domingo, 5 de janeiro de 2014

Colcha de Retalhos B 1

                          

Chapa Campos – Marina

 
            Carece de muita frieza e algum desprendimento, a decisão de Marina Silva – que as prévias deverão confirmar ou não – de aceitar ser vice na chapa do PSB, encabeçada por Eduardo Campos.

          É poção amarga, mas que a sessão do Tribunal Superior Eleitoral – negando licença à Rede Sustentabilidade – por força de uma série de manobras, mas sobretudo a estranha recusa pelos cartórios do ABC paulista (reduto do PT, como se sabe) de reconhecer muitas das firmas de subscritores da dita Rede  tornou inevitável.

          Agora é conferir a evolução nas prévias. Se a candidatura do governador Campos decolar, tudo bem. Mas se o céu enfarruscar-se para esses lados, e Marina persistir a ser a única candidata (excluído José Serra) a forçar um eventual segundo turno para a Presidenta, serão de prever-se, no campo socialista, perturbações nada atmosféricas.   

 

Ecos da Primeira Guerra Mundial

 

            A Humanidade – e em especial a Europa – atravessava época de grande prosperidade. Nada como um conflito, portanto, e com as dimensões que o definiriam os contemporâneos como a Grande Guerra, para pôr tudo a perder, substituindo o congraçamento pelos ódios nacionais, as perspectivas de indefinido progresso pelas crises econômicas e a miséria do pós-guerra.
            A chamada Belle Époque  não era a mítica Cuccagna (terra da fartura), mas se caracterizava por abertura e tolerância recíproca. O que aconteceu com o Titanic em 1912, ao afundar na madrugada de 15 de abril, na maior catástrofe marítima da História (1517 pessoas afogadas) para alguns já pressagiava maus augúrios. Pensar no luxo e esplendor do transatlântico diante do gritante despreparo para um naufrágio (acidente que não pode ser esquecido no mar), é talvez uma metáfora para a fragilidade da sociedade de então, em um mundo de riquezas e até opulência, cercada por ameaças para as quais não estava preoparada.

            Semelha oportuno recordar que naquele período – assinalado por níveis de comércio e desenvolvimento que ficariam inatingíveis por muito tempo – sem falar de toda a burocracia do medo dos tempos atuais, que é imposta aos viajores, não existiam limitações para as viagens, além da precariedade das estradas. Pois os viajantes de então – que se serviam do trem e dos navios – não precisavam de passaporte!

            Estavam livres, portanto, da burocracia dos vistos e de todas as demais maçadas que o progresso subsequente lhes providenciaria.
          Quanto às causas da calamidade de l914-1918, não é aqui decerto o local para aprofundá-las. Para mim, a deposição branca do Príncipe Otto von Bismarck em 1890 pelo novel imperador Guilherme II foi o signo  precursor da desgraça vindoura. Premonitório o desenho da revista Punch, com o Chanceler descendo a escada da nave Alemanha, sob as vistas displicentes do jovem Imperador. O último Hohenzollern misturava a vaidade pessoal com a inepta soberba dos neófitos. Custou-lhe tempo para desfazer a tapeçaria de alianças que o unificador da Alemanha sob a Prússia tecera com arte e diplomacia.             

           Mas ao cabo, o Kaiser lá chegaria, enquanto prometia às suas tropas que estariam de volta ao lar germânico quando caísse a folhagem (daheim wenn das Laub fällt). Dessarte, a ambiguidade de Edward Grey, Secretário do Exterior de Sua Majestade Britânica, foi apenas umas das peças na engrenagem maldita. Engrenagem esta que Guilherme II, como aprendiz de feiticeiro, saberia desencadear para infortúnio de tantos e, sobretudo, do Século XX, que entraria nos decênios subsequentes na marcha batida da loucura, de que seria o principal causador um cabo austríaco...

 
As Olimpíadas de Inverno em Sochi

 
         As explosões provocadas por homens e mulheres-bomba já mataram 34 pessoas em Volgogrado (a antiga Stalingrado). Daí, no contexto da vizinha insurreição da Tchetchênia, a ameaça do terrorista Dokka Umarov de desorganizar os jogos tem sido levada a sério por Vladimir Putin e seu governo. Umarov, apelidado o Bin Laden do Caucaso,  especializa o próprio grupo terrorista islâmico em ataques a civis indefesos.

