quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Esse País Tem Jeito ?

                                        

        A tragédia provocada pelo caminhão-caçamba na Linha Amarela, na manhã de 28 de janeiro de 2014, pode ser objeto não apenas das devidas lamentações e protestos, mas também de providências por uma vez sérias e abrangentes.
        A revista Economist, em um de seus números, referiu o dito relativo ao Brasil de que é um país onde existem muitas leis, que, infelizmente, na sua maior parte, não são aplicadas.

        Antes de verificar, na medida do possível, se tal acusação genérica procede, é importante lembrar que muita vez quem lança tal tipo de juízo, que beira o achincalhe, deveria igualmente olhar para o próprio umbigo e tentar verificar se a nacionalidade respectiva está acima de qualquer doesto e ofensa.
        Os ingleses – reporto-me às classes C e D - não deixam amiúde boa impressão por onde passam. Recordo-me, a propósito, de aeroporto em Jacinto (ilha grega), que deixaram coalhado de latinhas de cerveja, enquanto aguardavam o voo charter que lhes iria transportar de volta à mãe-pátria.

       Tal tendência a desconhecer das latas e outros repositórios para o lixo não se restringe decerto às acanhadas dependências dos aeroportos da Grécia insular.  Por ocasião de jogo de futebol importante, entre equipe helênica e a correspondente inglesa, houve invasão de torcedores britânicos. Se os temíveis hooligans seriam coisa do passado, os seus sucessores continuam a mostrar  comportamento antissocial.

       Quiçá para manifestar o próprio desagrado com a circunstância, decerto molesta, mas que faz parte do esporte, vale dizer a derrota do time inglês pela equipe da casa, os buliçosos hooligans literalmente encheram a praça Sintagma (a central de Atenas) das características latinhas de cerveja, que semelham ser, não só o elixir tônico preferido, mas também a maneira inconfundível de marcar a sua buliçosa presença.

       A observação acima não pretende fazer parte de dispensável querela sobre certos traços marcantes de individualidades nacionais. O intuito é outro. As características desses turistas ingleses parecem um tanto agressivas, a ponto de que o hooligan tenha identificado personagens que o comum dos mortais prefere ter à distância. A esse respeito, não há negar que a legislação inglesa tenha alcançado grandes avanços em coibir o comportamento antissocial dessas hordas, que antes eram o terror dos vizinhos países europeus. Sem embargo, os ingleses – máxime os que viajam por voos charter, com destinação de fim de semana – continuam a guardar algumas atitudes que não dispensariam maior adequação para que, a sentir dos eventuais anfitriões, viajem melhor.

       Voltemos, no entanto, à tragédia da Linha Amarela. Ela foi causada por um caminhão-caçamba.  É difícil qualificar o comportamento do motorista: além de entrar na linha Amarela, em horário proibido para esse tipo de veículo, ele percorreu, em alta velocidade, uma das pistas com a caçamba levantada.  A razão de estar no ponto mais alto (o que além de interferir com o equilíbrio do veículo, é uma ameaça para as diversas passarelas) a caçamba teria sido levantada pelo motorista para esconder o número da chapa. Com isso, o condutor visava  inviabilizar a(s) multas devidas por excesso de velocidade, tráfico proibido, levantamento da caçamba e, por último, estar falando ao celular (o que fez durante todo o trajeto do caminhão antes do desastre).

       Cinco pessoas – quatro de imediato e uma após mais sofrimento em hospital – morreram, por força dessa criminosa irresponsabilidade. Duas estavam na passarela destruída, uma em um táxi, e duas em viatura particular.

       Não é ocasião, Senhor Prefeito Eduardo Paes de vir a público pedir desculpas à sociedade pela sucessão de erros e de negligências que acompanharam a trajetória do caminhão.

       A falta de punição é a causa do contínuo desrespeito das posturas municipais – que estão aí para evitar que calamidades como a do dia 28 de janeiro venham a ocorrer.

       Mas não é somente falta de punição que está em causa. O desrespeito às normas do trânsito – e o que vem ocorrendo na Linha Amarela é eloquente sinal disto – assume características sistêmicas.  Não é mais a hora para pedir desculpas. As mortes estúpidas reclamam mais do que justiça. Reclamam, em verdade, uma mudança no paradigma da punição. As multas devem aumentar e, se reincidentes, de forma a inviabilizar que as empresas (que estão na raiz do desrespeito pelos motoristas) possam sequer considerar repetir a infração. As multas precisam ser pesadas, muito pesadas, e aplicadas com severidade crescente no caso de reincidência.

       O Rio de Janeiro, no plano municipal, tem sido um desastre.  Os ônibus desrespeitam de forma consistente os sinais. Aquele que ignoram em geral é o de pedestres – aquilo ridículo intervalo de oito segundos dado ao pedestre (não importa se idoso) para atravessar qualquer logradouro. Para os ônibus sinal amarelo é o mesmo que verde. Ai do pedestre que se fiar no sinal verde do semáforo aberto para ele. O ônibus, com a truculência habitual, invade esse espaço, e o que sobra é uma ridícula nesga de quatro segundos, claramente insuficiente para a parte mais fraca. E o Senhor Prefeito poderia resolver isto de uma penada: se colocar pardais em todos os sinais, os rendimentos da prefeitura aumentariam deveras, até que as empresas de ônibus determinem aos motoristas que respeitem os sinais de trânsito.

       Quanto ao lixo – com toda a propaganda das multas a serem aplicadas aos sujões – a campanha da prefeitura seguiu o padrão usual. No dia do lançamento, as blitzes para colher na rede os infratores.  Passado um dia ou dois, tudo volta à situação anterior,  com a displicência (e o absenteísmo) da autoridade, e o lixo no passeio público, nas praias e nos logradouros torna a comparecer, eis que quem joga o lixo tem a virtual certeza da impunidade...

      Como se verifica, o princípio é sempre o mesmo.  Não há credibilidade da autoridade no que tange à aplicação da lei, da norma e postura seja municipal, estadual ou federal.  Para onde olhamos, há de que preocupar-nos: ontem a Linha Amarela, há um ano a Boite Kiss, em todos os dias o descontrole sistêmico do transporte público ... e estavam faltando, as desculpas da Autoridade, dizendo-nos com a cara por vezes confrangida, por vezes não, que  lamenta muito, muito mesmo...

 

(Fontes subsidiárias:  O Globo,  O Globo on-line, Folha de S. Paulo)     

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