quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Picadinho à brasileira

                                       
Juiz Federal declara prescrito crime da Ditadura

 
      O juiz federal substituto Fernando Porto, da 5ª Vara Federal Criminal, em São Paulo, declarou prescrito o crime de ocultação de cadáver atribuído a dois agentes da ditadura militar, o Coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra e o delegado aposentado Alcides Singillo. Eles foram acusados de ocultar o corpo do militante Hirohaki Torigoe, assassinado pela repressão naquela cidade, em janeiro de 1972.
     Em sua denúncia, os procuradores sustentaram que Torigoe foi levado vivo para o DOI-CODI (centro do Exército que Ustra chefiou entre 1970 e 1974). Lá morto em sessão de tortura teve o corpo – a prova do delito – enterrado sob nome falso.

     A tese do Ministério Público se sustenta na doutrina moderna sobre os crimes contra os direitos humanos. Não há prescrição para esse tipo de delito, de acordo com a nova jurisprudência. Fundados em tais ditames, que são seguidos pela justiça europeia e interamericana, os procuradores afirmaram que o crime é permanente e não está anistiado, visto que o cadáver de Torigoe não foi localizado até hoje.

 
Referendo no Egito

 
     O ex-presidente Mohamed Morsi, derrubado pelo exército e pela a própria incompetência, ainda não foi julgado, mas a Irmandade Muçulmana, mais uma vez declarada fora da lei, terá perdido oportunidade histórica de implantar-se politicamente. A ineficiência de Morsi e seu governo, e a radicalização da Irmandade são as causas principais da derrocada da frágil democracia egípcia, que fora decorrência do levante contra o ditador Hosni Mubarak, num dos primeiros movimentos da chamada Primavera Árabe.

    Nesta semana, os egípcios foram uma vez mais às urnas, desta feita para referendo constitucional relativo a uma nova Constituição. Restabelece um dado permanente na terra dos Faraós, que é a supremacia do exército, instalada desde 1952, com o golpe contra o Rei Faruk.

    De forma que surpreende os observadores não-egípcios, o atual chefe das Forças Armadas, o general Abdel Fatah al-Sisi que goza de enorme popularidade. Talvez a incerteza do governo da Irmandade Muçulmana, e a marcha batida para a islamização constitucional do Egito tenham predisposto a sociedade civil a uma administração mais isenta, com a garantia dos direitos fundamentais, sem os retrocessos do gosto da Irmandade.

    Dada a boa recepção do texto constitucional pela grande maioria dos eleitores, presume-se que o passo seguinte seja o anúncio por al-Sisi  de sua candidatura à presidência do Egito.

 
A  Sopa  de  Legendas  

 
    Existem no Brasil trinta e dois partidos devidamente legalizados. Não faz muito a sociedade assistiu com certa estranheza que na última leva de partidos a serem inscritos nesse dúbio panteon, o Tribunal Superior Eleitoral aprovou dois de escassa consistência político-ideológica, e negou registro àquele que tinha maior apoio. As razões que motivaram a recusa se basearam em uma peculiar atitude de cartórios eleitorais, que encontraram muitos problemas em assinaturas de eleitores. Como o leitor já há de presumir, trata-se do partido Rede de Sustentabilidade que não por acaso tinha por principal subscritora Marina Silva.

    O Supremo Tribunal Federal derrubou no passado  tímida tentativa de estabelecer uma barreira para evitar a proliferação das legendas. Malgrado a lei tivesse muitas exceções – algumas até de caráter antiquário como a da preservação das legendas históricas – mesmo assim o STF preferiu interpretar à risca a determinação constitucional de que não deve haver exclusão ideológica.

    O exemplo de outros países tem demonstrado a falta de sustentabilidade dessa suposta liberdade ideológica, que passou, pelo próprio excesso, para a descarada instrumentalização do preceito, a ponto de que nos avizinhemos  cada vez mais do ridículo.

    Além de encher o horizonte constitucional com inúmeras associações que nada tem por trás , senão a pretensão de ocupar entre os chamados nanicos um conveniente nicho, com tudo aquilo a que supostamente tem direito, aí incluídas as verbas do Erário.

    Há um limite para a fragmentação ideológica que é aquela do bom senso. Se caímos na opção congolesa – afogados por uma sopa de números – será tarefa hercúlea determinar que ideologia é defendida por este ou aquele partido.

    Dentre os sofredores por esse erro de avaliação, estará decerto o público, que é forçado à enxurrada de inanes inserções publicitárias, em que pateticamente desconhecidos entoam loas a partidos que, na mor parte dos casos, constituem ressurreições de antigas legendas (a par da maré de novas, com muitas letras e pouca ideologia).  Por crescente intrujice do Poder Legislativo, a propaganda política obrigatória invade todos os espaços do horário nobre da tevê, com repetições a cada intervalo publicitário. A maioria é de pequenos partidos e nanicos que, por falta de mensagem e fundos, repete a mesma, sem a menor preocupação de valer-se de espaço que poderia ser melhor ocupado.

    De decisão sem-dúvida bem intencionada – aquela do respeito a todas as ideologias – o vício redibitório (vale dizer, o seu erro original)  inquina  por força própria a tudo contaminando e desfigurando. Um direito mal-compreendido e utilizado em excesso transforma-se em caricatura daquilo que pretende instituir. É o caso da decisão do Supremo proibindo qualquer restrição ao registro de partidos políticos.

    Como diz a sabedoria popular: deu no que deu. Que tal restaurar o meio termo aristotélico e o perene bom senso, que  evitaria muitos inconvenientes, inclusive aquele do ridículo ?

 

(Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo, Rede Globo)

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