segunda-feira, 2 de março de 2020

Israel: Perspectivas ?


                             
       Em menos de um ano, realiza-se a terceira eleição em Israel, sem que os dois principais partidos - o Likud, de direita, liderado por Binyamin Netanyahu, e o Azul e Branco, do general Benny Gantz, que segue linha mais moderada, tenham logrado constituir seja  maioria própria, seja através de alianças.
          Já a circunstância de que os dois principais partidos não lograram formar maiorias que os habilitassem a constituir governo, durante um longo espaço de tempo tenderia a soar um alarme quanto à situação política, eis que a stasis continuada representa, na prática, o anti-governo e, consequentemente, a incapacidade das sustentações respectivas de formarem uma maioria - seja pela própria capacidade de agregação, seja por alianças negociadas fora desse espaço político.

        Governado pelo regime parlamentarista, os dois principais partidos - o Likud, de Bibi Netanyahu, e o Azul e Branco, do general Gantz - adotam posturas políticas que diferem de o que poderiam fazer presumir. A direita de Netanyahu não se peja em exibir a perspectiva de mais uma anexação - portanto, o recurso à violência - como atrativo para o eleitor do Likud: a rápida anexação que a direita volta a exibir dos territórios palestinos no Vale do Jordão e das colônias na Cisjordânia ocupada. Nada para demonstrar o quanto o projeto da direita em Israel se afasta da realidade política, ao advogar a supressão da liberdade como incentivo para a formação de um governo. A par de chamar de "conservadores" aqueles que apóiam o projeto de Netanyahu, é levar o cinismo político à uma caricatura da liberdade política, pois não será pela insolente negação do direito palestino que se pode pretender construir uma administração viável politicamente em Israel.

            Também o sistema político do parlamentarismo na antiga Terra Santa contribuíu para uma deturpação desse regime partidário, eis que ele se fundamenta em muitos casos na institucionalização do preconceito político-racial. Há partidos como o de Avigdor Lieberman, que se diz conservador, mas não tolera árabes, nem líderes religiosos. Basta um rápido olhar em torno para que mesmo um extraterrestre se conscientize que há um vício básico neste mini-partido. Mas o maximalismo de Lieberman é uma criatura estranha: ele recusa formar governo com Netanyahu por causa dos religiosos. Embora conservador, ele é secular convicto, e defende lei que obrigue os judeus  ultraortodoxos a servir o Exército - reforma que é rejeitada pelos religiosos. Mas as exceções de Lieberman também inviabilizam a aliança com Gantz, porque aliar-se com o centro-esquerda implica no apoio aos partidos árabes...

             Dando sequência ao teatro do absurdo,  a proposta de Lieberman, mesmo acenando com acordo com Gantz, não é séria, pois o conservador declara que não participará  de nenhuma aliança com a centro-esquerda, se ela tiver o apoio  dos partidos árabes.  Tudo isso é encimado pelo atual Primeiro Ministro Netanyahu, indiciado pelo Procurador-Geral em novembro último, por corrupção, fraude e violação de confiança. Tudo com base em processos judiciais fundamentados - corrupção, troca de favores, quebra de confiança, e a fraude ... - nada disso semelha suficiente para que Netanyahu seja por fim mandado para a cadeia...
                  Convenhamos, no entanto, que a contribuição de Avigdor Lieberman, na atual política israelense, tende para zero, pois ela tudo inviabiliza. Netanyahu, por outro lado, é uma criatura que semelha poder conviver com esse teatro do absurdo que Lieberman protagoniza.
                    O sistema político israelense, com o seu reino de exceções, parece coexistir com o absurdo. A única saída para que esse envolvente matagal continue a impor prorrogações farsescas seria recorrer à velha máxima que os franceses - creio - inventaram: é proibido proibir ...

( Fonte: O Estado de S. Paulo )       

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