A tendência das pessoas honestas é a de acreditar em
assertivas de boas intenções, mesmo que o comportamento pregresso do declarante
esteja em contradição com tais propósitos.
O
leitor do blog se recordará que se
registrou há pouco uma supostamente alvissareira disposição do governo Putin de não mais interferir nas
questões internas da Ucrânia, nem de
reforçar os separatistas de Donetsk e
Luhansk, no oriente daquele país com
‘voluntários’ e equipamentos bélicos.
Estaria o presidente de todas as
Rússias, depois da ilegal anexação da Criméia, jiboiando a suculenta conquista?
Na verdade, gospodin Putin pensava
engambelar o Ocidente com uma suposta tardia conversão ao respeito aos direitos
adquiridos e à boa convivência.
Há de parecer primário que Vladimir
Putin pense fazer o que bem entenda, enquanto chora lágrimas de crocodilo.
Porque a superpotência tem meios de observação que discernem facilmente as
tropelias desse senhor.
O Presidente Barack Obama, em discurso
na Casa Branca, declarou que “o governo russo precisa ver que suas ações tem
consequências”. Por “violar a soberania da Ucrânia e continuar a apoiar
separatistas”, dezesseis novas sanções foram aplicadas contra a Federação
Russa. Malgrado as patranhas de não-interferência de Putin, as sanções são ampliadas, mais duras e
restritivas do que as precedentes. Até agora as sanções eram pontuais,
direcionadas a autoridades russas (sobretudo as mais próximas do Presidente),
com congelamento de ativos(contas) no exterior e recusa a pedidos de visto.
Agora, há mais pimenta nas medidas
punitivas. As sanções do governo Obama vão vetar em especial o acesso ao
mercado de créditos superiores a noventa dias.
As empresas visadas poderão realizar apenas transações de curto prazo,
com exclusão de empréstimos a médio e longo prazos.
Os BRICS – grupo que inclui o R
de Rússia – tinham um dia antes divulgado comunicado em que condenavam sanções
econômicas sem o aval da ONU, o que é um recado claro aos
Estados Unidos pelas rodadas anteriores de punição ao governo Putin. Se o comunicado dos BRICS vinha a trazer água para o moinho de Putin, por quebrar-lhe o
isolamento, o alívio do senhor do Kremlin
terá sido passageiro. Com efeito, fazendo a Rússia parte do grupo, tanto a
origem quanto o alcance do comunicado era assaz limitado. E a Casa Branca achou
oportuno que Putin fosse confrontado com tal realidade, ao ser o anúncio das
sanções feito de forma concomitante com a reunião dos BRICS em Fortaleza.
Por outro lado, a condenação de
sanções econômicas sem o aval das Nações Unidas esquece adrede a circunstância
de que tais sanções jamais seriam aprovadas pela ONU, pelo simples detalhe de
que como membro permanente do Conselho de Segurança a Rússia dispõe de direito
de veto...
Não é de hoje que a Rússia de Putin tem
interferido em países como a Moldávia e a Geórgia, a pretexto de proteger
minorias de fala russa nesses países. O ataque à Ucrânia demonstra o apetite do
urso do Kremlin, eis que não há comparação entre a extensão do país de que Petro
Poroshenko é o presidente, com os demais, arrebanhados como gado para
integrarem a União Aduaneira de Moscou.
A Rússia, a despeito de arreganhar
os dentes ocasionalmente, e dispor de arsenal termonuclear, não tem a extensão
nem o poder político e econômica da antiga União Soviética que se derreteu no
começo dos anos noventa, e que antes era havida como a segunda superpotência.
Se a Federação Russa é apenas uma potência regional, como a alcunhou o
Presidente Obama, então a sua capacidade de fazer o mal sofre restrições, que o
ex-alto funcionário da KGB, Vladimir
Vladimirovich Putin terá presente, a despeito de
atividades em contrário. Não há dúvida que Moscou dispõe de trunfos
apreciáveis, e são esses trunfos que explicam as tíbias sanções da União Européia (exportação energética,
notadamente gás). Bruxelas acompanhou a iniciativa de Obama, mas cingiu-se a
pedir que bancos de investimento suspendam acordos financeiros com a Rússia.
Por outro lado, enganam-se aqueles
que pensam serem as sanções americanas de pequena monta. A Rússia, malgrado os
arreganhos imperialistas, atravessa um momento econômico-financeiro pouco
favorável. A economia está estagnada, e
os índices de popularidade de Vladimir Putin podem despencar, se o cidadão
russo sentir no bolso o custo e o peso de imiscuir-se nos assuntos internos de
país vizinho.
Como é notório, o meio financeiro se
pauta pela prudência. Se as retiradas de fundos do mercado russo se acelerarem
– à procura de ambientes não afetados por intervenções contrárias aos negócios
como são as sanções – a posição de gospodin
Putin continuará inexpugnável?
Trocando em miúdos, Vladimir Putin
pode espernear, mas em matéria de finanças a sua retaguarda está exposta.
( Fontes: Folha
de S. Paulo, New York Times )
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