domingo, 15 de fevereiro de 2015

Colcha de Retalhos C 6

                                    
Intervenção russa na Ucrânia

 
      Um acordo fraco, como o de Minsk 2, é a consequência de concessões inadmissíveis.  Segundo foi explicitado pelo lado ocidental, decorreu de exigência russa que o cessar-fogo não fosse imediato. Terá sido para garantir este ponto fundamental que Putin afirmou que a noite exigida pelas discussões do acordo não foi decerto a melhor de sua vida...

       Talvez seja modéstia do senhor do Kremlin, pois no fim de contas conseguiu o que queria, uma extensão de setenta horas para a entrada em vigor do cessar-fogo (que o Ocidente desejara fosse imediato).

       Gospodin Vladimir Putin empurrou para Kiev a responsabilidade do atraso, que se deveria à sua negativa de tratar com as ‘repúblicas’ de Donetsk e Luhansk. É realmente comovente o cinismo de Putin, ao por as suas criaturas rebeldes no mesmo nível de estados membros das Nações Unidas, como é o caso da Ucrânia.

       Por outro lado, soam como maviosos acordes para os ouvidos do Presidente russo a negativa da Merkel (e também de seu acompanhante François Hollande) seja de dar armas para Kiev defender-se, seja sobretudo de acolher Kiev na OTAN.

       Como Washington demonstra, houve concentração de armas pesadas russas, sobretudo no entorno da cidade de Debaltseve – que é contestado centro no entroncamento ferroviário da área oriental da Ucrânia. Além disso, a via de acesso a Debaltseve, com fracas e expostas defesas, acha-se agora ainda mais comprometida pelas minas que aí foram colocadas por forças rebeldes e russas.  É por isso que Putin fincara pé em que o cessar-fogo não fosse imediato. O seu pessoal precisava de tempo para inviabilizar qualquer entendimento que favorecesse Kiev...

       Se se contempla o mapa, verifica-se que a maior parte do território ucraniano a oriente se acha sob domínio ‘rebelde’, isto é das chamadas “repúblicas de Luhansk e Donetsk”, o que já as conforma dentro do figurino da Geórgia, vale dizer com a Abkazia do Sul e a Ossetia do Sul,  que são enclaves russos na Geórgia, assim como a Transnistria, que é estado-dependente da Rússia  na Moldova...

       Com a fraqueza da Ucrânia em armamentos  e a consequente porosidade de suas fronteiras, não será surpreendente que Moscou logre estabelecer como posições ‘temporárias’, mas na verdade permanentes esses enclaves em países que ousaram contrariá-la.

       Dados os antecedentes do imperialismo russo, não será  mensagem animadora para o Ocidente e para os países da região que nele confiam. 

  
As verdades populares no Carnaval

 
        Um dos fenômenos do Carnaval é a sátira política. Semelha importante que a discussão e a exposição de certas verdades não se confinem às páginas da mídia. Para que certos teatros e decorrentes posturas sejam desmascarados, tem grande relevância que o tríduo de Momo continue a desempenhar esta função de exposição e de crítica de costumes e políticos.

        O povão não é nem nunca foi bobo. Por isso, as posturas de Lula da Silva, como se fora a parte ofendida, assim como de Dilma – que tampouco nada vê a depor contra o Partido dos Trabalhadores -  o que intentou demonstrar o recente teatro de reuniões a portas fechadas do PT, como se fora a vítima inocente de campanha difamatória, a paródia carnavalesca de tais  práticas equivale a sátira veraz e bem-humorada do descarado aparelhamento petista do Estado, com os fenômenos do mensalão e agora do petrolão.

        Assim, a foto dos personagens carnavalescos de Lula e da Presidenta[1], com faixa presidencial e tudo, enquanto cartazes proclamam que o petróleo é nosso, mas a propina é deles,  é uma oportuna ressurreição da função crítica do Carnaval, vale dizer a demonstração de que o Povo não é, nem nunca foi bobo.

 
O hiperpatriota Maduro

 

        Sucessor de Hugo Chávez, Nicolás Maduro é um personagem decerto caricato. Lembram-se de Lord Altricham? Nos primeiros anos do reinado de Elizabeth II, esse senhor dizia sentir  dor no pescoço quando ouvia  a então voz esganiçada da jovem Rainha nas suas mensagens pelo rádio.

