É triste a comprovação da máxima de Lord
Acton:
o poder corrompe, e o poder absoluto corrompe de forma absoluta.
Apesar de seu aparente automatismo, a
confirmação de sua validade no Brasil é um fato que deveria ser levado em maior
consideração de o que tem ocorrido na prática.
A trajetória do Partido dos
Trabalhadores nesse sentido não tem nada de original. Comparemos o PT e seus
dirigentes na oposição e no governo. Não há contraste maior.
Quando na oposição, seja ao regime
militar, seja à democracia da Nova República, o PT começou magro, austero,
principista e mesmo intransigente, chegando a expulsar de seus quadros alguns
poucos deputados que tinham ousado desrespeitar a norma partidária e votar por
Tancredo Neves, aceitando a eleição indireta.
Essa intransigência principista o
levou mais adiante a contestar o Plano Real, chegando mesmo ao excesso de ir
aos tribunais para tentar invalidar a Lei da Responsabilidade Fiscal, que é a chave
da abóbada dessa magnífica construção que lograra devorar, enfim, a praga da
inflação.
Poder-se-ía contestar a filosofia
política do PT, mas não os princípios éticos em que se sustentava, posto que,
por vezes, a rigidez doutrinária enveredasse por caminho que poderia invalidar
na prática os fins que o partido proclamava seguir.
Depois que Lula da Silva, diante do
retrospecto de três eleições perdidas, optou por uma adaptação de seu partido
ao que passou a ver como o desejo do eleitorado, a transformação do PT foi um
autêntico sucesso, só que ao mudar de roupa, segundo as recomendações do
marqueteiro, se deixou também, mas de forma gradual, liberar-se de muitos de
seus princípios de ordem ética.
Como todo processo, não foi
abrupto. Será sempre mais fácil em tais circunstâncias que se pratique a
gradualidade, que torna a transformação menos repentina, e por conseguinte com
maiores possibilidades de que as mudanças pareçam mais naturais.
Dessarte, para observador que
entrasse em letargo na virada do século, e que reacordasse na passagem do cetro
do poder petista de Lula da Silva para Dilma Rousseff, teria grande dificuldade
em reconhecer no Partido dos Trabalhadores da segunda década do século XXI
qualquer semelhança com a ética, aguerrida e absolutista agremiação formada
pelo torneiro mecânico, nos anos do declínio do regime militar.
Aguerrida talvez continuasse a
ser, mas as demais características as levara ou deformara o silente fluir do
tempo. Lord Acton, aonde estiver, verá não com prazer, mas com a serenidade do
publicista mais uma vez confirmado na sua observação, o quão a natureza humana é complacente com o poder, se
tem a oportunidade de servir-se dele. Quanto
mais o faz, mais o quadro se deforma de acordo com as próprias necessidades.
E o PT de Lula da Silva e o de
Dilma Rousseff continuará a ser mais um monótono reflexo da Lei de Lord Acton.
E quanto mais o poder petista perdurar e se afirmar, mais o entorno se
conformará às suas novas predisposições.
Por isso, qualquer prélio eleitoral com ele – assim como com o velho
Partido Revolucionário Institucional, no México – se tornará uma luta desigual
e, por conseguinte iniqua, eis se aplicarão princípios que já são deformações de uma normativa equilibrada e justa.
O PT pode guardar a sete chaves o
seu atual retrato. Algum dia, o imponderável poderá abrir-lhe as portas e
desvendar para um universo que se quer surpreso as cicatrizes e as horrendas
transformações sofridas por Dorian Gray.
A luta se torna demasiado
desigual, pelo aparelhamento dos órgãos estatais, e pelo desvirtuamento
consequente da possibilidade de correções pontuais.
E estará aí, em algum ponto indefinido
do calendário político, que a ânsia de muitos conjugada com a difusa rejeição,
logrará, pelas artes do imprevisto e imponderável, o que a lógica cruel parece denegar de forma sistemática.
Será talvez o espelho a mostrá-lo. O Rei está nu – ou melhor, a Rainha está nua.
Nada demais para os amigos do
Palácio e a imensa choldra do Poder. Mas como o raio que se desencadeia em céu
sereno e sem nuvens, há tempestades e conscientizações tão subitâneas, quanto
avassaladoras e terminais.
Entrementes, que continue a luta
contra os arreganhos e deformações desse Poder.
E, como muita vez acontece, o
estandarte da verdadeira democracia virá a cair em mãos inesperadas.
E a máxima de Lord Acton
continuará a valer, enquanto dure a paciência do Povo.
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