Não é decerto por acaso que a declaração do porta-voz
da Chancelaria israelense, Yigor Palmor, verberou de forma inusitada, sem
dúvida grosseira, e, por conseguinte, nada diplomática, a iniciativa do Governo
brasileiro de chamar para consultas o seu embaixador em Tel Aviv.
Dentro do arsenal diplomático, se me
permitem o oxímoro, a chamada do respectivo chefe de missão é, nas relações
bilaterais, um dos recursos mais fortes da Chancelaria no que tange ao país em
que está representada.
Depois deste vem a ruptura de relações,
que geralmente decorre de graves faltas do governo do país junto ao qual está
credenciado o embaixador (os ministros de legação do passado já caíram em desuso).
Como as regras da diplomacia se baseiam
muito na etiqueta, a chamada para consultas é um pretexto de boa educação. Na
verdade, e na mor parte dos casos, o que se quer demonstrar é o desagrado com
determinada política, desagrado esse que pode ter motivação bilateral ou geral
(como o é no caso em tela).
Antes de analisar a declaração do
porta-voz, cabe sublinhar que a iniciativa do governo Dilma logrou o seu
objetivo, de que é prova irrefutável a exasperação do ministério do exterior e possivelmente
do próprio gabinete israelense. O senhor
Palmor não teria sido tão pouco diplomático e mesmo chulo, se a iniciativa de
chamar o embaixador para consultas,não pusesse um nervo israelense à mostra.
Se se trata de anão diplomático, Israel
é um deles. Apesar de ter relações com muitos países, na prática é grande o
isolamento em que operam os seus agentes diplomáticos. Na praxe das visitas –
que é norma consuetudinária entre as missões, embora assinale algum declínio -
semelha penoso verificar o isolamento diplomático em que vivem os seus
representantes, muitos deles com preparo e tirocínio.
Esse isolamento não é só decorrente da
circunstância de que as missões do Estado de Israel carecem de muita segurança.
O fator preponderante dessa situação é a questão do povo palestino, e das
notórias injustiças praticadas no que concerne a essa comunidade pelo governo
de Tel Aviv.
Uma, senão a principal chaga do mundo
contemporâneo, está na desigualdade de tratamento às comunidades judaica e
palestina. A despeito das tentativas de pôr cobro a tal situação, de que são
prova os Acordos de Oslo, e as iteradas mediações de presidentes americanos –
máxime de Jimmy Carter e de Bill Clinton – a história contemporânea é um
registro desalentador de injustiça sistêmica contra o povo palestino, de que é
prova a comum iniquidade nos juízos relativos à posse da terra – com a
espoliação dos agricultores palestinos em favor dos ditos colonos hebreus, que
se vão apossando de boa parte da margem ocidental do Jordão, com o apoio até da
justiça de Israel.
A posição diplomática do Brasil,
desde o Ministro Antonio Francisco Azeredo da Silveira, assinalou importante
evolução, no sentido de assegurar os direitos da comunidade palestina no
contexto da questão do Oriente Médio. Se o Ocidente através da Grã-Bretanha
assegurou pela Declaração Balfour, de
novembro de 1917, em mensagem à comunidade judaica o estabelecimento na
Palestina, é importante que os direitos da comunidade palestina sejam
respeitados em termos de igualdade, o que até o presente não tem evoluído –
malgrado resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas – para acordo em
que os direitos dos palestinos se tornem efetiva realidade.
Se a história mostra alguma coisa,
será que nem muros, nem bantustans dão às entidades supostamente mais poderosas
a segurança e a normalidade nas relações. No caso em tela, a Justiça é a força mais relevante
para estabelecer-se a real e pacífica coexistência de duas comunidades
históricas da Palestina – a judaica e a árabe-palestina.
Dessa realidade já existe em Israel
uma corrente – ainda minoritária – quanto
à necessidade de repartição da terra baseada na justiça, e não na
expulsão sistemática da componente palestina. Os Estados Unidos dariam um bom
exemplo se se empenhassem pelo cumprimento das Resoluções nesse sentido do
Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Enfiar a cabeça na areia, e
continuar a atual política, equivalerá à certeza de que novas guerras
eclodirão, porque a injustiça é demasiado pesada para que possa haver
convivência pacífica entre as áreas confinadas em que é tolerada a presença da
comunidade palestina, e as áreas na prática desenvolvidas e de alto padrão de
vida, ocupadas pelo Estado de Israel. A reconciliação será sempre possível,
desde que fundada sobre a boa fé e a disposição de um entendimento paritário.
A História está bem aí para
evidenciar que os muros – limes – são de pouca valia para os Impérios. Basta
ver o Romano, para dar-se conta que há outras soluções mais inteligentes e
duradouras.
Que tal experimentar a paz?
(Fontes subsidiárias:
O Globo, Folha de S. Paulo)
Um comentário:
O que dizer então da total surpresa com que o governo recebeu a reação israelense? Antes mesmo da ofensa o Brasil já vestia a carapuça, ao não esperar grandes consequências de seu ato.
Infelizmente, por questões ideológicas o Brasil jogou fora o enorme capital moral que a sua diplomacia construiu, e converteu-se realmente em um anão. Falar em conselho de segurança hoje em dia beira o ridículo.
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