domingo, 4 de janeiro de 2015

Colcha de Retalhos C 1

                                  

Mau Começo

         
       Ontem mesmo, segundo noticia o site do Globo, Dilma Rousseff, irada, telefonou de sua vilegiatura na Bahia para o  Ministro Nelson Barbosa. A Presidenta – com a presumível delicadeza – mandou que o Ministro do Planejamento desse meia-volta volver nos seus planos de um novo cálculo do salário mínimo.

       Pelo telefone – e não foi samba -  ela ordenou que Barbosa publicasse nota retratando-se da intenção de mexer no cálculo do salário mínimo.

       Nesse contexto, onde fica a avaliação da nova equipe econômica de que não há mais condições de manter a regra atual, considerando-se a necessidade de uma política fiscal mais austera?      

       Se continuar nessa base, tendo-se presente que a equipe econômica é constituída por gente séria, e não por moços de recado, não tardará muito e Dilma não há de enxergar, das alturas de sua torre de comando, mais ninguém das novas aquisições que hão de pensar ter coisa melhor a fazer do que engolir contraordens desse gênero.

 

O Papa Francisco e a Cúria
      

         De longe, talvez seja difícil, quase imprudente,  entender a real situação das relações entre o atual Santo Padre e a Cúria romana.

         Diga-se de saída que a visão da Cúria pela urbe romana, notadamente o povão, tivera o próprio ceticismo alimentado pelo que terá visto através dos séculos- e assinale-se que até 1870, quando a guarnição colocada por Napoleão III para manter o que restava do Estado pontifício teve de bater retirada, pela eclosão da desastrosa guerra contra a Prússia, o então Papa, Pio IX ainda era igualmente soberano temporal.

         O interlúdio no Papado não terá sido o primeiro, nos seus embates com o poder temporal. Com os acordos de Latrão, costurados com o fascismo em 1929, foram desenhados os limites do estado pontifício, que permanecem até hoje, com a maior parte do pequeno território localizado nas colinas vaticanas (há outros espaços das Santa Sé, como as  basílicas de São João de Latrão e São Paulo fuori mura (além dos muros), que igualmente gozam de exterritorialidade.

         No entanto, desde a sua instituição na Idade Média, os Sumo pontífices  foram igualmente Soberanos temporais – o Papa–Rei – com que teve de lidar, através dos séculos, a plebe (e a nobreza) romana. A cercania e o trato diuturno contribuíram para que a mais antiga instituição político-temporal fosse vista pela gente miúda muita vez com olhar crítico e até um pouco cínico.

          Há ditos romanos que contém esse veio originário da proximidade com um poder a um tempo religioso e temporal. Dentre esses, cito apenas dois (traduzidos do dialeto romano): O Papa goza de ótima saúde até o dia em que morre. E, com relação às placas das viaturas da Cúria (que têm as iniciais SCV – por Estado da Cidade do Vaticano: Se Cristo visse...)

          Esse cinismo light é  característica sobretudo do Borgo, o bairro popular próximo à Praça de São Pedro, que fora descaracterizado pelo urbanismo do Duce, para a construção da Via della Conciliazione (Rua da Conciliação), que liga, com  fasto fascista e no estilo do Barão Haussmann[1], a margem do Tibre ( e o Castelo de Sant’Angelo) com a Praça de São Pedro.

          A recente descrição feita por Papa Francisco traz consigo a franqueza do novo Pontífice e o seu gosto por modéstia e sensibilidade, que para gáudio dos fiéis marca o respectivo pontificado. Diante de um tal organismo – que se acredita perene e, sobretudo, acima das injunções temporais da série de Pontífices – como diria o nosso Poeta, será luta renhida o respectivo enfrentamento. Diante de outros Santos Padres, a Cúria (ou uma parte substancial dela) se curva, e presta voto de fidelidade, de cuja valia provou o antecessor imediato, a ponto de renunciar à Sé de Pedro, como o fizera, no breu do Medievo, S. Celestino V.

           Para falar de Pontífices contemporâneos,  corre o rumor de que a agonia do Papa Bom (João XXIII, hoje santificado) foi saudada por brindes não-tão discretos de integrantes dessa mesma Cúria. Sem esquecer, o Papa do sorriso, João Paulo I, cujo breve reinado, fora cortado de modo tão abrupto a ponto de recenderem suspicácias.

