A frase de Buffon nos vem à memória com pequena
adaptação determinada pelo avanço da posição da mulher. Assim, o estilo é a própria pessoa.
Nos anais da
presidência, a personalidade de Dilma
Rousseff só encontraria similar em um general-presidente, Ernesto Geisel. Nos tempos do AI-5, de tudo ele pensava entender e com
o poder discricionário que tinha, em tudo metia o bedelho, chegando ao ponto de
fazer emendas em regulamentos técnicos.
Para os que
enfrentaram a prova das reuniões de trabalho no Palácio do Planalto – pois o
irmão de Orlando Geisel – que lhe
tinha garantido a escolha – queria de tudo saber, e para tanto não desdenhava
descer até o nível de chefe de divisão, na vasta hierarquia burocrata.
Nessa mesa
presidencial costumava pairar um prudente e transido silêncio. Dar opinião ou
‘palpite’ – de acordo com o humor do chefe – não parecia aconselhável. Se
interrogado – o general-presidente não consultava – o melhor era ser curto e
breve, desde que dominasse o assunto. Nessa hipótese, guardaria ainda algum
trunfo, se outra estocada viesse. Se não soubesse, ou tivesse apenas noção,
melhor limitar-se ao mínimo, ou então encomendar a alma funcional ao Deus ex-machina e orar por um momento de
tolerância.
Ora, esse tipo
de atmosfera não está no interesse de ninguém. Se o respeito ao chefe é a regra
primeira, que prevalece sempre, não se deve confundi-lo com o terror dos
infelizes. Em primeiro lugar, pela simples razão de que ele não aproveita a ninguém,
a começar pelo chefe iracundo. Em segundo, porque a tensão enrijece cérebro e
músculos. No esporte, se for mantida de forma indiscriminada, o atleta estará
prejudicado, pois ela só carece de aparecer em momentos cruciais. O mesmo, mutatis mutandis, está nos grupos de
trabalho, ou reuniões assemelhadas, como serão as mesas reunidas em torno da
presidente.
Em outro blog mais antigo, ocupando-me
igualmente da personalidade de Dilma Rousseff enquanto presidente, procurei
mostrar que os grandes chefes buscam criar atmosfera conducente ao diálogo. Os
convidados à mesa aí estão por causa das respectivas funções e, por
conseguinte, em princípio, pela sua capacidade ou maior conhecimento técnico na
matéria específica. A esse propósito, comparei os presidentes autoritários e
centralizadores (V. Geisel) às
grandes árvores na floresta, em torno das quais só se vê vegetação rasteira.
Daí o precípuo interesse do líder em tornar mais aberta a atmosfera, para que o
conhecimento ou a visão informada possa circular livremente.
Dilma, pelo
autoritarismo e a maneira com que trata os subordinados – de qualquer escalão –
não semelha cuidar desse aspecto, a que deveria, por interesse próprio, atentar
mais. JK é a sua antítese. Em geral
sorridente, atencioso, simpático mesmo, distinguindo grandes e pequenos, colhia
o melhor de cada um. A par de seus inegáveis dons e capacidade intrínseca, não
estranha que esteja entre os grandes presidentes da República.
A imprensa é rica
em episódios do autoritarismo de Dilma e da sua tendência ao secretivo. Como foi referido, democracia
é o regime aberto, onde a agenda de Presidente – e mormente em viagem – não se
supõe seja carimbada de confidencial
ou até secreta.
Querendo
ocultar suas escalas turísticas ou ad hoc
nas respectivas viagens, Dilma Rousseff corre o risco de tentar guardar ‘segredos
de Polichinelo’. Primo, porque em
país democrático, a cidadania deve, em princípio, saber onde está a Chefe da
Nação. Secondo e a fortiori, se se trata de escala turística – motivada em geral
pela falta de autonomia de voo do Aero-Dilma.
Por mais solícitos que sejam os serviços competentes, o assunto (a escala
turística ou não) irá transpirar mais cedo ou mais tarde.
Então, mesmo
contra a vontade, porque não sorrir para com os deveres de ofício? E é
inadmissível que, por causa de capela em Palermo, ou de restaurante em
Portugal, se tente dar ares de segredo de estado ao que não passa de um
capricho.
(a continuar)
(Fonte: O Globo)
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