A seriedade é importante na
política – e na economia - não só pelo aspecto ético, mas também pelos
benefícios que pode trazer àqueles que se pautam por seus princípios.
Já diziam os
nossos maiores que a confiança é a alma do negócio. Quem nessa esfera de
atividade não respeita tais normas perderá em breve tempo todo o crédito que
logrou ganhar no curto e médio prazos.
O excesso de
esperteza é o galardão dos néscios, que pensam tirar vantagem em tudo. No
Brasil, até se legislou sobre isso, com a notória lei de gerson, que, na verdade, ao invés de estímulo à prática,
mais serve como advertência a evitá-la.
Como a
verdade teima sempre em aparecer, quem pensa contorná-la, seja por habilidades
pirotécnicas, seja por sigilos impostos artificialmente, está condenado a
enfrentá-la em situação de desvantagem.
Antes de
descer ao primarismo dos nossos falsos mágicos, é oportuno relembrar que a
mentira terá sempre pernas curtas. Por mais longeva que aparente ser – como no
caso da maciça coleta de informações pela Agência de Segurança Nacional (NSA) no que tange ao americano comum,
por muitos anos negada de pé-junto por seus diretores, até que um obscuro contratado
de nome Edward Snowden pusesse fim à
pantomima – a verdade tenderá, ao fim e ao cabo, a surgir e a pôr no ridículo
os grandes sacerdotes da Razão de Estado.
Nesse
contexto, é confrangedor o comportamento do principal personagem da cena
econômica no atual governo. De acordo com os princípios da Presidente Dilma
Rousseff, a gastança é a norma. Dentro dessa filosofia, as despesas têm a
precedência, e independem de considerações como a verificação da necessária
contrapartida fiscal. Fica difícil, portanto, despender à tripa forra, e ao final observar normas da boa administração, como pagar os juros da dívida com a economia do superávit fiscal. Assim, quando o Ministro Guido Mantega revelou o montante do superávit primário – R$ 75 bilhões, dois bilhões acima da meta – houve não pouca surpresa, em reação vizinha da dúvida.
No
entanto, o mercado não desconhecia que boa parte dessa poupança se originara de
receitas una tantum (não recorrentes)
como do leilão do campo de petróleo de Libra e do pagamento do chamado refis (negociação de débitos tributários
de empresas). Sem embargo, como a notícia – posto que discrepante do
comportamento fiscal do governo – era boa, a tendência a aceitá-la foi mais
forte.
Antes que
outras suspeitas viessem a lume, o Ministro da Fazenda explicou a sua
antecipação do superávit primário com
o intuito de acalmar os “nervosinhos”
com o estado das finanças governamentais. Com o caráter um tanto chulo do
propósito da iniciativa, sem querer Mantega preparava os espíritos para
ulteriores decepções. Outro percentual do superávit
terá derivado do adiamento para 2014 de despesas que deveriam ter sido
pagas em 2013, i.e., os chamados ‘restos a pagar’.
Como os
comentaristas econômicos têm assinalado, os restos a pagar processados
(relativos a serviços já efetuados) teriam chegado a R$ 51 bilhões em 2013
(frente a R$ 26,2 bilhões no final de 2012).
O
crescimento dos restos a pagar se insere na maquiagem fiscal, eis que eles se
tornam verdadeiros orçamentos paralelos.
A contabilidade ‘Dilma’ abandonou a
exação que surgira com o Plano Real.
Dadas as liberdades com as contas, e a consequente impossibilidade de ter um
orçamento aberto, eis que as despesas de muito superam os haveres, ingressamos
na ficção contábil.
Se confirmado, esse floreio do superávit primário de R$ 75 bilhões será
o que ele é efetivamente: um embuste fiscal, cuja serventia se esfarela com a
mesma rapidez que os raios de sol desfazem o orvalho.
A efêmera
beleza das gotículas nas mádidas pétalas na manhãzinha difere, no entanto, dos
artifícios da mentira contábil. Enquanto da primeira se ocupavam os poetas,
esses truques canhestros nos livros fiscais não enganam ninguém e podem até servir
de pretexto para que a mítica nota do Brasil venha a ser rebaixada pelos
espantalhos da vez, que são as agências de avaliação de risco.
(Fonte: Folha de S.
Paulo)
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