          Tenho para mim que o Papa Francisco, habituado a lidar na terra natal com o braço por vezes pesado dos diversos poderes temporais por que passou o seu caminho pastoral, saberá como proceder no caso em tela. O que surpreende, contudo, na sua descrição da Cúria é o seu caráter generalizante. Pergunto-me se a tomada verbal de posição faz parte de ofensiva mais ampla, com o afastamento de personagens-chave. A reforma da Cúria – como a de todo organismo – é factível, mas se o Cardeal Tarcisio Bertone pode ser erigido em modelo, será sempre preferível omitir as repreensões e logo passar,  como no caso do Cardeal Burke, aos finalmente.

          Na verdade, por causa da distância, os fiéis – que torcem por Papa Francisco – esperam que não seja apenas um rompante, mas a sinalização de ofensiva que procederá não a expurgos, mas a modificações pontuais, para tentar dar à Curia cores mais consentâneas com a visão do atual pontificado, mais próxima do rebanho de fiéis, e mais longe das posturas fascistóides de muitos dos altos funcionários que o Santo Padre deseja corrigir, se possível por palavras e boas maneiras.
           E é aí que mora o perigo.

 

 
Regulação da Mídia

 

            O Ministro Ricardo Berzoini, tão logo empossado nas Comunicações, apressou-se em declarar que o ‘governo’ vai apresentar proposta de regulamentação econômica da mídia, no segundo mandato da Presidenta.

            As ilusões, como as miragens no deserto, desaparecem, se não com a resistência de alguns projetos – e não se deve esquecer que essa tal de ‘regulamentação da mídia vem desde o governo Lula da Silva’, sob o insistente ferrete do então ministro Franklin Martins – mas a democracia brasileira há de mostrar que não estamos nem no Equador do señor Rafael Correa, nem na Venezuela de Nicolás Maduro.

            Berzoini afirmou, outrossim, que o ministério vai ‘abrir um debate’, para ouvir sugestões sobre o tema, que serão encaminhadas ao Congresso.  Para não assustar, apressou-se em ponderar que “quem regulamenta é o Congresso Nacional. O Poder Executivo pode, no máximo, apresentar suas propostas.”

           Posto que  o objetivo ostensivo dos defensores da idéia é regulamentar artigos da Constituição que tratam da comunicação social, há a intenção não tão oculta de controlar a imprensa e tolher a liberdade de expressão.

          A regulamentação da mídia é uma antiga bandeira da corrente do senhor Franklin Martins. No seu primeiro mandato, Dilma se recusou a discutir qualquer iniciativa que implicasse em controle de conteúdo – como, e de forma acintosamente inconstitucional, fora tentado no governo de Lula da Silva.

          É comovente a disposição de Berzoini na defesa de maior diversidade na produção de conteúdo, que ofereça alternativas ao que é oferecido pelas empresas de comunicação.

           E dentro dessa linha que diz querer uma coisa (que o cidadão comum possa se organizar para ter a sua comunicação), Sua Excelência Berzoini nos lembra que emissoras de rádio e tevê são “objetos de concessão pública”, e por isso precisam  ser regulamentadas.

           As patranhas de Sua Excelência Berzoini (e por trás dele Franklin Martins) não passarão. Ao ouvir e ler as declarações desses senhores, dá vontade de recomendar-lhe que se desejam um vetor público para as respectivas ideias, cuidem mais da Rede Cultura. Basta sintonizá-la para que o telespectador se dê conta do sucateamento a que estão submetidas, pela falta de dotações respectivas.

           O Brasil é uma democracia não-adjetivada, ao contrário de inúmeras outras com quem mantemos boas relações, porém cuidamos de não imitá-las.

            Depois da estrondosa vitória de Dilma Rousseff – que de tão estrondosa teve de esperar pelos finalmente para que o TSE  informasse o Povo brasileiro de que a candidata do PT vencera com a margem de 52%  - não me venham, por favor, falar de mandato popular para isto ou para aquilo.

           Por falar em preocupações do Povo brasileiro, a Petrobrás e o nefando Petrolão continua clamando por ter a ‘roubalheira’ esclarecida. Por outro lado, o ex-presidente da Petrobrás, Gabrielli pede que Dilma seja ouvida, na sua qualidade de Diretora do Conselho de Administração da Petrobrás, no que tange à questão da refinaria de Pasadena 

 

 
( Fontes:  Gonçalves Dias, Annuario Pontificio 1988, Grande Enciclopédia Delta-



[1] O Barão Haussmann (1809-1891), no reinado de Napoleão III, dá à Cidade-Luz a sua fisionomia contemporânea, modificando a Paris do século XVIII, que se caracterizara pelas vias e ruelas (que tanto favoreciam as revoluções de barricadas), com a construção de grandes avenidas, como o Champs Elysées, e muitas outras, que partem do Arco do Triunfo. 

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