terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Do enterro do general Qassem Soleimani




       O Globo publica na sua primeira página a foto dos caixões  relativos ao enterro de Estado do general Qassem Soleimani.

         Antes de entrar nas considerações relativas ao post-mortem do general, assinale-se, por pertinente e demasiado oportuna, a circunstância que na chamada cerimônia da vingança (foto em primeiríssima página de O Globo),  que a presença masculina não é só predominante, mas também, até prova em contrário, exclusiva,o que não é apenas detalhe, mas a marca da sociedade hiper-masculina, em que a mulher é, na aparência, só um ente cuja presença oscila entre o recluso e o acesso restrito a determinados encontros. 

             Dada a sua aparente condição pública de segunda ordem, não despertará espécie que o seu acesso a espetáculos desportivos estivesse desde muito vedado, até que o seu ingresso  em estádios haja sido tolerado, sob certas circunstâncias,e por conseguinte parece claro o caráter da cultura em extremo machista desta sociedade em que o predomínio masculino surge superficialmente sufocante, numa expressão extrema que reproduz normas sociais que pelo seu aparente extremismo machista parecem fora do tempo, e na verdade apenas refletem o presente atraso social da sociedade xiita, dado o que semelha sufocante regime vigente nessa sociedade, assinalado por descomunal atraso em determinadas liberdades concedidas à mulher, tanto no aspecto público quanto político.

         A condição da mulher xiita como ente inferior não é detalhe, porém situação medieval artificialmente mantida por tal dito retrógrado regime, que mais semelharia um retrato fora do tempo, tomado às escondidas em pleno século XXI. Voltamos ao confinamento e as demais usanças do Medievo, em que a mulher era tida e havida como um ser que se devia manter entre enclausurar ou mesmo esconder. Dentro do lar, fora dos olhos cúpidos de eventuais estranhos, se ela podia circular naturalmente, e não recoberta pelos véus dessa peculiar reclusão visual, a que se condicionava o gênero feminino. 

             Aí estão refletidas as ínsitas contradições de tais regimes radicais. Para o fiel, os véus femininos e outros obstáculos à presença pública feminina, carecem, para os crentes, de ser entendidas em uma postura geral de alegada preservação do feminino aos olhos do mundo em redor. Para o islamita, esse apartamento reflete respeito e temor. Dentro do lar, toda a beleza da mulher pode desabrochar livremente, no que tange às faces livres de véus e de outras vestes cujo escopo, se trazidas ao ambiente em que estranhos possam ter acesso, é o de manter preservada a pureza da presença feminina.

            As considerações acima se transportadas a um ambiente islâmico radical, serão necessariamente lidas por aqueles que professam esse credo, dentro dos rígidos condicionamentos do islamismo assim caracterizado. Por isso, a mulher, pelas suas características especiais nessas culturas - do lar e por conseguinte necessariamente restrita a uma presença que está destinado ao privado - será tratada dentro das normas acima referidas não por se tratar de um ente inferior, mas sim pela sua condição superior no lar, e por isso, ela deveria ser preservada de olhares malsãos do mundo exterior, dada a relevância de sua posição dentro da sacralidade do lar nesta cultura.


( Fonte: O Globo )

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