quinta-feira, 22 de agosto de 2019

A Crise Italiana (II)


                                   
        Nesses dois últimos dias, a crise italiana - aberta pelo Ministro Matteo  Salvini, chefe da Liga - levou ao fim a coalizão entre o Movimento 5 Estrelas e a neo-fascista Liga, deixando um legado  de economia estagnada e endividada, e o recurso sempre mais forçado a políticas cada vez mais duras contra imigrantes. Salvini buscara valorizar uma posição reforçada por posturas demagógicas contra imigrantes que são levados à Itália - e outros países mediterrâneos - pelos precários barcos que atravessam esse antigo mar em busca de asilo a esses infelizes tangidos pela permanência da crise sócio-política da África.

            Só mesmo uma conferência pan-europeia poderia encaminhar a solução dessa difusa e de muitas caras crise sócio-política que obriga a muitos infelizes buscarem abrigo longe do caos e do desgoverno das facções, que infernizam a Líbia (o típico estado-malogrado no pós-Muamar Kadaffi) e mais outros "candidatos" assolados pelas guerras-civis e o consequente caos social. Que esses infelizes se valham  de embarcações ainda menos seguras do que os seus locais de abrigo precário e provisório, constitui outra tragédia, que muitos prósperos estados europeus preferem, por enquanto, empurrar com a barriga, na pia esperança de que essa mega-crise que investe a tantas regiões e países vá evaporar-se um dia desses...
  
            Salvini, por sua vez, que lançara a Itália na sua enésima crise de governo, o fez decerto por motivos pouco confessáveis, como se desejasse valer-se da própria imagem de deus ex machina, em termos políticos, sem atentar para o interesse nacional, e,dessarte, repetir o refrão de velha canção brasileira de Roberto Carlos  - e que tudo mais vá para o inferno. Sabemos que a Itália configura muita vez mais, em termos políticos, crises de governo que parecem aos observadores difíceis de serem justificadas e, guarda caso! estamos diante de um bom exemplo.
  
             De resto, como é sabido, ao apresentar sua renúncia, o premier Giuseppe Conte, um independente apoiado pela Liga,  criticou em termos duros a Salvini, a quem acusou de tentar driblar o processo democrático para ampliar seus  próprios poderes, em o comparando tacitamente com o ditador fascista Benito Mussolini.

                 Por sua vez, na movimentação dos partidos causada pela atual crise, o Partido Democrático da Itália, hoje de centro-esquerda, fez exigências ontem ao Movimento Cinco Estrelas (M5S) para integrar uma coalizão, entre elas o respeito à União Europeia. O objetivo é evitar eleições antecipadas ainda em 2019, o que poderia levar o Ministro do Interior, Matteo Salvini, ao cargo de Primeiro Ministro.

                  Segundo explicitaram fontes do PD, foram feitas cinco exigências, entre elas o respeito e a lealdade à filiação da Itália à União Europeia, além de outras, já no plano verboso, como compromisso para fomentar que o projeto comum supere suas carências e marche para uma Europa de direitos, liberdades, solidariedade e sustentabilidade ambiental e social.

                      Além disso, o PD se quer distanciar da gestão dos últimos catorze meses aplicada por Salvini, que mantivera  política de portos fechados aos navios de ONGs que têm resgatado migrantes em alto mar.
                        As fontes políticas indicaram que, dadas essas condições, o Partido Democrático estará disposto a formar um Executivo que dure e  tenha como objetivo imediato a elaboração do Orçamento-Geral  para 2020 visando a potencialização do crescimento em uma economia ora estancada. Dentro desse ideário, o Secretário-Geral do PD (no passado, o PCI) Nicola Zingaretti criticou  em declarações à imprensa, o governo do M5S e da Liga "responsável pela paralisia da economia, o empobrecimento generalizado, um setor empresarial mais pobre e um isolamento sem precedentes da Itália no cenário europeu e internacional".

                          Ainda nesse sentido, Zingaretti encareceu que, se o PD e o M5S constituírem uma aliança, o novo Gabinete seja totalmente diverso do anterior, quanto ao programa e à equipe de Governo.

                             Deve-se ter presente que  as duas forças parlamentares tentam unir-se para evitar eleições antecipadas e, ao mesmo tempo, barrar o avanço do partido de ultra direita Liga, de Matteo Salvini, que levara avante política de linha dura contra os imigrantes. Nas eleições legislativas de 2018 o M5S obteve 32% dos sufrágios, enquanto o Partido Democrata foi a segunda legenda mais votada, com cerca de 17%. Sem embargo, eles têm pelas pesquisas recentes o aviso que a Liga, de extrema direita,  conquistaria 38% dos votos em novas eleições nacionais.

                             O Presidente Sergio Mattarella reuniu-se ontem com os presidentes da Câmara e do Senado, para discutir a crise política e a possibilidade de os partidos com maiores bancadas no Parlamento formarem alianças.

                            Enquanto Matteo Salvini aguardava ontem  a vez de apresentar seus argumentos ao Presidente da República Mattarella, achou oportuno qualificar  qualquer tentativa de formar uma coalizão como uma conspiração contra ele. Nesse sentido, o ministro do Interior insistiu que os eleitores deveriam determinar quem os governará... Ainda nessa peculiar linha de raciocínio de quem não quer entender como funciona uma governança parlamentarista clássica, como é a italiana, reiterou o Ministro do Interior: "Qualquer governo que nascer será um governo contra a Liga", disse Salvini a jornalistas que  lhe perguntaram sobre as negociações entre o Movimento Cinco Estrelas e o Partido Democrático.
  
                                Um tanto ironicamente para o sôfrego e ambicioso Salvini, ele pareceu esquecido de ter sido ele quem pariu o monstro da nova crise, ao anunciar o fim de sua aliança como o Movimento Cinco Estrelas e ao processar um pedido de moção de desconfiança contra o Primeiro Ministro Conte, que embora não tivesse força política própria, dispunha de conhecimentos sobre os respectivos poderes de um Presidente do Conselho segunda a Constituição.

                                  Baseado em uma serie de conhecimentos, que pensava tivessem o poder que na realidade cabe às instituições, Salvini ledamente anunciara o fim de sua aliança com o M5S e depositado moção de desconfiança contra o Presidente do Conselho Conte, embalado nas suas alegres pressuposições de que tudo sairia como planejara, eis que a antecipação das eleições - por ele suposta de efeito imediato - seria felizmente conjugada pela elevada popularidade do Chefe máximo da neo-fascista Liga.

                                       Não se pode dizer que a lição que lhe foi ministrada pelos Poderes da República Italiana  tenha acaso correspondido às suas ignaras expectativas. De toda forma, a sua pressa de chegar ao Poder terá de esperar  algum tempo,  e é sempre bom que esse tosco aprendiz de política, que pensava aplicar um golpe inspirado em Benito Mussolini,  o dito golpe de mestre fica por ora postergado sine die...     
   
( Fontes: O Estado de S. Paulo, e conhecimentos do autor)


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