sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Ganho Secundário

                                               

      Essa expressão é usada em psicanálise, e se reporta a situações desfavoráveis vivenciadas por um paciente que, no entanto, são por ele aceitas, por lhe trazerem vantagens, as quais apesar de menores, fornecem certa compensação ao paciente. Nesses termos, embora a 'solução' não seja a melhor, ela se apresenta para o paciente como algo que lhe dê menos insatisfação. É o chamado ‘mal menor’.

      Embora haja diferenças, há certa similitude entre a atual atitude da mídia no que tange à sua postura crítica anterior quanto ao comportamento do Dilma I, em termos econômicos e financeiros, se lhe aplicarmos o conceito acima enunciado, em uma eventual adaptação à macro-economia.

      Assim, as medidas tomadas pelo Ministro Joaquim Levy, da Fazenda, procuram enxugar a economia, combater a inflação, o excesso de gastos da administração, buscando evitar os déficits, com vistas a obter saldos e o consequente superávit no orçamento público. Um campo – que é muito suscetível às apresentações demagógicas – está no desperdício das pensões. A excessiva liberalidade do Brasil na concessão de pensões vitalícias a beneficiários jovens é um contrassenso, porque induz a maior peso para a previdência, e a criação de déficits nessa área.

      Desta forma, apresentada de maneira despojada, a política sugerida de maior atenção no campo das pensões – sobretudo para beneficiários jovens, que podem perfeitamente cuidar do próprio sustento através do trabalho – os cortes nas pensões não são política cruel, mas sim aquela adequada para uma faixa etária que pode  entrar no mercado de trabalho.

       Nessas condições, o Dilma I criou uma situação insustentável na economia. Uma política macro-econômica não pode ser  de ‘bondades’ que impliquem em orçamentos deficitários, em contas que não fecham. É notório que uma política de déficits cria uma situação inflacionária. Dilma I além de seguir uma linha de incentivo ao consumo, a implementou com cortes nos impostos para incentivar a produção e venda de automóveis de passeio para as classes C e D.  Esses créditos tributários implicavam em menor renda agregada do Estado, e contribuíam por conseguinte para que o Erário caísse no vermelho.

       Essa política de incentivo ao consumo também foi aplicada para as beneficiárias do Minha Casa, Minha Vida (em geral, pela sua posição familiar, se tem mais confiança na mulher como garante das aquisições em bens duráveis).  A grande despesa do programa foi aumentada com créditos para a aquisição de eletrodomésticos. Tudo isso tem sido agora cortado pela tesoura da Fazenda, que busca equilibrar os gastos fiscais com a realidade orçamentária.

      Outra visita inevitável são as chamadas cobranças administradas. Os preços consequentes não são reais, na medida em que implicam em despesas do Erário com o objetivo de criar um reino de fantasia, i.e., as tarifas dos principais serviços públicos muita vez artificialmente contidas pelos  subsídios oficiais.  Ora, se se quer controlar a inflação – e não montar reinos do faz-de-conta – os índices de preços devem corresponder à realidade, pois o subsídio apenas mascara a inflação e põe um relógio a funcionar para o inexorável estouro dos chamados ‘preços administrados’, que são uma espécie de Vila Potiemkin (como as encenadas pelo personagem para a Tzarina Catarina dita a Grande, em sua viagem através da campanha russa).

       O Dilma I criou as condições que aí estão para o acréscimo dos preços inflacionárias e para os déficits nas contas governamentais, com repercussões graves na economia. O Plano Real foi para o brejo das almas por especial cortesia de Dilma Rousseff, e agora o Ministro Levy cuida de preparar um Ajuste Fiscal para recolocar a economia nos trilhos.

       Ora, como não há almoço grátis, todas essas medidas afetam interesses da população. Há setores da atividade produtiva, que esqueceram há muito de que o ‘produtivo’ na sua atuação implica em gestão responsável de recursos, e não na política de Gerson, que quer levar vantagem em tudo...

       A sociedade brasileira enfrenta uma crise nesse aspecto. Há segmentos, como por exemplo, o Congresso que parece seguir uma linha que o distancia da sociedade de gente séria e trabalhadora. A coleção de ‘bondades’ do Presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ) repisa os piores excessos de parlamentos corruptos, como v.g. o italiano.  Cunha reintroduziu a passagem aérea para os cônjuges de deputados, o que tenha sido suprimido em função do escândalo das passagens em outra legislatura, em que o próprio Gabeira se penitenciou de passagens dadas às filhas em viagens para o Havaí... O sistema de trabalho do Congresso brasileiro, com atividade integral nas 4ªs feiras, e rápida presença nas 3ªs e 5ªs configura situações – que abarcam os serviços complementares – nada têm a ver com o esquema de trabalho do Povo soberano. Não é de estranhar, portanto, que para o cidadão, Reguffe seja uma exceção (este representante de Brasília tem horário corrido, renunciou a boa parte da chamada verba de gabinete, e trabalha em tempo integral no Congresso) e os demais deputados e senadores a regra, o que explica o baixo conceito de nossos parlamentares perante o Povão, que não se sente por eles representado.

         Assim, o esforço de Joaquim Levy em fazer que o Dilma II seja o regresso a uma situação normal na economia, com a volta aos índices anteriores, não deveria ser tratado pela mídia sob uma luz negativa. Depois de apresentar o descalabro anterior também negativamente, a mídia não deve encarar as medidas corretivas do Ministro da Fazenda como uma espécie de ganho secundário .  Na verdade, a política fiscal atual visa a criar a passagem para um Brasil que por enquanto não existe, a saber: sem inflação, com contas públicas transparentes, sem as chamadas capitalizações (amadas por Lula, que as via como criação mágica de recursos fiscais, o que decerto não corresponde à realidade) e boa situação fiscal. É o próprio ambiente ideal para o retorno à realidade de uma Petrobrás recuperada, sem propinas e sem aparelhamento partidário. Será pedir muito ?

 

 
( Fontes subsidiárias:  O Globo, Folha de S. Paulo ) 

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