          Com vistas, no entanto, a dar melhor impressão para a comunidade internacional, gospodin Putin levantou a proibição antes estabelecida contra quaisquer manifestações de protesto. Posto que exista enorme diferença entre as manifestações pacíficas e as explosões de homens-bomba, os regimes autoritários têm o vezo de desconhecê-los, e até de aplicar a reuniões pacíficas de protesto o pesado tratamento com que as ditaduras distinguem os seus opositores.

         Obrigada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) a reservar espaço para demonstrações de dissenso (nas olimpíadas de Beijing, de 2008), a China cumpriu à risca a regra, só que no espaço vazio não admitiu qualquer manifestação, além de acossar e até prender os grupos de protesto (pelo simples fato de requererem a necessária autorização para externar a respectiva opinião).

         A propósito do decreto de Putin, disse Tanya Lokshina, representante russa da Human Rights Watch[1]: ‘o afrouxamento da proibição faz parte do esforço do governo russo em convencer os críticos de que é uma democracia, em que se respeita, dentro de limites razoáveis, a liberdade de expressão’. Lokshina, no entanto,  acrescenta: ‘Sugiro que não se deixem convencer tão facilmente’.

         Não surpreende, outrossim, que haja discrepância entre as declarações otimistas de Yakunin, presidente das Ferrovias russas, e que conectou os sítios olímpicos com Sochi. Para ele, faltam apenas ‘alguns detalhes’ nos preparativos, embora alguns locais não estejam prontos, como o estádio principal e o trampolim para as provas de esqui (cuja construção foi marcada por uma série de escândalos financeiros).  

 

   O Inferno de Cristina Kirchner

           
             Depois de uma criminosa greve policial, no início de dezembro, em que a população argentina ficou à mercê de saques e da insegurança extrema – na qual há um domínio da mala vita não só de noite, como às vezes em outros países, mas também de dia, coube ao argentino o suplício de uma onda de cortes de energia.

             Por vezes, quem não está habituado a esse percalço do subdesenvolvimento não situa corretamente os inúmeros dissabores trazidos pelo apagão. Os incautos, que só enfrentaram o problema de forma superficial, pensam que implique apenas no desconforto de ficar preso em elevador ou de padecer de canícula, pela falta de ar condicionado.

              No vasto mundo subdesenvolvido, a falta de luz e de energia ataca mais fundo a população, que se vê privada das benesses da geladeira (depois de 24 horas sem corrente elétrica todos os alimentos têm de ser jogados fora). Assim, o desconforto da falta de ar condicionado – e de subir ou descer escadas de edifício, é  problema menor (se o infeliz não ficar preso em elevador escuro, e sem qualquer ventilação: não há melhor exame prático para saber se alguém sofre de claustrofobia).

             A reação da senõra viuda de Kirchner se ateve ao respeito exclusivo da privacidade de seus infelizes concidadãos. É bem verdade que não havia tevê ligada para ouvi-la, mas será que uma palavra de conforto e de alguma participação emotiva não caberia? A onda de calor foi, decerto, grande: mais de 30º por cinco dias consecutivos. Se para nós brasileiros não é coisa de assustar, para os argentinos, de clima temperado, terá sido uma situação difícil.

             O pior estava na previsibilidade dos blecautes. Uma longa série de secretários de energia alertou sobre o colapso do sistema. E, nesse contexto, o verdadeiro culpado pela crise é o populismo tarifário do governo. Por falar em bondades do governo, será que o comportamento da administração de Cristina Kirchner, que oferece subsídios ao consumidor, mas não deixa margem para investimento de parte das distribuidoras energéticas, será tão solitário e excepcional assim, em termos de América do Sul?...

 
 
(Fontes: O Globo; Folha de S. Paulo; The New York Times; VEJA; Der Spiegel)      



[1] Vigia de Direitos Humanos. Diretores dessa NGO foram sumariamente expulsos da Venezuela (no governo do finado Hugo Chávez) em vôo para o Brasil, pelo ‘crime’ de registrar as inúmeras infrações aos direitos humanos do governo de Caracas.

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