O poder dessas duas personalidades não pode ser
comparado em percentuais mensuráveis. E, no entanto, há uma semelhança, ainda
que esquiva, entre esses dois políticos. Iniciaram a respectiva trajetória como autênticos outsiders. Barack
Obama, desde o seu discurso no Senado condenando a aventura americana
no Iraque, tocara em nota sensível, que ressoaria através da longa preparação
para as primárias do Partido Democrata, e por fim o levaria a alcançar dura
vitória sobre a inicial favorita nas pesquisas, Hillary Clinton.
Ontem, Obama pronunciou o seu sexto
discurso sobre o estado da União, e o fez ao iniciar o seu derradeiro biênio na
Casa Branca. Ao invés de acomodar-se, o 44º presidente optou por uma
intervenção que em nada semelha com uma alocução por um presidente que já se
sente em fim de mandato.
A relação de Obama com o Congresso
nunca foi fácil. O modelo mais marcante nesse contexto, será sempre o democrata
Lyndon Johnson. Líder da maioria no Senado – em momento quando o Partido
Democrata dominava os dois ramos do Legislativo – Johnson foi um dos mais
poderosos chefes do partido democrata, e através de um conjunto de dotes sabia
arrancar de sua bancada o apoio indispensável para conquistas memoráveis do
Legislativo. Para tanto, Johnson não escatimava esforços, chegando até a
empregar a linguagem corporal, como se verifica na antológica série de fotos de
uma conversa dele Johnson enquanto líder da maioria com um até então reticente
senador da bancada sulista democrata. Na série se verifica o efeito avassalador
da palavra – mesmo em encontro de corredor – de Johnson sobre o companheiro de
partido, que por contingências eleitorais duvidava em apoiá-lo. Ao fim, se intui
que Lyndon Baynes Johnson uma vez mais imprime a sua vontade no correligionário
antes pendente entre a abstenção e o voto contrário.
Quando alcançou a presidência, pela
prematura morte de John F. Kennedy, Lyndon Johnson levaria para o Capitólio um
pouco da desenvoltura do passado líder da maioria.
Infelizmente, a relação de Barack
Obama com o Congresso não se pode comparar com a do seu antecessor, o texano
Johnson. Obama, lançado pelo discurso
contra a guerra do Iraque, nunca teve na Câmara Alta posição de influência que se
possa comparar à de Lyndon. Nos dois mandatos, a sua posição como Presidente
foi condicionada de uma parte, pelo virtual desaparecimento do espírito do bipartidismo
(bastante presente na época de Johnson) e pelas alternas fortunas das bancadas
democratas no Senado e na Câmara.
Obama dispôs de maioria democrata no
Senado e na Câmara apenas no primeiro biênio (2009-2010). Os democratas
perderam o controle da Câmara pela tunda (shellacking) de novembro de 2010,
resultado em parte da inexperiência do novel Presidente. E pelo visto só conquistarão nova maioria na
Câmara Baixa depois de novo censo (na década de vinte) que eventualmente
corrija a atual distorção que garante sólida maioria ao GOP. Por sua vez, os
democratas lograram manter maioria no Senado até janeiro corrente, quando,
derrotados em novembro passado pelos republicanos, se viram em minoria,
passando a liderança na Câmara Alta do democrata Harry Reid, de Nevada, para o
republicano Mitch McConnell, do Kentucky. Assim, Obama, com o Congresso
democrata, alcançou duas grandes conquistas no Legislativo a Reforma Sanitária
(chamada pelo GOP de Obamacare) e a lei sobre o sistema financeiro (Wall
Street). Também foi votada importante
lei com fundos para setores mais atingidos pela Crise Financeira surgida em
2008.
Obama não tem entre suas
qualidades a capacidade de influenciar os senadores, seja na bancada, seja
individualmente. O seu estilo difere
totalmente do de Lyndon Johnson, e assim os resultados de uma eventual
liderança são de difícil aferição.
Surgiu ele como líder de geração
jovem, com o seu repúdio da guerra no Iraque. Sua postura um tanto distante, e a falta de inclinação para
empregar o poder presidencial como instrumento político em relação às bancadas
no Senado e na Câmara, contribuíram em parte para resultado legislativo que se
afigura medíocre se afastarmos os dois anos em que o Partido Democrata tinha os
votos para converter em lei projetos na Câmara e no Senado. Com 2011 em diante,
entramos em fase aguda da paralisia parlamentar, por efeito do domínio
republicana na Câmara.
Mas não esqueçamos a comparação com
Alexis Tsipras. Tanto Barack Obama, quanto Tsipras são homines novi, vindos da
esquerda (que equivale ao liberalismo nos EUA). Se a presidência terá
modificado o Senador Obama, o ponto de partida de sua trajetória política será
o liberalismo democrático, que é o quanto posições de esquerda nos Estados Unidos podem
almejar na conquista do poder.
Assim, com a liberdade das necessárias
adaptações às realidades de cada país, Alexis Tsipras pode ser considerado
hoje, com o seu percentual de 33,1% das intenções de voto o que Barack Obama
prefigurava na véspera da Convenção Democrata, com a sua maioria relativa de
delegados – politicamente ascendente, mas ainda dependente de apoios de última
hora.
Se os totais aparentemente não
bastavam para garantir matematicamente a vitória, pela tendência ao crescimento
apontavam para a probabilidade da conquista num caso da indicação para a
candidatura do partido democrata (a votação final contra o republicano John McCain foi apenas um complemento do
triunfo anunciado).
Nesse quadro, soa similar a
assertiva de Nikos Marantzidis, cientista politico da Universidade da
Macedônia: “Seria muito, muito difícil para a Nova Democracia (de Antonis
Samaras, o atual Primeiro Ministro) reverter a liderança do Syriza (e a vitória
de seu líder Alexis Tsipras). Só um evento democrático imprevisto natureza pode mudar o cenário agora”.
Com a conquista de 147
assentos em Parlamento de 300 representantes, Alexis Tsipras está a um passo da
conquista da maioria e da consequente condição de chefe de gabinete com o
número de votos para ser convocado pelo Presidente da República.
( Fonte: O
Estado de S. Paulo )
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