O que ocorreu ontem, em Fortaleza, numa das maravilhas levantadas para a Copa, foi
tragédia anunciada.
Por que nos últimos encontros,
sobretudo desde a partida com o Chile, o jogo de Neymar perdera um pouco de sua
alegria e desenvoltura ? O craque da seleção vinha sofrendo perseguição
sistemática por muitos de seus marcadores. Dada a diferença de habilidade,
via-se claramente para onde se voltava o combate de seus adversários.
Como se fôssemos ignaros da realidade
madrasta, chegávamos a reclamar ou do ‘desaparecimento’ de nosso maior
atacante, ou de seu menor brilho e desenvoltura. Ora, a mensagem, como a regra
dos juízes, aparecia clara na parede, mas não a víamos em toda a sua extensão.
Pois o talento e a genialidade se desestabilizam. Neymar é quase um menino, mas
já o seu futebol entremostra enorme potencialidade. Pelé não surgiu na Suécia,
mas aí revelou-se para o mundo, e, por consequência, para o estabelecimento caboclo.
Os tempos então eram melhores, e havia espaço para os grandes valores jogarem.
Logo, no entanto, a deslealdade – dada a impossibilidade dessa gente de lidar
com o gênio de Pelé – se tornaria mais agressiva e desenvolta. No Chile, por
contusão Pelé não pode atuar, mas os brucutus não se tinham dado conta que
tínhamos também Garrincha e Amarildo.
E no campeonato de 1966, houve de tudo,
mas no que tange ao Brasil, a boçalidade das defesas se desencadeou contra
Pelé. Naquele tempo, os juízes ainda não tinham os famosos cartões, e o nosso
maior jogador foi afastado pela violência tão descarada, quanto a omissão dos
árbitros era a norma. O famoso dito de Catão – delenda est Carthago! – terá
sido adaptada para um ‘destrua-se o time do Brasil’, pois não se admitiria que
nossa terra arrebatasse mais um título e se tornasse tricampeão (o que na época
não era a fajutagem atual em que aquele que conquistou três campeonatos – pouco
importa se de forma consecutiva – vira tricampeão. Na copa da Inglaterra, se o
Brasil a levantasse, seríamos realmente tricampeões...
Não recordo em vão o exemplo do maior
jogador de todos os tempos – cujos mil e tantos gols tive o prazer de assistir
em um documentário que deveria ter melhor distribuição – pois Neymar é hoje o
único craque no Brasil, cujo talento, se ainda não atinge o de Pelé, bem
poderia dele aproximar-se, dadas as imensas avenidas que o seu futebol alegre e
inventivo nos vai descortinando.
A partir notadamente de Brasil x
Chile, se reclamou que o maior craque brasileiro da atualidade não surgia nas
partidas tão afirmativo e desestabilizador, quanto antes.
Esquecíamos que ele sofria uma caça
impiedosa, tão mais ameaçadora quanto solerte e inopinada. Pelas suas
qualidades extraordinárias, pelo seu natural diferenciamento da imperante
mediocridade, os técnicos e seus eventuais assessores terão passado a
recomendar medidas que julgavam apropriadas para neutralizar-lhe a ameaça.
Isto foi num crescendo, e na partida
com o Chile por primeira vez se tentou contê-lo, não por veladas ameaças, mas
pela violência que apesar de sinuosa e solerte, sempre se rasga abertamente
para que a vislumbrem aqueles que têm olhos para ver.
Foi no caso do Chile, em que defensor aplicou em Neymar violento
tostão, sob as vistas do juiz inglês Howard Webb, que sequer pestanejou. Em uma
atitude que ameaça tornar-se corriqueira no que concerne ao time do Brasil, os
cartões amarelos não são tirados dos bolsos para tais eventualidades.
Quando uma pessoa é vítima de
caça desapiedada, é natural que ela trate de proteger-se. E a maneira de
fazê-lo, se parece ir de encontro ao que deseja a boçal violência, é também a humana
maneira de resguardar-se para permanecer inteiro na partida.
Mas como Neymar é Neymar, e a sua
presença representa ameaça aos adversários, sobretudo aos medíocres mas não só
a eles, a sua válida permanência em campo se tornou um precário exercício. Tal
se agrava mais quando o juiz é omisso, ou só atual no que respeita às
‘sugestões’ que receba das instâncias da FIFA.
Não sou eu quem comentou sobre o
estranho comportamento de muitos desses árbitros no que concerne ao escrete
canarinho, como se incomodasse a seus superiores a possibilidade de que o famoso
hexacampeonato vire realidade.
O rosário de juízes que têm apitado
as partidas da seleção se não confirma redondamente tais suspicácias – e essa
gente, cortesãos como são, se cuidam de deixar sinais inequívocos – sopra para
que o fogo não desapareça. Começou pela partida no Itaquerão, com a designação
do mesmo juiz japonês que presidira à nossa eliminação pela Holanda. Foi
lembrete decerto desagradável, pois se ele nada fizera para causar o desastre,
há de convir-se que não era o nome mais auspicioso para o início da caminhada.
Mas sua Senhoria deixaria a respectiva
mordida. Singularizou, com riso oriental, a nosso Neymar, a quem distinguiu
com um maroto cartão amarelo. Nesse contexto, todo o regulamento é
esquadrinhado para justifica-los se é para prejudicar-nos (V. também o último
aplicado em Thiago Silva).
E sem nos determos em ninharias,
para que não seja inquinado de parcialidade, transcrevo o juízo de O Globo:
“Carlos Velazco Carballo foi tolerante com a violência e economizou nos
cartões. Vai levar de lembrança da Copa o erro em não punir sequer com cartão
amarelo a entrada violenta do lateral direito colombiano Zúñiga, que causou a
fratura da terceira vértebra lombar de Neymar”.
O Senhor Velazco Carballo deixou-se
dominar pelos hermanos colombianos,
como foi referido pelos narradores da partida. Além disso, nada viu na brutal
joelhada de Zúñiga, aplicada por trás, e com violência a reclamar cartão
vermelho. Apático no que tange à Colômbia, viu Neymar, aos gritos de dor, ser
retirado de campo de maca. É esse acaso o padrão Fifa de arbitragem ?
Há um ensurdecedor silêncio de
parte de autoridades brasileiras, tanto da CBD – que para alguma coisa deveria
servir -, quanto do governo federal, que não desdenha decerto surfar na
popularidade de grandes jogadores.
Para quem ouviu apodos e ameaças
como a de aplicar pontapés no traseiro, será que uma falta tâo desleal, quanto
grave – que afasta do Mundial talvez a sua maior estrela – não faz por merecer
uma demonstração de apreço ao nosso maior craque ?
Pois Neymar, em se querendo ou não, nos
é privado por padrões de jogo tolerados na prática por árbitros
que não se impõem em campo.
O silêncio das autoridades
brasileiras – esportivas e políticas – seria ignominioso e se colocaria no
mesmo plano da omissão das instâncias da
FIFA, que são vocais e desinibidas quando vêem
seus interesses ameaçados.
( Fonte: O Globo )
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