quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Feliz Ano Velho !

                                         

       Por vezes me pergunto se algum dia iremos superar o trauma (e o vezo) da cultura inflacionária.
       Não tenciono referir-me ao Plano Real e ao mega-esforço de varrer de Pindorama as deformações da carestia. Se pensávamos que se Lula teve o discernimento de considerar o Plano uma conquista de governo e não de partido, não nos entraria na cabeça que criatura sua, movida por confusas ambições desenvolvimentistas,  viesse pôr  a perigo uma política de Estado.

      A despeito de o que poderíamos chamar as vivandeiras da inflação – um punhado de economistas, saudosistas não se sabe de quê, e que ora gravitam nas aras do Palácio, encantados por descobrirem alguém que lhes dê atenção – existe no Brasil um perigo ainda maior do que a bem-fundada incompetência econômica de Dilma Rousseff.
     Será resquício da indexação financeira – essa praga pluridecenal – que nem os pais do Plano Real lograram erradicar.

      A cada ano novo – e os seus sôfregos idólatras já os empunham antes mesmo do pirotécnico ritual de Copacabana – ressurgem os filhos diletos do Dragão, com a sua ominosa sopa de letras dos índices.
      Nessa repetitiva luta entre Hércules e Anteu, quem perde sempre é o Povo Soberano, batido por sociedades de interesses, que, por trás da hipocrisia da hipercorreção de preços,  logram assegurar a velha meta da ganância ancestral. Que se evaporem as vitórias do herói que libertou Prometeu! Assim, como nos ensina Lampedusa, tudo fica na mesma, enquanto se mantém a epimetéica e infernal ordem das vantagens corporativas, em detrimento do interesse geral.

       No capítulo das irresponsabilidades do Poder público, a prefeitura do Rio de Janeiro, como se fora reflexo maquinal, faz aos taxistas uma barretada com o chapéu do povo. Não bastasse a ridícula e demagógica concessão de dona Dilma aos atuais detentores de franquias de taxista, que transformou em direito hereditário, agora a cada ano o Senhor Paes se apressa em salgar ainda mais a conta do usuário.
      Parece que os poderes não se resignam a dispensar o povo das tabelas de ‘correção’ de bandeirada. Como nada mudou, salvo o calendário, o carioca, depois de pagar por todo o dezembro em uma tabela dois que eterniza concessão demagógica de longínquo antecessor, se vê confrontado com outra munificência do Prefeito, que, para variar, financia a própria demagogia com o dinheiro do contribuinte.

      Mas os artificiais males do Ano Novo não param aí. Este blog noticiou nesta semana que os proprietários dos ônibus entraram com ação junto ao judiciário carioca para supostamente ressarcir-se dos alegados prejuízos que sofreram, quando o povo nas ruas forçou governador e prefeito a engolirem os anunciados aumentos nas passagens. Não sei como reagirão os juízes, que conhecerão da ação, e os desembargadores que dela se ocuparão em segunda instância. O município nada deve a esses senhores que controlam os consórcios de ônibus. Os aumentos do ano passado foram desfeitos pelas passeatas do passe-livre da Paulicéia. As recusas iniciais do prefeitos Haddad e Paes, caíram por terra, como despencou a popularidade de dona Dilma. Seria bom que os dois prefeitos, cujas ambições semelham desproporcionais às respectivas realizações, não se esqueçam do tropeço do ano passado, quando tiveram de aceitar carrancudos o que pretendiam rejeitar com soberba.

     O carioca bem sabe da qualidade desse transporte coletivo.  Na verdade, essa palavra em grifo já parece deboche. Além da deficiente manutenção, de sua falta para atender a demanda, o desconforto que se impõe ao usuário – ar condicionado não é conforto, mas necessidade nas temperaturas desse estado – tornou a sua utilização como um sacrifício permanente, agravado pelas enormes filas no transporte entre zonas norte e sul (condições de resto pioradas pelas obras no metrô).
     O povo, tanto carioca, quanto paulista, merece respeito efetivo, e não aquele pro-forma. Transporte público de qualidade, com condições de conforto, seria uma demonstração de espírito cívico e de atenção à cidadania.

     Não é favor. De nada adianta a publicidade enganosa, de que são useiros e vezeiros os poderes federal (V., por exemplo, os anúncios do SUS), estadual e municipal.

     Tampouco semelha aconselhável brincar com a paciência do Povo. Os alegres compadres de Brasília (e adjacências), como dizia Júlio Tavares (aliás Carlos Lacerda) que ponham as barbas de molho.

    

 

(Fonte subsidiária: O Globo)  

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