Se Vladimir Putin, em seus
tempos de agente da KGB, fez algum
curso em medidas de desestabilização de países inimigos, deve ter tirado notas
altas.
Para quem
não tem escrúpulos em termos de direito internacional e respeito aos tratados,
a situação da Crimeia para o pretendente imperialista constituía verdadeira
galinha morta. De toda maneira, com as ‘sanções’
do Ocidente e a simpatia – para dizer o menos – de boa parte da população
naquela península, o referendo nem precisaria recorrer à sua linguagem ambígua
– que dá ao procedimento os chamados ‘vícios redibitórios’ que invalidam a
decisão, se houvesse instância com força para implementá-la - dada a desequilibrada preferência pela
reunião com Moscou.
Mas se Kiev,
na época injustamente defraudada pela cínica operação, que do inferno Hitler e Mussolini terão aprovado com louvor, agora o governo interino da
Ucrânia, cercado pela boa vontade da
União Europeia e dos Estados Unidos, se defronta com o mesmo agressor, a que se
agregam o treinamento anterior, a frouxidão dos laços do leste ucraniano com o
poder central e a falta de qualquer apoio efetivo de parte ocidental ?
Para quem
tem dúvida, as sanções de Barack Obama,
que visam os cupinchas de Putin e os supostos fundos do presidente russo, não
parecem fazer o senhor do Kremlin
perder o sono, nem o intento de abocanhar o que melhor lhe pareça do leste
ucraniano. É duro dizê-lo – levada em conta a sanhuda captura dos observadores
da OSCE -, mas se o arreganho
ocidental tivesse alguma credibilidade seria de acreditar que Vladimir Putin
nada tenha feito para libertá-los (ou alguém acredita que os separatistas
tenham algum poder discricionário)?
Pela andança
da carruagem, com as seguidas falhas do poder central ucraniano, a evolução
desta segunda fase da agressão russa procede a inteiro gosto de Moscou. As
débeis tentativas de Kiev de fazer algo – a exemplo do envio de helicópteros
para a região – se contrapõe a debilidade do esforço, eis que dois foram
derrubados pelos ‘separatistas’ – presumivelmente por mísseis terra-ar – com a
morte dos pobres pilotos, vítimas de um combate iniquo e desigual.
O poder
central ucraniano – conceito de resto que, por ora, vem sendo desmoralizado
pelos agentes russos e seus comparsas locais – deveria ter pensado no passado
quanto à conveniência de estruturação digna desse nome das defesas da nação de
Kiev. Se bem que ora seja um pouco tarde para levantar esse tema, é
estarrecedora a facilidade com que os simpatizantes de Moscou se apossam de
administrações locais e como avancem nos respectivos desígnios sem que o
governo interino central possa montar qualquer resistência efetiva à atuação em
geral desimpedida das chamadas tropas descaracterizadas, e dos demais agentes
que se movimentam com ominosa desenvoltura.
Contudo, as
más surpresas não param por aí. Ontem, segundo se noticia, a Chanceler da Alemanha teve conversa
telefônica com o Presidente Vladimir V.
Putin, que, como se sabe, é um homem de paz. Pois não é que o senhor do Kremlin transmitiu para Angela
Merkel a seguinte pérola? No seu
entender, a Ucrânia deveria retirar suas próprias tropas do leste do país para encerrar (sic) o conflito na
região, que é parcialmente controlada
por milícias separatistas pró-Rússia.
Ainda
segundo Putin, a retirada seria
“essencial para deter a violência e lançar um diálogo envolvendo todas as
regiões e forças políticas do país”.
Dessarte –
e para tanto se servindo da Chanceler alemã, cuja resposta não foi divulgada –
Vladimir Putin, em arrazoado que levaria às lagrimas o seu modelo Benito Mussolini, depois de
desestabilizar o leste ucraniano, se apresenta como homem de paz, e recomenda na prática a renúncia de Kiev sobre as
regiões orientais, que de qualquer forma já estariam em boa parte sob o
controle das forças separatistas pró-Rússia. Sem qualquer dúvida, estamos diante de conselho de lobo para
cordeiro...
De qualquer forma, Putin parece ter pressa. Em 25 de maio corrente estão previstas
eleições presidenciais na Ucrânia. Tudo
indica que gospodin Vladimir Putin queira resolver essa questão antes que surja
em Kiev alguma liderança com maior apoio da opinião pública, e portanto não tão
débil quanto o presente interinato. Consta, a propósito, que Putin também
manteve diálogo com o Primeiro Ministro de Sua Majestade Britânica, David
Cameron, que igualmente se teria
mostrado receptivo...
(Fonte: Folha de S.
Paulo)
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