     Imagino o que sentiria hoje se visse na tevê o estranho personagem presidencial, que aí aparece em seus pronunciamentos fantasiado de bandeira venezuelana.

     Dada a situação calamitosa da economia da Venezuela, com a incompetência traduzida em garrafal ineficiência com falta geral de artigos de primeira necessidade – por causa da hiperinflação, da imensa corrupção e de estulta política cambial – a maneira de lidar com o problema encontrada pelo ex-caminhoneiro Maduro foi a de denunciar suposta tentativa de golpe militar, o que é – ou aparenta ser – manobra canhestra em buscar desviar as atenções da população da crise de governança na Venezuela.

     Com o lulismo e depois o dilmismo (que é versão piorada do primeiro), as relações  diplomáticas e políticas com os governos  do chavismo (e outros ismos na América do Sul ) ficaram por conta não mais do Itamaraty, mas do senhor Marco Aurélio Garcia.  Com a substituição da tradicional Política de Estado do Brasil, a diplomacia brasileira atravessa crise que esperamos não seja terminal, mas que tem dado os resultados esperados da orientação que abandonou a política de Estado, por uma de partido. Os resultados de tal (des)orientação estão aí, com reflexos sobre a diplomacia em geral, com o irresponsável corte de verbas e dotações de política exterior, tornando os nossos diplomatas reféns em certas situações, enquanto os expõem, por falta de meios adequados, a contágio não só de endemias rurais, mas de outras enfermidades de maior gravidade. Dado o caráter desastroso para a nossa economia em geral do Dilma 1 – não obstante premiado por quase todo o Nordeste e Minas Gerais com a reeleição – de certa forma a nossa política externa está sofrendo as consequências do desgoverno que Lula da Silva nos impingiu, fundado no fenômeno ‘mulher do lula’, em que alguém despreparado (mas indicado pelo grande guia) vence facilmente um adversário com muito maior experiência política e administrativa. Esse resultado político reflete outra realidade política, vale dizer, o despreparo da maioria de nosso corpo eleitoral para escolher o melhor candidato.            

 
O indiciamento de Cristina Kirchner

 

        A voz do povo argentino já a condenou como responsável pelo assassínio do promotor Alberto Nisman. A pífia proteção que foi dada ao intemerato servidor da Justiça pelos serviços estatais– seriamente empenhado em revelar responsabilidades do governo peronista no brutal, criminoso atentado à Associação Mutual Argentino-Israelita (AMIA), que deixara 85 mortos em 1994, e cuja autoria envolve fundadas suspeitas sobre o Hezbollah e o Irã dos Ayatollahs – já constitui motivo suficiente para indiciar o governo de Cristina Kirchner.

       Sucessor de Nisman, Gerardo Pollicita referendou os argumentos do promotor morto em serviço, e decidiu solicitar várias medidas para que se investiguem as acusações contra a Presidente, além de outros aliados do governo, como o ministro do exterior, Héctor Timerman, o líder sindical Luis D’Elia e o deputado Andrés Larroque. 

      Por enquanto, o novo Promotor não pediu que Cristina seja ouvida – como era intenção de Nisman, que se ocupava do caso desde 2004 – mas não está descartada a hipótese de que a presidente venha a ser intimada a prestar declarações, por escrito ou pessoalmente, caso a iniciativa seja referendada pelo juiz encarregado da questão, Daniel Rafecas.

       Como seria de esperar, o propósito do Promotor é apresentado por próximos de Cristina viúva de Kirchner como ‘golpismo judicial ativo’, na palavra do Chefe de Gabinete, Jorge Capitanich.  Este senhor, da ‘entourage’ da Kirchner, acusou ainda o promotor de tentar provocar ‘impacto político’ e ‘estrépito social’.

      Bobagens à parte, o estamento peronista demonstrou falta de qualquer princípio de ética ao aparentemente mercadejar o escambo comercial com a não-punição dos responsáveis pela hecatombe da Amia.

 

(Fontes:  Folha de S. Paulo, O Globo, The New York Times)



[1] V. primeira página da Folha de S. Paulo deste domingo.

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