A morte cerebral
do cinegrafista da TV Bandeirante, Santiago
Ilídio Andrade, anunciada nesta manhã, aumenta exponencialmente a gravidade
do delito cometido na manifestação de protesto contra o aumento das passagens,
na quinta-feira, seis de fevereiro. O pobre Santiago, que estava ali a
trabalho, foi covardemente atingido pelas costas por um rojão. Desde então,
perdera a consciência e a operação cirúrgica a que foi submetido não impediu
que, por falta de irrigação de parte do cérebro, lhe tenha sobrevindo a morte
cerebral. Com a falta definitiva da consciência, a morte física é o seguinte e
inelutável passo.
Na verdade, a morte cerebral não é a
antecâmara da Morte. Constitui, na prática, o seu anúncio, ainda que de forma
embuçada.
Nesse contexto,
há um ataque contra o deputado estadual Marcelo
Freixo (PSOL). Há fundadas dúvidas quanto à procedência de tais acusações.
A propósito, o próprio Freixo declarou em nota: “Além de a fonte da informação
ser de uma fragilidade absurda e de a própria ativista negar ter-me associado
ao ocorrido, nenhuma prova concreta foi apresentada. Aqueles que afirmarem que
o responsável pela explosão é ligado a mim terão que provar. Caso contrário,
serão devidamente processados. Sempre repudiei a violência nos protestos, seja
ela praticada por manifestantes ou policiais.” Além disso, pelo Twitter, Freixo ainda lembrou que Jonas
(Tadeu Nunes) defendeu o ex-deputado Natalino Guimarães, preso em 2008 acusado
de chefiar milícias na Zona Oeste. Freixo
presidiu a CPI das Milícias que
investigou Natalino.
No lançamento da
acusação a Marcelo Freixo, a participação de Jonas Tadeu Nunes merece atenção. Primeiro,
lança suspeitas de ligações de Freixo com o black
bloc. Mais tarde, segundo se depreende da transcrição de O Globo, reconsidera e volta atrás da
imputação.
Enquanto o
delegado Maurício Luciano de Almeida, titular da 17ª DP (São Cristovão) estava
reunido com Jonas Tadeu (que defende o tatuador Fabio Raposo), discutindo sobre
a tipificação do crime que seria imputado ao jovem, uma suposta ligação de
celular atendida pelo estagiário do advogado Marcelo Matoso acabou envolvendo o
nome do deputado estadual Marcelo Freixo no caso. Segundo Jonas, o telefonema
era da ativista Elisa de Quadros Pinto Sanzi, a Sininho, que afirmava oferecer apoio jurídico de pessoas ligadas a
Freixo.
O advogado ainda
acrescentou que Sininho teria dito
que tanto Fábio, quanto o homem ainda não identificado que atirou o rojão na
direção do cinegrafista Santiago teriam ligação com Freixo.
O deputado, sem
embargo, negou veementemente qualquer ligação com Fábio ou o outro suspeito.
A tal respeito,
Jonas Tadeu Nunes refere: Fiz um termo circunstanciado registrando o fato na
delegacia, porque me senti pressionado por aquela ligação da Sininho. Queria
deixar registrado que, se eu fosse futuramente afastado do caso, foi porque
pessoas usaram advogados ligados a um nome de peso para me substituir, não por
incompetência minha ou algo do tipo. O termo acabou sendo registrado em nome do
meu estagiário por um erro técnico, já que ele foi a pessoa que atendeu a
ligação dela num primeiro momento. Mas fui eu que ouvi Sininho se referir ao Freixo.
Como eu estava muito nervoso, resolvi
registrar (segundo afirma o dito Jonas). Agora, com mais calma, tenho certeza de que usaram o nome do
deputado indevidamente. Não acredito que ele tivesse tido tamanha falta de
ética. A conduta dele seria diferente.
No entanto, à
imprensa, Sininho negou ter falado sobre qualquer ligação entre o homem que
atirou o rojão e Freixo. A ativista foi convocada, contudo, para depor amanhã e
esclarecer as declarações sobre o parlamentar.
Por fim, a mãe
de Fábio Raposo, Marise Raposo, confirmou que recebeu ontem um telefonema de
Sininho, mas preferiu não revelar o teor da conversa. Disse, porém, acreditar
que o filho (o tatuador Fábio) tenha algum tipo de ligação com o deputado
Freixo.
Testemunhos sobre a agressão sofrida pelo cinegrafista Santiago.
Na cobertura de
O Globo, cabe registrar dois testemunhos de interesse.
O presidente da Comissão Nacional de
Direitos Humanos da OAB, Wadih Damous, classificou como ‘irresponsabilidade
criminosa’ o uso de rojões na manifestação contra o aumento das passagens
de ônibus. Na avaliação de Damous, atos violentos em manifestações públicas
devem ser repudiados, partam da polícia ou de manifestantes.
“O Estado tem que entender que tratar
como guerra a segurança pública e as manifestações só contribui com essa
violência. O trágico episódio que vitimou o cinegrafista, no entanto, não deve
servir de pretexto para criminalizar os atos públicos, que são um direito
constitucionalmente assegurado.”
Por sua vez, o antropólogo Lenin Pires, do Instituto de
Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos, da UFF, vai
além: para ele “ o Estado necessita, urgentemente, criar um protocolo de ação das agências públicas
nas manifestações. Observa ele, nesse contexto, que pelo desenrolar dos
acontecimentos, 2014 será um ano de muitos protestos, e que, apesar das
experiências do ano passado, ainda não há uma iniciativa de interlocução.
O governo precisa
conversar com essa parcela da sociedade que se manifesta democraticamente, para
garantir o direito de ir às ruas fazer suas reivindicações. Esses manifestantes
legítimos nada têm a ver com os grupos autoritários que aproveitam os protestos para tentar impor
pela violência a ideia de que a democracia não tem valor algum. É preciso –
assinala o antropólogo – permitir a manifestação legítima da sociedade e
protegê-la desses grupos que querem ver o circo pegar fogo.
Na avaliação de Lenin Pires, na falta do protocolo, a
polícia acaba agindo de forma autoritária.
“Não podemos prescindir das agências
públicas de segurança. Mas quando você manda o Batalhão de Choque para uma manifestação, está
dizendo, de certa maneira, que considera ruim as pessoas protestarem. E isso
não é bom para a sociedade.”
(Fontes: O Globo; O Globo on-line)
Nenhum comentário:
Postar um comentário