia. Pois não é que agora reaparecem as insígnias que designam as unidades de benfazeja operação de manutenção da paz? Vê-se, portanto, que, na prática, Vladimir Putin é um admirador do mundo descrito por George Orwell[1] !

         Assim, se esta estranha concentração militar tem a ver com o malogro da opção n°1,  isto é, intervir sob a capa de suposta manutenção da paz, se o plano ‘A’ – o dos separatistas pró-Rússia – estiver indo para o brejo.

         Dessarte, se além de Luhansk, e o setor mais a ocidente da área oriental, estiver retornando ao controle ucraniano, entrariam em ação as brigadas russas para reforçar o castelo de cartas hoje sob domínio das ditas milícias.

               Os combates se acirram no entorno de Donetsk e nos bolsões orientais.

               Até o presente, os Estados Unidos e a União Européia tem seguido estratégia de dissuasão por meio de sanções pontuais – como no que tange à explotação do Ártico – na tentativa de dissuadir o Presidente russo de levar adiante a sua mal-camuflada agressão da Ucrânia.

               Por fim, a matéria do New York Times alude à possibilidade de que através de sua ação militar o presidente Putin tenha o escopo de alcançar solução política.

               Esta pareceria ser a impressão do Presidente Barack Obama. Até o presente, no entanto, os avanços da Federação Russa tem sido à custa do braço militar, como nas pequenas repúblicas da Ossetia e da Abkazia do Sul, extraídas da Geórgia.

               Depois da anexação da Crimeia, acreditar em anódinas soluções políticas, ainda mais quando até agora desenvolvidas com comovente apoio militar, é um caminho a ser trilhado com muito cuidado, eis que os fatos têm costumado contradizer esses pios e supostos propósitos do Presidente de todas as Rússias.

 

 

(Fontes:  The New York Times,  O  Globo)  



[1] George Orwell (1903-1950), escritor satírico inglês, autor de ‘1984’ e ‘Fazenda Animal’.

Nenhum comentário: