segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

A Morte Cerebral do Cinegrafista Santiago

                           

      A morte cerebral do cinegrafista da TV Bandeirante, Santiago Ilídio Andrade, anunciada nesta manhã, aumenta exponencialmente a gravidade do delito cometido na manifestação de protesto contra o aumento das passagens, na quinta-feira, seis de fevereiro. O pobre Santiago, que estava ali a trabalho, foi covardemente atingido pelas costas por um rojão. Desde então, perdera a consciência e a operação cirúrgica a que foi submetido não impediu que, por falta de irrigação de parte do cérebro, lhe tenha sobrevindo a morte cerebral. Com a falta definitiva da consciência, a morte física é o seguinte e inelutável passo.

      Na verdade, a morte cerebral não é a antecâmara da Morte. Constitui, na prática, o seu anúncio, ainda que de forma embuçada.

      Nesse contexto, há um ataque contra o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL). Há fundadas dúvidas quanto à procedência de tais acusações. A propósito, o próprio Freixo declarou em nota: “Além de a fonte da informação ser de uma fragilidade absurda e de a própria ativista negar ter-me associado ao ocorrido, nenhuma prova concreta foi apresentada. Aqueles que afirmarem que o responsável pela explosão é ligado a mim terão que provar. Caso contrário, serão devidamente processados. Sempre repudiei a violência nos protestos, seja ela praticada por manifestantes ou policiais.” Além disso, pelo Twitter, Freixo ainda lembrou que Jonas (Tadeu Nunes) defendeu o ex-deputado Natalino Guimarães, preso em 2008 acusado de chefiar milícias na Zona Oeste. Freixo presidiu a CPI das Milícias que investigou Natalino.                         

      No lançamento da acusação a Marcelo Freixo, a participação de Jonas Tadeu Nunes merece atenção. Primeiro, lança suspeitas de ligações de Freixo com o black bloc. Mais tarde, segundo se depreende da transcrição de O Globo, reconsidera e volta atrás da imputação.

      Enquanto o delegado Maurício Luciano de Almeida, titular da 17ª DP (São Cristovão) estava reunido com Jonas Tadeu (que defende o tatuador Fabio Raposo), discutindo sobre a tipificação do crime que seria imputado ao jovem, uma suposta ligação de celular atendida pelo estagiário do advogado Marcelo Matoso acabou envolvendo o nome do deputado estadual Marcelo Freixo no caso. Segundo Jonas, o telefonema era da ativista Elisa de Quadros Pinto Sanzi, a Sininho, que afirmava oferecer apoio jurídico de pessoas ligadas a Freixo.

      O advogado ainda acrescentou que Sininho teria dito que tanto Fábio, quanto o homem ainda não identificado que atirou o rojão na direção do cinegrafista Santiago teriam ligação com Freixo.

      O deputado, sem embargo, negou veementemente qualquer ligação com Fábio ou o outro suspeito.

       A tal respeito, Jonas Tadeu Nunes refere: Fiz um termo circunstanciado registrando o fato na delegacia, porque me senti pressionado por aquela ligação da Sininho. Queria deixar registrado que, se eu fosse futuramente afastado do caso, foi porque pessoas usaram advogados ligados a um nome de peso para me substituir, não por incompetência minha ou algo do tipo. O termo acabou sendo registrado em nome do meu estagiário por um erro técnico, já que ele foi a pessoa que atendeu a ligação dela num primeiro momento. Mas fui eu que ouvi Sininho se referir ao Freixo. Como eu estava muito nervoso, resolvi registrar (segundo afirma o dito Jonas). Agora, com mais calma, tenho certeza de que usaram o nome do deputado indevidamente. Não acredito que ele tivesse tido tamanha falta de ética. A conduta dele seria diferente.

       No entanto, à imprensa, Sininho negou ter falado sobre qualquer ligação entre o homem que atirou o rojão e Freixo. A ativista foi convocada, contudo, para depor amanhã e esclarecer as declarações sobre o parlamentar.

       Por fim, a mãe de Fábio Raposo, Marise Raposo, confirmou que recebeu ontem um telefonema de Sininho, mas preferiu não revelar o teor da conversa. Disse, porém, acreditar que o filho (o tatuador Fábio) tenha algum tipo de ligação com o deputado Freixo.

Testemunhos sobre a agressão sofrida pelo cinegrafista Santiago.

       Na cobertura de O Globo, cabe registrar dois testemunhos de interesse.

       O presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, Wadih Damous, classificou como ‘irresponsabilidade criminosa’ o uso de rojões na manifestação contra o aumento das passagens de ônibus. Na avaliação de Damous, atos violentos em manifestações públicas devem ser repudiados, partam da polícia ou de manifestantes.

      “O Estado tem que entender que tratar como guerra a segurança pública e as manifestações só contribui com essa violência. O trágico episódio que vitimou o cinegrafista, no entanto, não deve servir de pretexto para criminalizar os atos públicos, que são um direito constitucionalmente assegurado.”

      Por sua vez, o antropólogo Lenin Pires, do Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos, da UFF, vai além: para ele “ o Estado necessita, urgentemente, criar  um protocolo de ação das agências públicas nas manifestações. Observa ele, nesse contexto, que pelo desenrolar dos acontecimentos, 2014 será um ano de muitos protestos, e que, apesar das experiências do ano passado, ainda não há uma iniciativa de interlocução.

     O governo precisa conversar com essa parcela da sociedade que se manifesta democraticamente, para garantir o direito de ir às ruas fazer suas reivindicações. Esses manifestantes legítimos nada têm a ver com os grupos autoritários  que aproveitam os protestos para tentar impor pela violência a ideia de que a democracia não tem valor algum. É preciso – assinala o antropólogo – permitir a manifestação legítima da sociedade e protegê-la desses grupos que querem ver o circo pegar fogo.

     Na avaliação de Lenin Pires, na falta do protocolo, a polícia acaba agindo  de forma autoritária. “Não podemos prescindir das agências públicas de segurança. Mas quando você manda o Batalhão de Choque para uma manifestação, está dizendo, de certa maneira, que considera ruim as pessoas protestarem. E isso não é bom para a sociedade.”    

 

(Fontes:  O Globo; O Globo on-line)

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