quinta-feira, 19 de março de 2015

Crise toma conta do Governo

                                    

             Em momentos de crise, inimigos, adversários e até amigos viram ameaças e como tal são tratados.

             Com o governo à deriva, os eventos se sucedem e eles não estão aí para dourar a imagem da Senhora do Planalto.

             Que uma administração de repente se descubra acossada e sitiada, como é o caso do governo de Dilma Rousseff, a confusão se instala, e os ‘conselhos’, na verdade, mais parecem tiros a esmo, de uma cidadela que se sente sitiada, e que está sem aparente comando.

              Em tais transes, pensa-se até nas vantagens comparativas do parlamentarismo. Com tal rebordosa, em que manifestações de milhões se contrapõem à raquítica jornada das entidades amamentadas pelo PT, não se pode chorar sobre o leite derramado.

              A Constituição de 1988 foi feita pensando-se no formato parlamentar, que no Brasil fora abandonado desde a quartelada de quinze de novembro, que derrubara a única república nas Américas, no dizer de estadista argentino.

              Houve até referendo e a república continuou presidencialista, ainda que a redação da Constituição Cidadã (conforme Ulysses Guimarães) guarde marcas de seu destino inicial.

              Em tais momentos, é vão cogitar de instrumentos que seriam mais flexíveis do que a norma vigente.

              O erro inicial, no entanto, aí está. Na arrogância de criador, Lula da Silva, impedido de pleitear o terceiro mandato (o que importaria de vez o chavismo para essas bandas) arrefeceu caminho e preparou a discípula para esquentar-lhe o assento.

              Malgrado ponderações em contrário, a que aludiu a seu tempo Ricardo Noblat, o torneiro-mecânico se aferrou ao respectivo projeto, e as consequências ainda estão pelo caminho.

              O primeiro mandato da discípula foi desastroso, pois trouxe de volta a inflação alta, pactuou (após o débil arreganho da chamada faxina) com a corrupção, que já era sistêmica e que, dentro de lógica infernal, lograria manter segredos que só seriam desvelados em praça pública depois dos comícios e da vitória, relativamente apertada, da anterior candidata de algibeira, que agora tomara o freio nos dentes, e se sentira forte o bastante para enjeitar a tentativa do próprio criador de voltar ao Planalto.

              É mister de todo segredo cair em praça pública. Assim, malgrado o escarmento do mensalão, o ativismo de um mestre-sala  não logrou barrar-lhe o caminho, a despeito da assistência que tinha dentro da praça inimiga. Não contaram com Joaquim Barbosa, sua capacidade e determinação. Hoje, a coisa está sendo aguada, porque a tropa do forte vem mudando, por maneiras que só o Senhor Futuro há de revelar.

              Mas desse figurino, havia outro filhote, bem mais parrudo e nocivo. É o que hoje se vê no chamado Petrolão, mecanismo infernal que desarvorou a Petróleo Brasileiro S.A., e que é ainda batalha em curso. Se os heróis estão na magistratura e na Procuradoria, afora os vilões pululam. Há os de baixo e  alto clero, mas resta a impressão de que ainda estão excluídos dos instantâneos revelados os grandes ideadores e mandantes. É uma gesta em progresso, e nessa característica residem muitos dos percalços e dos supostos mistérios.

                  Neste momento histórico, assistimos, entre a perplexidade e a indignação, o debater-se de um governo que foi adrede confiado  a mãos inexpertas. Não é decerto só culpa de eleitorado por vezes amorfo, que preza mais as migalhas que lhe jogam da mesa, do que a qualidade e a folha corrida dos candidatos ao Planalto.

                   Luiz Inácio Lula da Silva se gaba (ou se gabou) de lograr eleger postes no Brasil. Como se sabe, fora no passado uma singular forma de protesto da cidadania brasílica de ‘eleger’ animais ou mesmo postes. Diz muito mal da democracia brasileira que um presidente saído dos retirantes do Nordeste venha mais tarde a jactar-se de conseguir o feito de eleger postes, com Dilma na presidência e Haddad no governo de São Paulo.

                   Em termos de saber e preparo, não há comparação entre os dois. Ironicamente, contudo, o mais preparado foi guindado a posto municipal, ainda que da maior prefeitura de nossa terra.

                   Quanto à Dilma, Lula verificou – para seu desconforto – que quanto à reeleição (essa nociva invenção de FHC) a antiga maravilha como chefa de gabinete ora prescindia de qualquer ajuda do antigo mestre.

                   Estamos vendo nessa época interessante – infelizmente no sentido chinês do termo – o quão danosa pode ser essa soberba de impingir escolhas ao povo (v.g., a mulher do Lula em 2010).

                   Hoje, em meio à senhora dona Crise, não é que vaca desconheça bezerro, mas a falta de direção, a anomia (do grego a-nomos, falta de lei ou de norma) é quem manda, com baixarias no Congresso, e com estultices da chamada Secom. O ministro encarregado – nesse gabinete há ministros para tudo – soltou documento, e viajou autorizado para os Estados Unidos.  Cito o que refere a coluna de Merval Pereira: ‘As responsabilidades da comunicação oficial do governo federal e as do PT/Instituto Lula/bancada/blogueiros são distintas.’ Após asseverar o ululante óbvio, segue adiante: ‘É natural que o governo (este ou qualquer outro) tenha uma comunicação mais conservadora, centrada na divulgação de conteúdos e dados oficiais.’  Até aí, se pronuncia o Conselheiro Acácio. Como sempre, a mordida do escorpião vem no fim: “A guerrilha (sic) política precisa ter munição vinda de dentro do governo, mas ser disparada por soldados fora dele” (sic!).

                    O bom governo não carece de tais meios. Estamos em outro campo,  e a lidar com outra gente. Quando se põe confiança em tais instrumentos, em que a verdade e a lisura são as gatas borralheiras, não creio que o governo sem rumo de dona Dilma careça de outra mais corrosiva definição.

 

( Fontes: O  Globo; Folha de S. Paulo )     

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