Na linha aberta pela decisão da Juíza
federal Ana Paula Vieira de Carvalho (V. blog
O
Fim da Impunidade), o juiz Caio Márcio acolheu a denúncia do MPF,tornando-se réus o general reformado
José Antonio Nogueira Belham, os coronéis reformados Raymundo Ronaldo Campos e Rubens
Paim Sampaio, e os sargentos e irmãos Jurandyr
e Jacy Ochsendorf e Souza.
Há dois fundamentos para o acolhimento desta
ação penal. No entender do Juiz Caio Márcio, a denúncia do MPF trata de crimes
previstos no Código Penal não protegidos pelas disposições da Lei de Anistia,
de 1979. Para o magistrado, a citada Lei nr. 6683/79 não perdoa os crimes
previstos na legislação comum, mas tão só os crimes políticos ou conexos a esses, “punidos com fundamento em atos
institucionais e complementares”. Na ação penal ora encetada, os réus vão
igualmente responder pelos crimes de associação criminosa armada e fraude processual.
Outro fundamento alegado pelo juiz
federal - data vênia, o de maior
importância e significado – é que a morte de Rubens Paiva se insere “na
qualidade de crimes contra a Humanidade” que impede a incidência da prescrição.
Para a professora universitária Vera
Paiva, ela acredita haver vivido ontem o primeiro dia “de um novo Brasil”.
Transcorridos 43 anos da morte e desaparecimento de seu pai, Rubens Paiva, após
ser detido por agentes da Aeronáutica em 20 de janeiro de 1971, ela finalmente
recebe a notícia aguardada durante todo esse tempo pela família do parlamentar.
No que concerne ao Direito Internacional
Humanitário, já constitui doutrina nas grandes Cortes internacionais, assim
como nos países mais adiantados, de que a tortura – e outros delitos contra a
Humanidade – configura crime imprescritível.
As anistias – e inclusive a auto-anistia
como foi a citada lei nr. 6683/79 – se tornam, por conseguinte, írritas.
Como aviso aos navegantes, no entanto, a
luta já está empenhada e encetada, mas tal não vale dizer que a guerra esteja
ganha. Se dúvidas existissem, a própria chamada de primeira página de O Globo
mostra que ainda as nuvens da negação e da impunidade: “Caso Rubens Paiva vai a
júri, apesar da Anístia. A Justiça Federal aceitou denúncia do M.P. contra 5
militares acusados da morte (...) do deputado Rubens Paiva. O juiz entendeu que
por serem crimes previstos no Código Penal e contra a Humanidade, a Lei da
Anistia (...) não se aplicaria no caso. O STF tem entendimento diferente.”
O STF em decisão anterior desconheceu,
por maioria de votos, a nova realidade no direito internacional humanitário,
que torna imprescritíveis os crimes contra a Humanidade, entre os quais a
tortura, e outros mais.
Nesse contexto, não é apenas na faceta
jurídica, mas também na política, que a timidez e a atitude timorata quanto ao
regime militar e suas consequências, diferenciam o estamento político (e
jurídico) brasileiro dos de nossos países irmãos do Cone Sul, e notadamente da
Argentina.
Decisões como a da Juíza Ana Paula e
agora a do Juiz Caio Márcio, nos acenam
com a abertura de uma nova era. O STF, por certo, voltará a ocupar-se da
questão, e não se pode afirmar que desta feita entrará na estrada real da nova
jurisprudência internacional humanitária, ou se continuará a palmilhar a melancólica
rota de sentenças, como a anterior, que se apegam ao atraso. Até lá, os membros
do Supremo não serão os mesmos, conquanto o próprio Ayres Brito, hoje
aposentado, tenha sufragado a boa tese do direito internacional humanitário.
Esperemos que as novas aquisições, como o Ministro Luís Roberto Barroso,
contribuam para dar à jurisprudência brasileira um viés mais conforme aos
progressos do direito internacional humanitário.
Será
pedir demasiado que assim abandonemos a submissa e deferente retaguarda de sempre ?
( Fonte: O Globo )
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